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O BRASIL INVESTE POUCO DA BOLSA E O NORDESTE MENOS AINDA– JOÃO VICTOR IGLESIAS

Redação - 23/03/2022 16:08 - Atualizado 28/03/2022

O baixo número de investidores na Bolsa de Valores é um quadro comum para os países do chamado Sul Global. O panorama não poderia ser diferente, tamanha a desigualdade social que os aflige. Além disso, a ausência de maiores incentivos, tanto do ponto de vista educacional quanto do ponto de vista tecnológico, visando a popularização da linguagem digital, impacta diretamente no tímido cenário. Para se ter uma ideia, no México, cerca de 0,8% da população investe na bolsa. Em Angola o número de investidores em relação ao total populacional não chega a 1%. Por outro lado, países como Estados Unidos e Japão possuem mais de 40% da população presente no mundo dos ativos. As razões, é claro, estão atreladas com o maior poder aquisitivo de seus habitantes, que chegam ao final do mês com dinheiro sobrando para aplicar em investimentos. Contribuem, também, os supracitados fatores relacionados à educação financeira e tecnológica.

Analisando o cenário brasileiro, segundo dados do B3, hoje, 5 milhões de compatriotas investem no mercado de ações, o que corresponde a aproximadamente 2% de toda a população. Até 2013, esse número era de cerca de 500 mil. O esforço para que o feito fosse alcançado, entretanto, não está atrelado a incentivos estruturais por parte do poder público, como por exemplo, a importante instituição de disciplinas relacionadas à educação financeira no ensino básico e médio. Mas estão, sim, ligados, a uma maior presença de bancos digitais, cujos investimentos se tornam acessíveis em 2 ou 3 cliques, e à popularização dos preços dos aparelhos tecnológicos.

A questão fundamental é: agora que os brasileiros, e claro, os nordestinos estão começando a adentrar de forma definitiva no mercado financeiro, como fazer com que, para além de lucratividade, tais investimentos também consagrem um maior desenvolvimento para a nossa região? Possuir empresas fortes e com boa capacidade de investimento é uma grande vantagem estratégica. Naturalmente, maiores empresas possuem mais acesso a mercados nacionais e internacionais, o que incentiva a presença de outras empresas e de, consequentemente, mais empregos e desenvolvimento.

Para entender melhor a atual presença do Nordeste no contexto financeiro nacional, tive uma conversa muito agradável com Rafael Sales, Consultor Econômico da Arazul Research, que você confere abaixo.

  • Como você vê o setor financeiro hoje na Bahia? O interesse das pessoas por investir cresceu nos últimos anos?

As atividades financeiras estão entre as que mais cresceram no Nordeste e na Bahia na última década. Após a reforma da previdência e com a experiência recente de queda na taxa de juros, as pessoas procuraram conhecer mais opções de investimentos, principalmente ligados à renda variável. Isso potencializou o crescimento das corretoras de investimentos da Bahia e do Nordeste. Além disso, a SELIC abaixo de 5% permitiu que diferentes projetos de investimentos se tornassem ainda mais atraentes ao investidor, estimulado o mercado de capitais do Nordeste. Mesmo com o aumento na SELIC, aqueles que entraram no mercado financeiro, que aprenderam um pouco mais sobre o assunto e que já estão sendo bem assessorados por bons profissionais, vão continuar investindo.

2)   A que você atribui tal interesse?

A busca por melhores investimentos. A reforma da previdência proporcionou a desestatização de parte da poupança nacional, parte desse recurso continuou como poupança, não virou consumo. As pessoas, portanto, foram buscar investimentos que fossem melhores do que o que o FGTS rendia. Também teve a queda da SELIC, que fez o rendimento da poupança diminuir ainda mais e outros investimentos em renda fixa se tornaram mais atraentes.

3) Diante do atual cenário mundial, quais títulos nordestinos podem despontar?

O Nordeste tem um potencial de crescimento incrível. As empresas de energia do Nordeste tem buscado se financiar por meio de debêntures incentivadas, uma aplicação interessante e que ainda é pouco conhecida pelo grande público. Também é interessante acompanhar a entrada de empresas nordestinas na Bolsa de Valores. A Hapvida está prestes a realizar uma grande fusão com a Intermédica, formando uma das grandes empresas de saúde privada do Brasil. A Brisanet, do setor de telecomunicações, realizou o IPO no ano passado e participou do Leilão do 5G, adquirindo espectros para a região Nordeste e Centro-Oeste. Também vale a pena acompanhar a AES Brasil, empresa de fabricação de hélices para usinas eólicas – uma empresa que tem muito a ganhar com a transição energética que os diferentes países estão propondo realizar nos próximos anos.

4)  Existe, hoje, um incentivo da parte do Governo Estadual para que as empresas da Bahia estejam mais preparadas para o mercado? Qual a relação das empresas com o governo?

Para a primeira pergunta, existem algumas iniciativas para a inovação e surgimento de empresas, como projetos com foco em incubadoras de empresas e apoio à start-ups. A Áity Incubadora, por exemplo, é uma parceria entre a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e a Universidade Estadual da Bahia. Para a segunda pergunta, podemos citar a criação, em 2015, da empresa baiana de ativos, a Bahiainveste. Uma empresa de economia mista que tem por finalidade realizar investimentos em empreendimentos considerados estratégicos pelo governo da Bahia, estruturando e implementando operações com vistas à captação de recursos financeiros junto ao mercado financeiro ou de capitais. O governo da Bahia foi um governo que soube trabalhar bem com o setor privado, realizando concessões, privatizações e parcerias público-privadas. Construir essa ponte é fundamental para acelerar os investimentos que a sociedade tanto precisa, uma vez que contar somente com recursos públicos para isso seria insuficiente.

Rafael Sales é economista e mestre em direito. Consultor Econômico na Arazul Research

João Victor Iglesias é Mestrando em Politics, Philosophy and Public Affairs na Universidade de Milão e analista de Public Affairs.

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