Nesses tempos sombrios, em que a democracia está sendo constantemente atacada, lembro-me com frequência do maior poeta americano: Walt Whitman. Whitman é considerado o poeta da democracia porque transformou a liberdade pregada por ela em poesia.
O herói de “Leaves of Grass” (Folhas de Relva), seu livro mais famoso, não é o aristocrata nem o burguês endinheirado; nele, Whitman celebra o homem comum e dá voz poética aos trabalhadores, homens e mulheres, soldados, camponeses, cidadãos de todas as origens.
Whitman faz poesia da experiência cotidiana de cada ser humano. E celebra a democracia, em linguagem livre, aberta e acessível, homenageando a igualdade e a diversidade humanas.
Para ele, a democracia não é apenas um ideal político; é, antes de tudo, um anseio existencial. “Democracia! Junto a você, ao alcance da mão, há agora uma garganta que infla e canta com alegria.” Whitman foi o grande poeta da América e usou a poesia como instrumento para fazer política, defendendo, em êxtase poético, a abolição da escravatura, os direitos das mulheres, o exercício da cidadania.
“A ti, ó Democracia, de mim é isto: para te servir, ma femme! A ti, por ti, vou estes cantos entoando.”
Se vivo estivesse, o poeta estaria nas ruas declamando seus poemas e, se alguém o inquirisse por quê, diria imediatamente: “Pela democracia, my captain!”
Pela democracia, participou da Guerra Civil Americana, ao lado da União, ajudando os feridos como enfermeiro, e encontrou nessa função “a maior satisfação de toda a vida”. Mas Whitman não fazia poesia apenas para o coletivo; poetizava para o indivíduo, para o homem livre, vivendo em comunidade. Um dos seus mais belos poemas, “Canto a Mim Mesmo”, é uma soberba elegia ao individualismo, composta em cinquenta e duas estrofes de pura beleza. O poema gerou uma enorme polêmica, e muitos críticos se indignaram, indagando perplexos como alguém com tamanha preocupação social poderia dedicar tantas palavras a si mesmo. Ele respondeu com um sorriso irônico: “Eu não falaria tanto de mim se houvesse alguma outra pessoa a quem eu conhecesse tão bem.” Os críticos, aliás, sempre combateram Whitman.
“Leaves of Grass” foi extremamente criticado pelos pudibundos, que não se conformavam com a franqueza poética com que ele tratava temas como o amor sexual. Mas foi o conteúdo político, o canto pela democracia, que marcou sua poesia. Whitman não apenas celebra a democracia nos Estados Unidos, mas sugere que todos os seres humanos compartilham um destino comum. Seu verso é plural, inclusivo e expansivo, refletindo a ideia de que todos têm valor e dignidade — um princípio central da democracia. Os poemas de Walt Whitman, o grande poeta da América, cantam o homem e a terra e fazem o elogio à democracia.
Publicado no jornal A Tarde em 17/10/2025