JOSÉ MACIEL DOS SANTOS FILHO (1)
Numa das colunas anteriores, pontuamos que o agronegócio brasileiro é autossuficiente em uma vasta lista de produtos, exceto num pequeno universo, no qual o maior destaque fica por conta do trigo, cujas importações, equivalentes a cerca de 45% do consumo interno, consomem divisas da ordem de 1,5 bilhão de dólares em termos anuais. Na ocasião, destacamos que seria oportuno e prudente diminuir esse coeficiente de importações e que os cerrados do Centro Oeste e do Nordeste brasileiro teriam áreas com aptidão climática para cumprir com este objetivo.
No que concerne aos insumos para a agricultura. o problema que desperta maiores preocupações diz respeito ao abastecimento de fertilizantes para o nosso mercado interno, muito dependente de importações. Esse diagnóstico é antigo e os sucessivos governos não implementaram as medidas que poderiam colocar o nosso abastecimento interno numa situação de menor vulnerabilidade. Parece que as autoridades só agora despertaram para o problema, após a lamentável, condenável e injustificável invasão da Ucrânia pela Rússia, invasão essa que vem causando significativo número de perdas de vidas humanas e uma tragédia humanitária de grandes proporções. Portanto, antes de qualquer consideração de ordem econômica, a atitude da Rússia deve merecer veemente condenação de todos os governos, incluindo o governo brasileiro.
Vamos aos números, obtidos parcialmente de estudo recente da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. O Brasil consome anualmente algo como 41,6 milhões de toneladas de fertilizantes NPK (nitrogenados, fosfatados e potássicos). Esses 3 macroelementos são habitualmente usados nas formulações dos adubos usados na nossa agropecuária. O país é responsável por 8% do consumo mundial de fertilizantes e ocupa a quarta posição no ranking mundial , só atrás da China, Índia e Estados Unidos.
A velocidade de crescimento de nossa demanda tem se caracterizado por um ritmo intenso, que está exigindo proporções crescentes de importações de matérias-primas e fertilizantes finais, importações essas que custaram ao país um dispêndio de 13, 4 bilhões de dólares em 2021, montante 9 vezes maior que o valor das importações anuais de trigo. A despeito da existência de reservas nacionais de matérias-primas e depósitos minerais para a nossa produção interna de fertilizantes em alguns casos, nossas importações representam cerca 85% do consumo interno. Longe de pretendermos uma abordagem autarquizante no setor, entendemos que esse coeficiente de importações anuais é demasiado elevado, sendo prudente reduzir essa dependência para algo como 60% numa perspectiva de médio e longo prazo.
Em termos de nitrogênio, as importações perfazem, em média, 76% de nosso consumo, ante 24% de produção interna; para o fósforo, as compras do exterior representam algo como 55% de nossas necessidades, ante 45% da produção brasileira; e , finalmente, o potássio é o elemento mais sensível e preocupante, com importações de 94% , ante uma irrisória proporção de 6% de produção interna. Das 41,6 milhões de toneladas de fertilizantes NPK consumidos em 2021, 38%, 29% e 33% são referidos ao potássio, nitrogênio e fósforo, respectivamente, segundo informações de alguns estudiosos.
Em se tratando de países produtores exportadores, o nitrogênio sintético é produzido principalmente pela Rússia, Índia, China , América do Norte , Oriente Médio, Austrália e Indonésia; mais de 75% da rocha fosfática, insumo usado na produção de fosfatados, estão localizadas no Marrocos; e no caso do potássio, 80% do consumo no mundo são produzidos na Rússia, Canadá, Belarus (Bielorrússia), Israel, Chile, Catar, Irã e outros países.
Dados mais recentes referidos ao cloreto de potássio usado na agropecuária brasileira dão conta de uma grande concentração de nossas importações em 4 países: Canadá (32%), Rússia (26%), Belarus (18%) e Israel (11%). Com o problema das sanções aplicadas recentemente à Rússia e a instabilidade e alinhamento de Belarus à Rússia, parece oportuno diversificar nossas fontes de suprimento externo. Irã, Catar, Chile e outros países são opções possíveis.
Torna-se urgente também dar início à implementação de um programa de aumento da nossa produção interna, com incentivos e tratamento tributário favorecido à produção de potássio em Sergipe e na Amazônia, além de estudos e dimensionamento de possíveis depósitos de potássio anunciados recentemente no Recôncavo baiano. Oportunamente, voltaremos ao tema, com detalhamento de nossas possibilidades de produção interna de fertilizantes nitrogenados e fosfatados.
(1)Consultor Legislativo e doutor em Economia pela USP. E-mail: