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SAMUELITA SANTANA- QUE PAÍS RISÍVEL É ESSE?

Redação - 19/10/2020 08:49
Um Presidente da República que não tem papas na língua fala o que bem quiser. E, naturalmente, ouve o que bem não quer. Além de: correr o risco de não ser levado a sério, de perder credibilidade, de não respeitar liturgias que o cargo requer e de, claro, ser absolutamente contrariado pelos fatos que se colocam bem diferentes da sua fala. Quando Jair Bolsonaro alardeou ter acabado com a Lava Jato – sem nem pensar no que dizia -, porque em seu governo não havia corrupção, ele, mais uma vez, mostrou de forma escancarada a imprudência típica dos mandatários que acham que gerir um país é um divertido jogo de cena, de irônicas retóricas e fartas alegorias de palavras. Mas seria bom para o presidente do Brasil não esquecer que, sim, é preciso honrar o respeitável público.
E eis que não muito tardou e o vice-líder no Senado do tal governo sem corrupção, Chico Rodrigues, do DEM, é flagrado pela  Polícia Federal com maços de dinheiro na cueca e até entre as nádegas. Seria risível e patético não fosse lamentavelmente trágico e constrangedor. Não só para o Senador da República e ex-governador do estado de Roraima, mas também para o Presidente da República que, horas antes, gabava-se de conduzir um governo incorruptível, cheio de gente “comprometida com a honestidade”. Na casa do senador, em Boa Vista, Roraima, onde a PF cumpriu mandado de busca e apreensão, no âmbito da operação que investiga desvio milionário de recursos de emendas parlamentares destinados ao combate à pandemia – por isso batizada ironicamente de Desvid-19 -, além dos 33 mil enfiados na cueca de vossa excelência parlamentar, foram encontrados outros R$ 10 mil e mais 6 mil dólares num cofre da casa.
É claro que não se pode imputar ao presidente Bolsonaro os malfeitos de Chico. Mas é claro também que o presidente não deve anunciar ao seu país fatos inverídicos como o improvável fim da corrupção em seu governo. Num país onde a corrupção é sistêmica e estrutural, espalhando tentáculos vigorosos nas transversas relações políticas, corporativas e governamentais, afirmar categoricamente que se trata de um fenômeno com índice zero em sua gestão é, no mínimo, uma irresponsabilidade. Mais leviano ainda é dizer que acabou, considerar morta e, ou, desnecessária, uma força-tarefa de combate à corrupção como a Lava Jato.
Nesse episódio, fica mais claro ainda o necessário mea-culpa do presidente quanto aos critérios de escolha de figuras que hoje representam o seu governo. Não é segredo pra ninguém, por exemplo, que o próprio líder do governo no Senado, Fernando Bezerra – MDB-PE, possui referências nada lisonjeiras que inclui robusta lista de investigação desde a época em que era ministro da Integração Regional de Dilma Roussef. As denúncias e acusações são várias e vão do suposto recebimento de propinas de empreiteiras à lavagem de dinheiro. Em setembro do ano passado a PF também andou fazendo busca e apreensão na casa e gabinete de Bezerra, época em que o senador chegou a abrir mão do cargo de líder do governo. Mas foi mantido pelo presidente Bolsonaro que obviamente sabia de todas as antigas investigações e ainda assim o nomeou e o manteve.
E agora por mais que queira se descolar do pau que bateu em Chico, Bolsonaro vai ter que encarar parte da sova. Afinal, ele e o senador mostravam-se tão íntimos e aliados a ponto de a união ser considerada pelo próprio presidente como “uma relação quase estável”. O “quase” pode até minimizar os estragos para a plateia favorita do presidente, já que ele adora jogar com os efeitos especiais das palavras. O vídeo dessa “união quase estável” circula agora pelas redes tanto quanto a notícia de que um parente do presidente, o primo favorito dos meninos 01 e 02, também estava nomeado no gabinete do senador Chico Rodrigues, ganhando a bagatela de R$ 23 mil mensais. O primo foi demitido tão veloz quanto a repercussão no país da impagável história do dinheiro na cueca.
O que dizer desses recortes que vão construindo a história do Brasil e que mais parecem tirinhas satíricas de HQ? Rir seria o melhor remédio? Vai ficando difícil gargalhar quando se percebe que nos arredores da história cotidiana, fatos pra lá de surreais vão acontecendo e causando muito mais dor e indignação do que risos. As cenas, como diriam os italianos, são pazzescas. O mesmo Chico do dinheiro – pelo visto público – na cueca, flagrado e filmado pela PF, lançou vídeo nas redes para dizer na cara dura que é inocente, que nada daquilo é real, que é um político honesto e que vai provar por A mais B. E a Casa Deliberativa que representa o povo brasileiro de Norte a Sul, o Senado, câmera alta do Congresso Nacional que abriga Chico, vai dando mostra do pior corporativismo que possa existir nessa República Federativa, já que se movimenta com mil arranjos e argumentos “legais” para barrar o pedido de afastamento do indecoroso parlamentar, determinado pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal – STF.
O pedido de Barroso chegou sexta-feira, 16, na Casa. Fontes de bastidores revelam que apesar de alguns senadores manifestarem-se a favor do afastamento de Chico, a confraria já está montada para impedir que a punição aconteça. Se depender do presidente, Davi Alcolumbre – DEM-AP, Chico fica e não será cassado. O senador baiano Ângelo Coronel – PSD, é da mesma opinião. Para ele, mais importante que o dinheiro na cueca é decidir quem manda na Casa. O poder, segundo Coronel, é do Senado e não do Supremo. Então, Chico fica. Mas, e o dinheiro na cueca? Ah, isso aí são outros 33 mil.
É pra rir? O que dizer, então, do mesmo STF que deseja afastar Chico mas se encarregou de soltar um perigoso traficante que, por sinal, aproveitou a “deixa” para se mandar do país? O supremo ministro Marco Aurélio de Mello, que concedeu habeas corpus a André do Rap, líder do PCC – facção criminosas com conexões internacionais -, ficou contrariadíssimo ao ver a sua decisão ser derrubada pelo presidente da Casa, ministro Luiz Fux, e disparou um irado discurso durante o julgamento, chamando Fux de “autoritário”. Mello desafiou e disse que não abriria mão da sua decisão individual de soltar o traficante.
Apesar de ter prevalecido o bom senso da maioria do STF em manter a prisão de Andre do Rap, a Inês agora é morta. Rap deu no pé, fugiu do país e agora entrou na lista de criminosos procurados pela Interpol. E ainda nem falamos das notícias amplamente divulgadas e antecipadas pela mídia sobre as manobras que vêm sendo articuladas entre ministros do Supremo, como Gilmar Mendes, e outros poderes para demolir de vez a força-tarefa anticorrupção. A ideia é anular as condenações de réus como o ex-presidente Lula, sob o despudorado argumento de “parcialidade” do então juiz Sérgio Moro. Tais manobras trarão de volta não apenas a sensação, mas a absurda inversão de valores que inclui a velha e conhecida impunidade para crimes cometidos por poderosos chefões.
Nesse traçado de realismo fantástico que vai desenhando a história do Brasil, será que deveríamos então ter frouxos risos ao descobrir que outros tantos brasileiros, gente mortal e comum como nós, se preparam para tentar fraudar descaradamente um sistema de pagamento bancário que sequer entrou em vigor, o chamado PIX, usando ataques de phishing que imitam campanhas legítimas de bancos para roubar CPFs , senhas e o rico dinheirinho de outros tantos brasileiros honestos e trabalhadores? Pior: como se esse ato ilícito e vergonhoso fosse a coisa mais natural e corriqueira de se lidar – o pior é que é mesmo – já tem especialista recomendando cidadãos de bem a anteciparem seus cadastros para que não tenham MUITO trabalho na hora de provar que foram assaltados. O país É ESSE! Com piscinas cheias de ratos!

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