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ROMANTASIA – ARMANDO AVENA

Redação - 01/11/2024 09:23 - Atualizado 01/11/2024

O mundo anda estranho, na política, na música, na literatura, em toda a parte. Dir-se-ia que um espectro sombrio está rondando a humanidade, espalhando reacionarismo, mediocridade e mal gosto ao redor do planeta. Dizem-me que é isso mesmo que a humanidade não segue em frente, mesmo acumulando conhecimento é, pelo contrário, cíclica, avança e retrocede ao longo do tempo. Acho que é verdade e mesmo a História parece fadada a esse ciclo fatal, afinal, o esplendor da Antiguidade grega deu lugar a Idade das Trevas.

Abstraio a política e a história e atenho-me a música e a literatura no Brasil e juro que por um momento tive a ilusão de que aí o processo seria diferente e seguia num crescente em direção à qualidade literária e musical, afinal nós demos a Bossa Nova ao mundo e houve um tempo em que Ana Luiza, de Tom Jobim, liderava as paradas de sucessos:  “Supõe Ana Luiza, se a guarda cochila/ Eu posso penetrar no castelo/ E galgar a muralha de onde se divisa/ O vale, os prados, os matos, os montes/ As flores, as fontes, Luiza.”

Ledo engano, o país de Jobim agora ostenta nas paradas de sucesso músicas chicletes com harmonia primária e letras vulgares e escandalosas, como a pérola A danada me ligando, de  MC Cabezinho, com essa letra poética: “A danada me ligando, nóis segue o procedimento/ Nóis investe nas gomona, uns carro louco e apartamento/ As balada que nói poca só com os beat violento/Ice frozen, dá um close, só com a navona do momento/ Brisou demais em mim, quer foder, quer pião.”

Mas vamos deixar de lado a nostalgia e buscar novidades na literatura que, não faz muito tempo, nos deu escritores como Clarice Lispector, Jorge Amado, João Ubaldo e tantos outros. Vou à livraria e eles estão lá, resistem ao tempo, à mediocridade e ao politicamente correto, mas nas bancadas dos mais vendidos e dos lançamentos e nas listas das revistas o que vejo são autores desconhecidos e títulos que me causam estranheza. Descubro então que os livros mais vendidos no Brasil são do gênero literário batizado de New Adult ou ficção para jovens adultos, romances com tramas quase adolescentes, leves e fáceis de ler, com títulos assim:  É Assim que Acaba ou É Assim que Começa, livros de Colleen Hoover, o autor mais vendido no Brasil, uma assistente social que vivia com o marido e os filhos no interior do Texas e viralizou após publicar seu primeiro livro na plataforma de autopublicação da Amazon.

Descubro também que há entre os mais vendidos muita romantasia. Se o leitor estranhou o nome, meu estranhamento foi maior ao descobrir que é um subgênero, que lidera as listas dos mais vendidos, e cuja característica é a mistura de muita fantasia e elementos fantásticos tendo como eixo da narrativa uma tórrida história de amor. É, vou ficar por aqui, afinal como, dizia Joyce,  a vida é curta demais para desperdiçá-la lendo um livro ruim.

Publicado no jornal A Tarde em 01/11/2024

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