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ADARY OLIVEIRA- A VOLTA DOS PAUS DE ARARA PARA CASA

Redação - 15/08/2022 08:48 - Atualizado 16/08/2022

Durante minha infância em Ruy Barbosa uma cena muito comum era a da passagem dos caminhões transportando retirantes para São Paulo e Paraná, os chamados “paus de arara”, nome dado por irem sentados em tábuas colocadas transversalmente nas carrocerias dos caminhões. Eles passavam em Ruy para tirarem a foto 3×4 com seu Gondim, fotografo que também tinha credencial do Ministério do Trabalho para emitir a Carteira Profissional. Era um documento com foto exigido pelos empregadores do Sul para acolher em suas fazendas e empresas das grandes metrópoles. O porte delas facilitava o objetivo de conseguir um emprego. Muitos deles retornavam e eram identificados nas ruas por terem as mãos calejadas, vestirem roupas pesadas e calçarem botas. Quando se perguntava se haviam ganho algum dinheiro diziam que sim, mas que foram roubados no trem, transporte que existia nos anos 1950. A linha férrea vinha de São Paulo, passava em Pedra Azul, Minas Gerais, parava na Estação da Flores e seguia para o Nordeste.

Conheci muitos deles e sempre diziam que não fariam a aventura de novo. Ser pobre e sem profissão na zona rural é menos penoso do que ser pobre nas grandes cidades. Hoje então, com um casebre de paredes rebocadas, eletricidade vinda de células fotovoltaicas, água de poço ou coletadas das chuvas, dá para ir vivendo plantando hortaliças. Muito melhor do que habitar em invasões e favelas desassistidas das grandes cidades. Com assistência do SUS e algum esforço podem colocar seus filhos para estudar, depositando na educação a esperança de mudar de classe social.

Digo isso de cátedra, por ouvir meu pai contar suas histórias. Ele foi para o Rio de Janeiro em 1935 a bordo de um dos navios ITA. Por não ter cursado o primário o emprego que conseguiu foi de ascensorista em edifício no centro do Rio. Estudou um pouco, retornou para a Bahia três anos depois e se estabeleceu no comércio em Ruy Barbosa. Ganhou o suficiente para educar os seus seis filhos em Salvador e conseguiu mudá-los para o patamar da classe média. A vida no sertão é muito dura, mas menos ruim do que as da dos urbanos que não possuem um pedaço de terra para cultivar alimentos. Essa resistência dos sertanejos e a alegria de viver que extraem do quase nada fazem da Bahia o estado com a maior população rural do Brasil.

Com aproveitamento do vento abundante na geração de energia eólica e do sol escaldante na geração de energia fotovoltaica, e de alguns arranjos como os de remuneração pelo aluguel de terras para instalação das torres de geração e cultivo do cerrado para produção de grãos e algodão, o sertanejo não precisa mais abandonar seu lugar e os “paus de araras” não precisam mais existir. Com novas pesquisas para melhor aproveitamento do semiárido, não é mais necessário migrar para outras regiões. Cada dia mais são abertas novas perspectivas para transformar bens da natureza em riqueza, como a expansiva exploração mineral, a introdução de novas tecnologias agrícolas e o aproveitamento de recursos naturais em novas aplicações técnicas e artifícios da modernidade.

Passando para outo lado da vida tenho a convicção de que os novos rumos tomados pela indústria química, abandonando o carvão, o petróleo e o gás natural em muitas aplicações, e um melhor aproveitamento da água, do vento e do sol, a exemplo da manufatura de hidrogênio verde, matéria-prima para inúmeras aplicações industriais, se tem uma nova janela do desenvolvimento da humanidade, com possibilidade de avançar na geração de riqueza preservando o meio ambiente. A captura do gás carbônico da atmosfera, para seu uso industrial, é outra realidade que vem sendo ampliada pelo homem, restabelecendo as condições de manutenção de ambiente propício à existência de vida no planeta.

Os conhecimentos têm avançado em todas as áreas com velocidade que nunca se conheceu antes, mas é preciso do cuidado de não se fazer a destruição da natureza, pelo contrário, encontrar sempre um caminho da sua preservação. Os avanços atingidos na conquista espacial, com os robôs que estão se movimentando em outros planetas e os telescópios que estão redescobrindo o mundo, nos têm convencido da certeza de que não existe planeta melhor do que a Terra para se viver.

Adary Oliveira é engenheiro químico e professor (Dr.) – [email protected]

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