Em audiências públicas realizadas em Salvador e Feira de Santana sobre a nova concessão da BR 324 e BR 116, a ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres apresentou uma proposta de edital elaborada de maneira açodada e completamente equivocada e que não atende aos interesses da Bahia.
O projeto apresentado nas audiências causou indignação, pois comete os mesmos erros da concessão anterior, abrindo espaço para que a nova concessionária comece a operar sem dar início aos novos investimentos e – mais grave ainda – aumentando o número e o valor dos pedágios, viabilizando super lucros imediatos para a vencedora da licitação, antes mesmo dela realizar qualquer investimento.
Pelo projeto da ANTT, a concessionária só começaria a realizar os investimentos de porte no ano 3 da concessão, algo absurdo tratando-se de uma via de alto fluxo e que, se bem administrada, terá alta rentabilidade.
A ANTT está repetindo o sistema que permite à concessionária adiar os investimentos indefinidamente, fazendo pequenos reparos nas rodovias e, depois, questionando juridicamente a possibilidade de fazer os investimentos contratados.
O projeto de licitação tem de prever o início dos investimentos imediatamente, até para comprometer a concessionária vencedora que precisa, como em qualquer empreendimento, investir primeiro, para depois auferir os rendimentos.
Tudo no projeto apresentado demonstra a incompetência da ANTT. O aumento do número de praças de pedágios, por exemplo, que dobrará de sete para catorze já no segundo ano, é injustificável antes da realização de investimentos de porte.
A tarifa-teto do pedágio prevista em R$ 0,16/km para pistas simples e R$ 0,21/por km para pistas duplicadas é excessiva. Com isso, o pedágio da Salvador/Feira será de inacreditáveis 20 reais, quase três vezes mais que o atual.
Sob o pretexto de que a empresa ganhadora será a que apresentar menor tarifa-teto, o edital já eleva o patamar. E mais: o aumento do pedágio se dará já no 1º mês de concessão e os tradicionais descontos, como o de usuário frequente, não evitam o aumento do custo-Bahia, com a elevação significativa do custo de transporte na mais importante rodovia do estado, pelo menos até que os investimentos sejam feitos.
Novas praças de pedágio e aumento do valor são justificáveis, mas somente à medida que os investimentos forem feitos e mesmo assim de forma proporcional e progressiva. Ainda mais que o governo vai dar de presente à concessionária investimentos de R$ 500 milhões na rodovia, já previstos pelo DNIT para os reparos imediatos.
Quem lê o edital tem a sensação de que a ANTT está mais preocupada com a empresa que vai ganhar a licitação do que com a população, que durante mais de 15 anos sofreu por causa de uma concessão mal feita e mal fiscalizada.
Não adianta mudar o nome da rodovia, chamando-a pela pomposa alcunha de Rota 2 de Julho, o que a população quer é o início imediato da duplicação, a implantação de faixas adicionais, de vias marginais, passarelas, dispositivos de interseção, telefonia móvel e por aí vai. É preciso rever os gargalos e dar início aos investimentos imediatamente após a assinatura do contrato.
Com o edital, a ANTT parece estar mais preocupada com os interesses da empresa vencedora do que com a população da Bahia ou, talvez, expondo o medo de uma concessão deserta. Aliás, ainda é preciso justificar, com argumentos mais fortes, porque vale a pena juntar a concessão da BR 324, a mais importante rodovia da Bahia e altamente rentável, com a da BR 116. Nada contra, desde que isso seja feito sob a égide dos interesses da Bahia.
Lideranças políticas, como os deputados Eduardo Salles e Robinson Almeida, já manifestaram sua indignação com o projeto e agora a Bahia inteira tem de exigir da ANTT um projeto cujo foco seja o desenvolvimento do nosso estado.
A FCA E OLIGOPÓLIO FERROVIÁRIO
No Brasil, apenas três grandes empresas controlam o sistema ferroviário: a Rumo, a MRS e a Vale. É um oligopólio com concentração de mercado, barreiras para a entrada de novas empresas, nenhuma competição e grande influência política e econômica. E essas empresas por vezes agem como cartel. É por isso que a FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), que é controlada pela Vale e por fundos de investimentos, se dá o direito de degradar trechos que não lhe interessam e ainda propor a devolução ao estado. Sendo assim, em vez de renovar a concessão, o governo deveria leiloar toda a FCA, oferecendo a oportunidade a MRS, Vale e Rumo de apresentarem propostas, obrigando a VLI a operar a ferrovia enquanto isso.
Publicado no jornal A Tarde em 08/05/2023