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OLHE PARA CIMA – ARMANDO AVENA

Redação - 18/02/2022 09:30 - Atualizado 18/02/2022

Assistir ao filme “Não olhe para cima” do diretor Adam McKay, que está disponível na Netflix, foi como lavar a alma. Foi um desabafo para meu lado jornalista que está cansado de ouvir frases do tipo: “a imprensa só divulga notícias ruins” ou “é preciso divulgar notícias boas”, que pululam nos grupos de WhatsApp e nas reuniões de trabalho. Antes de ver o filme, eu respondia a esse mantra com o famoso dístico “Ne nuntium necare”  (não mate o mensageiro), para assim dizer que a imprensa é apenas o veículo da informação e que não adianta deixar de divulgar as notícias ruins, pois mesmo sem publicidade, elas continuam acontecendo.

Todos sabem, e o Google está aí para confirmar que a expressão “não mate o mensageiro” refere-se a Dario III, rei da Pérsia, que sabendo por um mensageiro da derrota do seu grande exército por  Alexandre, o Grande, mandou matá-lo. De nada adiantou, Alexandre, aos 24 anos, tomou e incendiou Persépolis, a capital do império persa, e perseguiu Dario até encontrá-lo morto, assassinado por seus próprios oficiais. Matar o mensageiro é inútil, afinal sua morte não muda os fatos e, além disso, é perigoso, pois se com medo da morte ou da opinião pública ele maquiar as notícias poderá trazer morte e sofrimento a milhões de pessoas, ocultando, por exemplo, que o exército de Alexandre ou um vírus mortal está às portas da cidade.

Mas os tempos são outros e no mundo moderno é preciso ter cuidado também com aqueles que  se travestem de mensageiros para assassinar os fatos. As famigeradas Fake News estão aí divulgando mensagens mentirosas, fazendo a cabeça das pessoas de acordo com interesses políticos, econômicos ou mesmo pelo simples desejo de enganar os crédulos. E também não vamos esquecer que os seres humanos, mesmo aqueles avessos às Fake News, estão sujeitos a interpretações erradas e por vezes se submetem à vaidade e aos interesses pessoais.

O filme “Não Olhe para Cima” aborda tudo isso e sua mensagem é um grito vigoroso contra os negacionistas e uma denúncia contra os políticos que manipulam o povo para defender seus interesses, pouco se lixando se o cenário em que se movem é uma pandemia ou uma guerra. Mas o filme aborda também os interesses e o cinismo da mídia, especialmente a televisiva que atinge milhões de pessoas, e a soberba dos novos reis do planeta – os bilionários donos das empresas de tecnologia –  que também manipulam bilhões de pessoas. E aborda a vaidade que por vezes escurece as vistas dos cientistas, ainda que eles sejam a única luz que pode conduzir a humanidade. Por tudo isso, leitor, não se deixe levar pelo negacionismo, seja o que nega a importância de vacinar as crianças ou a belíssima esfericidade da terra. Rebele-se, vacine seu filho, assista o filme e sempre olhe para cima quando lá estiver a verdade dos fatos.

Armando Avena é escritor, jornalista e economista. Membro da Academia de Letrasda Bahia é professor-doutor da UFBA.

Publicado no jornal A Tarde em 18/02/2022

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