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A ECONOMIA É A MÃE DE TODAS AS GUERRAS – ARMANDO AVENA

Redação - 03/03/2022 09:01

A economia é a mãe de quase todas as guerras e, por mais ogivas nucleares que tenha, a Rússia, que tem um PIB menor do que o do Brasil, não poderá enfrentar os países da Otan que representam metade do PIB mundial.  A Rússia tem pouca importância na economia global e não fosse pela  produção de petróleo e gás, fertilizantes e trigo, seria mais desimportante que o Brasil. Na verdade, enquanto o Brasil é um grande supermercado de commodities, a Rússia  é “um grande posto de gasolina” com uma loja de commodities anexa.  O problema é que o posto de gasolina controla 6 mil ogivas nucleares e poderia usá-las, obrigando dois gigantes, China e EUA, a se posicionarem. Putin usa a retórica para manter a Otan longe do palco da guerra, mas não usará armas nucleares, que são “não armas”, já que  ninguém pode usá-las sem destruir o mundo.

O fato é que Putin não avaliou bem os impactos da invasão da Ucrânia. Supôs que não haveria resistência e o país seria tomado em poucos dias; que as sanções seriam semelhantes às aplicadas na Criméia; e que rapidamente ele anexaria o território ou colocaria um governo pró-Rússia. Também supôs  uma democracia ocidental decadente  e a fraqueza dos seus líderes. O que se viu, no entanto, foi exatamente o contrário: a resistência dos ucranianos à invasão russa foi forte e os líderes da Otan passaram a agir de forma ativa e coordenada. Putin percebeu então o poder da economia. Grande parte das reservas russas de mais de 600 bilhões de dólares foram congeladas, os grandes bancos russos foram expulsos do sistema Swift e já não há como o país ter acesso aos dólares indispensáveis ao comércio e aos investimentos.

Com os dólares escasseando, a população e as empresas, que foram impedidas de vender seus ativos no exterior, correram para sacar dinheiro gerando um déficit estrutural de liquidez que fez a taxa de câmbio disparar obrigando o Banco Central a elevar os juros e a adotar  “contra-sanções” para controlar os fluxos de capitais. Em resumo: em plena guerra, a Rússia está atolada em uma crise cambial séria. A  situação só não é mais grave porque o pagamento das exportações não foram congelados e o país pode ter superávit da balança comercial para enfrentar as despesas do mês e, além disso, parte das reservas está em moeda chinesa e ouro. Putin cometeu um erro econômico primário, agiu como se estivesse na antiga União Soviética com as finanças fechadas na cortina de ferro, mas a Rússia de hoje está imersa até o pescoço no capitalismo ocidental e ele não perdoa: ou o país age de acordo com suas leis ou está fora.

É certo que haverá perdas econômicas no Ocidente, especialmente nos países dependentes do gás e do trigo russo, mas nada que não possa ser resolvido pelo próprio mercado, ainda que na base de aumentos de preços e de alguma inflação.

O fato é que a Rússia está se tornando um pária na economia mundial e Putin – sob pena de tornar-se apenas mais um tiranete ameaçando o mundo com suas armas nucleares –  terá obrigatoriamente de tomar Kiev ou celebrar um cessar fogo cheio de exigências para assim poder negociar sua rendição econômica. Com a Ucrânia pacificada, Putin poderá voltar gradualmente, ainda que desmoralizado, ao seio do capitalismo. Esse é o cenário provável, mas, vale lembrar: guerra a gente sabe como começa, não como termina.

                                     A BAHIA E A GUERRA

O Brasil e a Rússia são economias semelhantes e não complementares, ambas são produtoras de commodities O Brasil compra da Rússia basicamente fertilizantes, trigo e derivados de petróleo. A nossa maior dependência é de fertilizantes, já que a maior parte do trigo vem da Argentina. Se as sanções persistirem, os preços dos fertilizantes devem aumentar e os custos agropecuários também, inclusive na Bahia, que tem na Rússia o maior vendedor do produto. No mais é aumento no preço do barril do petróleo, que eleva os preços dos combustíveis e  mais inflação. A cotação do dólar que vinha em queda consistente tende a voltar a crescer. Mas o Brasil continua atrativo para os capitais externos.

Publicado no jornal A Tarde em 03/03/2022

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