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ADARY OLIVEIRA- O AGRONEGÓCIO E O SEMIÁRIDO

Redação - 29/03/2021 08:33

O aproveitamento do semiárido como área cultivável e aplicação de espécies produzidas no agronegócio, tem sido objeto de estudos por especialistas ao longo dos anos. No mundo empresarial um negócio para dar resultado econômico precisa ser viabilizado, ao menos e de forma integrada, nas três funções principais da administração: produção, marketing e finanças. Não adianta produzir bem se não houver consumo. Além disso, a produção e a comercialização só se viabilizam se a projeção do fluxo de caixa indicar um negócio atrativo, medido pela taxa interna de retorno, valor presente líquido ou outro parâmetro de referência. Em outras palavras, se não houver viabilidade técnica, mercadológica e financeira simultaneamente, o negócio não se sustenta.

Durante alguns anos em que estive à frente de uma pequena fazenda no semiárido da Bahia, andei procurando encontrar um jeito de viver bem tendo a seca como parceira, não como adversária. O catingueiro consegue conviver por ser teimoso, mas sem domínio, falta-lhe tecnologia. Procurei então identificar plantas que fossem resistentes à seca e que pudessem ser utilizadas na alimentação de bovinos. A primeira planta que pesquisei foi um arbusto que crescia em qualquer terreno, mesmo em cima de murundus, pequenos montes formados no solo como se fossem oriundos de formigueiros ou de erupção, onde a terra teria fervido. Ela é conhecida como icó, nome de origem tapuia. O icó, é assim descrito no Dicionário do Aurélio: “É um arbusto definido como árvore da família das caparidáceas (cpqparis yco), muito característica da caatinga nordestina, de folhas coriáceas, ovado-elípticas, flores de três a cinco centímetros com longos estames e pétalas citrinas, e cujo fruto é uma baga de três a quatro centímetros de diâmetro, contendo polpa e muitas sementes, icozeiro, icó preto”.

Submeti amostras do icó ao herbário do Instituto de Biologia da UFBA que as certificou como da Família Capparaceae, nome vulgar Icó e nome científico Capparis jacobinae Moric. A análise feita pelo laboratório de Nutrição Animal da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), entre outras anotações, informou que as folhas têm um teor de 14,35% de proteína bruta e os frutos 16,40%. Decidi então comprar o icó retirado dos campos por algumas pessoas que costumavam prestar serviços na região e consegui adquirir cerca de duas toneladas do fruto, muito parecido na cor, forma e dimensão com uma manga espada. Enchi todos os cochos com os frutos antes do gado chegar no final da tarde. Para meu espanto em poucos minutos o gado os devorou. Chegava, portanto, a uma primeira conclusão: o icó, com razoável teor de proteína bruta, palatável para os bovinos, resistente à seca, seria uma boa alternativa para alimento em qualquer época do ano. Encontrei, assim, um ótimo tema para desenvolvimento de uma pesquisa no campo da agropecuária. Um estudo dessa planta abrangendo cultivo, colheita, fenação, silagem, alimentação do gado, existência de toxicidade nociva etc.

De outra feita, sabedor que as fibras do sisal constituem apenas 5% do total da planta e que durante o desfibramento uma grande parte, cerca de 15%, é perdida na forma de um resíduo chamado mucilagem, passei a recolher esse resíduo, secar, ensacar e produzir feno para o gado. Solicitei à EBDA análise bromatológica e foi registrado teor de 10,98% de proteína bruta, base seca.  Considerando seu baixo teor de proteína passei a usá-la como volumoso na formulação de adubos durante períodos de seca. Na tentativa de encontrar aplicação comercial a ofereci aos aviários de Feira de Santana. Um técnico de um deles me chamou para conversar dizendo que o baixo teor de proteína servia para fabricar ração para as galinhas poedeiras, que não podiam engordar para não baixar a produtividade, reduzindo a produção de ovos. Prometeu então fazer análise da toxidez para continuarmos conversando O resultado não foi bom devido à presença de toxidez. Eu teria então de desenvolver pesquisa para a sua remoção o que não fiz, mas ficou a ideia de uma ótima aplicação. A Bahia é o maior produtor nacional de fibras de sisal com 140 mil toneladas anuais em 68 municípios. É fácil estimar que se joga fora aproximadamente 420 mil toneladas de mucilagem por ano, quando poderiam ser utilizadas como forragem animal ou ingrediente para outra aplicação industrial.

Tenho lido trabalhos desenvolvidos pelo setor agrícola sobre alternativas de espécies vegetais que poderiam ser cultivados no semiárido, mas sem apreciação das questões relacionadas ao mercado e à rentabilidade do negócio.

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