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O ANDAR DO BÊBADO – ARMANDO AVENA

Redação - 16/06/2023 08:35 - Atualizado 16/06/2023

De vez em quando,  alguém cheio de certezas vaticina: nada acontece por acaso. Dá-me a vontade de dizer o contrário: tudo acontece por acaso. E chegou em minhas mãos um livro  sobre o assunto.  “O Andar do Bêbado”, escrito pelo físico norte-americano Leonard Mlodinow, que  tem como subtítulo: “Como o acaso determina nossas vidas”. O  andar do bêbado é aleatório e Mlodinow quer demonstrar que é a aleatoriedade que determina nossas vidas. É um livro interessante, mas um pouco maçante, pois vários capítulos são dedicados às leis da probabilidade, o jogo de dados e por aí vai. Mas quando passa a rastrear o sucesso de alguns personagens e a mostrar que as influências aleatórias são tão ou mais importantes do que nossas qualidades e ações fica uma delícia.

Ele conta a história do ator Bruce Willis que, vivendo em Nova York, buscou o sucesso desesperadamente, escolhendo os melhores papéis e tomando as decisões corretas para obter destaque, mas nunca conseguiu nada e, por isso, ganhava dinheiro como bartender.  Um dia viajou para Los Angeles  para assistir às Olimpíadas de 1984 e soube de um teste para um novo programa da rede ABC, chamado “A gata e o rato”. Fez o teste, foi selecionado e o programa  fez um estrondoso sucesso. Pois é, o acaso o levou a Los Angeles e a fama. E, provavelmente, também  o levou a enfrentar, muito depois, a demência fronto temporal.

Mlodinow diz que o ser humano tende a medir o grau de talento de uma pessoa em função do seu grau de sucesso. E, realmente, o músico, o escritor, o ator são reconhecidos pelo sucesso. O jornal The Sunday Times fez um teste, enviando para os maiores editores do país  capítulos de um romance que havia ganhado o Booker Prize, um prêmio de enorme prestígio, sem citar o nome do autor.

O manuscrito foi recusado, embora fosse “In a Free State” de ninguém menos que V.S Naipaul que ganhou o prêmio Nobel de Literatura.  O sucesso leva ao sucesso. Bill Gates e Steve Jobs pegaram programas existentes e mudaram a roupagem maravilhosamente, mas foi o acaso que os levou ao  sucesso. E aí fica fácil: as pessoas compram alguma coisa apenas porque outras pessoas compraram. Eu sempre me perguntei por que as pessoas compravam um livro de Paulo Coelho, até compreender que as pessoas compravam o livro de Paulo Coelho porque as outras pessoas estavam comprando o livro de Paulo Coelho.

Mas Mlodinow admite a aleatoriedade do sucesso e diz: “Se alguém se tornou um super-herói , isso não é uma tragédia. Tragédia é desistir de algum projeto por acreditar no julgamento dos outros ou do mercado, em vez de acreditar em nós mesmos”. É, pode ser, mas ele mesmo cita John Kennedy Toole, que cometeu suicídio depois que os editores rejeitaram “A Confraria dos Tolos”, hoje um clássico da moderna literatura americana.

Publicado no jornal A Tarde em 16/06/2023

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