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JOSÉ MACIEL- A EFICÁCIA DAS MEDIDAS DO GOVERNO CONTRA A INFLAÇÃO DE ALIMENTOS

Redação - 10/03/2025 07:22 - Atualizado 10/03/2025

Em meio à perda de  popularidade pessoal e de seu governo no período recente , o Presidente Lula anunciou na semana passada algumas medidas para tentar conter a alta dos preços dos alimentos. O cardápio de providências  inclui, dentre outras opções, zerar o imposto de  importação de alguns produtos, formar estoques  públicos de alimentos e apelar para que os governos estaduais zerem a cobrança de ICMS na lista de produtos do governo federal.  Café, azeite de oliva, carnes, massas alimentícias, sardinha, óleo de girassol, milho e açúcar, e aumento da cota de importação de óleo de palma com alíquota zerada, compõem o universo de produtos contemplados no pacote do governo.

Em artigo anterior, já sustentávamos que no curtíssimo prazo não há nada que possa ser feito para dar uma “paulada” na inflação de alimentos. Em nossa visão , a entrada próxima  no mercado da safra 2024-25, o controle de gastos públicos, a acomodação do dólar em valores inferiores a 6 reais, e a elaboração do próximo Plano Safra para a temporada 2025-2026 poderão atuar  favoravelmente no combate à alta dos preços da comida no mercado interno.

É preciso considerar que as medidas anunciadas pelo governo não parecem ter o condão de rapidamente baixar os preços dos alimentos. Alguns preços até podem baixar , mas não por causa ou mérito das ideias do governo.

Em primeiro lugar,  em diversos itens, o Brasil é o maior supridor do mercado mundial, as vezes quase o único fornecedor. Nesse contexto, ainda que as tarifas sejam zeradas, não teremos onde comprar alguns produtos em escala significativa para abastecer o nosso mercado interno.

Em produtos com poucos “players” no mercado internacional, a situação pode também não ser muito confortável. No caso do café,  por exemplo, o Brasil é disparado o maior produtor e exportador mundial, seguido do Vietnã, que já deixou a Colômbia para a terceira posição faz tempo. Ocorre que a  cafeicultura do Vietnâ , a exemplo da brasileira, se defronta com problemas climáticos recentes , o que restringiu consideravelmente a oferta mundial. De modo que , ainda que as tarifas de importação no Brasil estejam zeradas,  não teremos onde comprar e importar o produto.

Vamos para outro  produto, o milho , insumo indispensável para a formulação de rações, item de custo importante na produção de carne de frango, de suínos e bovina. Aqui , temos um fato interessante. Diferentemente do café, temos disponibilidade do produto no mercado externo. Devido à guerra comercial entre EUA e China, não se deve esperar efeitos miraculosos de seus preços no mercado interno por conta das tarifas zeradas pelo governo brasileiro. Ocorre que , no contexto da guerra comercial citada acima, a China, como medida retaliatória, impôs tarifa elevada à importação de milho e outros alimentos norte-americanos, com o que devem sobrar espaços generosos no mercado chinês para o milho brasileiro. Se esse cenário se configurar, os produtores e exportadores brasileiros deverão destinar o produto para o mercado da China, diminuindo as disponibilidades para o mercado interno brasileiro.

Por sua vez, a formação de estoques públicos não parece conveniente no cenário de preços internacionais elevados, como é o caso no presente momento. Isso porque, compraremos no momento da alta dos preços e desovaremos esses estoques por preços mais baixos em  outro momento, em nome do combate à inflação. Nesse contexto, o governo tem perda de gastos públicos. Sabemos que o governo não precisa ter lucro na formação de estoques públicos, mas também não precisa ter prejuízo, já que a conjuntura atual exige austeridade e parcimônia com o dispêndio de recursos públicos. A lógica aqui é semelhante a da lógica da compra de ações na Bolsa de Valores: comprar na baixa e vender na alta.

Se não bastasse tudo isso, um grupo de deputados do PSOL protocolou recentemente na Câmara dos Deputados um projeto de lei criando um imposto de exportação sobre produtos agropecuários, com o propósito de reter mais produtos no mercado interno e controlar os preços para o nosso consumidor. Isso até pode gerar um efeito nos preços no curto prazo, mas na safra seguinte, o produtor brasileiro , desestimulado e inseguro diante da possibilidade da continuidade desse imposto, poderá  reduzir sua área de plantio e a safra futura, com repercussões negativas no abastecimento do mercado interno, nas exportações e na balança comercial.

Do exposto, não se deve esperar grandes impactos positivos do pacote de medidas para combater a inflação de alimentos  no curtíssimo prazo. Esses impactos  podem até acontecer , apesar  do pacote do governo. O pior é que o Presidente Lula declarou que se as medidas não surtirem o efeito desejado, poderá apelar para ações “drásticas”. Que medidas seriam essas? Não sabemos. O que se sabe é que o produtor brasileiro vive trabalhando num cenário de insegurança e incertezas, muitas vezes produzidas pelas próprias autoridades governamentais.

 

(1)Consultor Legislativo e doutor em Economia pela USP.  E-mail:  [email protected]

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