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OS PRISIONEIROS DO ALGORITMO – ARMANDO AVENA

Redação - 25/08/2023 07:10 - Atualizado 25/08/2023

Não sei se a inteligência artificial vai dominar o mundo, mas começo a ter certeza de que já somos escravos dela. Já estamos sob o controle do algoritmo, uma inteligência artificial que está a todo momento nos dando ordens, pedindo códigos, senhas e obrigando-nos a provar que somos nós mesmos. Já tinha intuído isso, mas tive a certeza quando meu smartwatch tomou conta de minha vida e passou a me dar ordens e a agir como um coach motivacional: “hora de ficar em pé!”; “círculo de movimento completado”; “parabéns, esta semana seu número de passos foi maior”.

No computador e no celular, os problemas são de outra ordem, mas começam com o cidadão tendo de provar a todo momento que ele é ele mesmo. E assim um emaranhado de senhas e códigos nos aprisionaram e de tal modo que estamos a toda hora realizando a função inútil de lembrar ou recuperar a senha, de receber por e-mails ou whatzapp códigos para provar isto ou aquilo e de estar clicando em animais, bicicletas, semáforos e outras figurinhas para assim provar que não somos robôs.

E ficamos à mercê de bancos, lojas, empresas e apps que exigem senhas cada vez mais complexas, com letras maiúsculas, minúsculas, caixa alta e símbolos e que você cria num dia para esquecer no outro. Os apps a cada dia criam novos sistemas de segurança e, de repente, aí está você sendo obrigado a fazer uma autenticação em dois fatores ou a mover o rosto de um lado para outro para que o algoritmo grave suas feições.

As bigtechs usam programas para fazer você fazer o que elas querem e, assim, se saímos da nossa conta no gmail, para voltar somos obrigados a abrir o Youtube; se queremos anunciar no Instagram, temos de abrir o Facebook e por aí vai. O pior é que nos acostumamos tanto a esses penduricalhos eletrônicos que já não podemos viver sem eles, e assim aceitamos qualquer regra, ainda que ela seja quase incompreensível.

É como se aceitássemos ser prisioneiros, com o agravante de que somos nós que fechamos as grades que nos encarceram. É impossível não lembrar de uma frase atribuída a Aldous Huxley, que a internet diz ser de sua autoria, mas não é, embora o sentido faça sentido:

“A ditadura perfeita terá a aparência da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão.”

E assim o algoritmo instaura-se como ditador, com a nossa permissão e com o horror que cada vez mais temos de viver sem ele. Acreditamos ser livres, mas não podemos mais nos mover sem as muletas eletrônicas.

No livro “As afinidades Eletivas”, Gothe diz, sobre o amor matrimonial: “Ninguém é mais escravo do que aquele que se julga livre sem sê-lo”. Pois é, estamos todos casados com o algoritmo e sequer existe a possibilidade de divórcio.

Publicado no jornal A Tarde em 25 de agosto de 2023

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