Carla Alves, de 45 anos, é ex-enfermeira. Ela abandonou a profissão há cerca de dois anos após sofrer uma espécie de “apagão” em meio a um plantão na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital público de Salvador. O desmaio foi a chancela que ela precisava para largar o jaleco, pôr o avental, investir em cursos de confeitaria e tornar-se dona do próprio negócio.
Mas a perda total da consciência não foi um acaso. Foi, na verdade, uma exaustão provocada pelo ambiente de trabalho, descrito por ela como de muita pressão e de responsabilidades constantes. Também teve diagnóstico: um burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional, distúrbio emocional que leva a cansaço extremo, estresse e esgotamento físico dos profissionais. “Fui afastada do trabalho e, durante esse tempo, repensei muitas coisas na minha vida, inclusive considerar deixar de lado a carreira e investir em um sonho antigo, o de empreender”, conta Carla.
Mas se o burn out leva os profissionais ao afastamento do trabalho, quem tem o Burn On continua a trabalhar mesmo apresentando sintomas como ansiedade, depressão, mudança drástica de humor, pressão alta, baixa autoestima e palpitações. O termo Burn On, inclusive, foi usado mais recentemente por psicólogos alemães para descrever um estado de exaustão depressiva crônica.
“No bournout, o paciente chega à exaustão e para de trabalhar, é afastado das atividades. Já quem sofre com o Burn On, está sempre no seu limite, sempre a beira do colapso, sofrendo com todos os sintomas, mas ainda assim cumprindo sua função na empresa”, explica a Carla Barroso, psiquiatra e consultora de Saúde Mental para Empresas.
Conforme a psiquiatra, uma coisa é importante ser pontuada: o bournout é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 2022 como uma doença ocupacional. O Burn On, por sua vez, não é reconhecido pela comunidade médica internacional.
O termo Burn On foi criado pelo psiquiatra Timo Schiele e pelo psicoterapeuta Bert te Wild. Juntos, os alemães publicaram o livro “Burn On: Sempre à beira do esgotamento”. Em entrevista à imprensa daquele país, Schiele ilustrou que os profissionais afetados parecem estar relativamente bem no trabalho, sobretudo na percepção externa, mas por dentro se assemelham a “conchas vazias”.
“Quase não sentem mais alegria e já não perseguem os seus interesses. Trabalhamos com pontos-chaves para a percepção externa e interna do Burn On, que comparamos entre si. As pessoas afetadas estão, por um lado, extremamente ocupadas e, por outro, dificilmente conseguem realizar as tarefas. Exemplos seriam: responder e-mails após e-mails para ter um bom desempenho – mas dificilmente estar ativo em casa ou com amigos”, disse o psiquiatra.
Ainda conforme Schiele, o Burn On pode se manifestar quando alguém está constantemente adiando suas expectativas de melhoria para a próxima semana, mês ou ano. Isso pode indicar uma tendência de evitar lidar com problemas imediatos, compensando, por exemplo, com fins de semana de relaxamento, em vez de fazer mudanças que possam resolver as questões que lhes afligem. “É bom que possamos ter esperança e perseverar. Mas a longo prazo isto pode ser perigoso. É importante distinguir entre se basta viver apenas com base nas esperanças ou se, na verdade, se trata de olhar mais de perto as coisas numa escala mais ampla”, completou o psiquiatra.
A ex-enfermeira baiana diz que sabia que, em algum momento, padeceria e não aguentaria mais continuar exercendo sua função no hospital. Ela já se preparava para pedir demissão, adiantada após o burnout. “Mas acompanhei diversas colegas que mesmo sentindo o que eu sentia, continuaram trabalhando por diversos motivos: porque precisavam pagar a faculdade dos filhos, quitar a casa própria e por aí vai. Eu, não aguentei, e acredito que foi até melhor meu corpo dar sinal de limite”, comenta Carla.
“Não temos levantamentos científicos que possam comprovar o quão o Bourn On tem afetado os trabalhadores, mas o importante é dizer que, no menor sinal que seu corpo e mente derem, é preciso parar e repassar sobre sua rotina. Uma saída pode ser a terapia, fundamental para que o paciente se conheça e consiga impor limites a sua vida”, orienta a consultora de Saúde Mental para Empresas.
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