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REJANE GOMES : OS DESAFIOS DO EMPREENDEDORISMO FEMININO NAS ATIVIDADES PRODUTIVAS

Redação - 25/07/2019 08:20 - Atualizado 25/07/2019

O desempenho dos pequenos empreendimentos no Brasil vem sendo impulsionado em atividades variadas no comércio, educação, cuidados e produção de bens e serviços, constituindo importante forma de inserção produtiva e de trabalho para milhares de pessoas, especialmente, em momentos de crise em que se observa a diminuição das ocupações formais. As mulheres têm se destacado com atividades que podem contemplar desde o artesanato até pequenas produções de alimentos e têxteis, adaptando-se ao conceito de empreendedorismo individual como iniciativas inovadoras e promissoras.

As mulheres representam minoria quando se trata de garantir ocupações no mercado formal. Sua presença nas atividades informais e por conta própria são marcantes, o que conserva o trabalho feminino em situação de vulnerabilidade. Na medida em que a economia cresce e novas ocupações vão surgindo, melhoram as condições de empregabilidade para todos, mas em momentos de crise, são as mulheres que exibem as maiores taxas de desemprego. As dificuldades de inserção no mercado de trabalho são influenciadas por fatores conjunturais, mas as barreiras de gênero são definitivas na inserção profissional. Parte significativa das mulheres precisam conciliar o cuidado com os filhos com as atividades profissionais, sendo obrigadas a assumirem jornadas de trabalho de meio período ou trabalhos temporários, com menor qualificação e remuneração.

No Brasil, considerando os dados da PNAD Contínua para o ano de 2017, as atividades por conta própria têm apresentado importante destaque nas ocupações. As pessoas que realizavam trabalhos nesta condição e que não contribuíam com a previdência social expressavam 70,4% de homens e 68,4% para as mulheres. Os que contribuíam com a previdência representavam percentual em torno de 30% do trabalho masculino, com valor maior para as mulheres, com quase 32%. Contudo, é oportuno lembrar que a maior parte das pessoas ocupadas é constituída por homens. Entre 2014 e 2016, houve redução, tanto para homens quanto para mulheres que não contribuíam com a previdência e aumento daqueles que realizam suas contribuições. Em contrapartida, de 2016 para 2017, registrou-se queda no número de contribuintes e aumento dos não contribuintes, o que pode refletir as dificuldades das pessoas que sobrevivem por conta própria em manterem seus negócios numa situação de crise, com sinais mais evidentes a partir de 2016.

Ao analisar a participação das mulheres na condição de empreendedoras, constata-se crescimento significativo, considerando a classificação de Microempreendedores Individuais (MEI). Em 2016, o número de pessoas trabalhando por conta própria alcançava mais de 22 milhões no Brasil, enquanto os MEI exibiam mais de 6,6 milhões de empresas. Entre 2012 e 2016, o crescimento para os primeiros foi de 7,46%, enquanto para os MEIs obteve-se mais de 240% de aumento. Deste total, 52% são homens e 48% são mulheres, considerando o ano de 2016. Embora tenha havido aumento de 2,4 ponto percentual (p.p.) para as mulheres MEI, entre 2010 e 2016, e queda de 2,4 p.p. para os homens, foi observada uma estagnação no registro de novos MEI a partir de 2014, de acordo com o relatório do SEBRAE.

Quando se observa os MEIs por setores produtivos, evidencia-se a maior presença das mulheres nas atividades de serviços (52%), indústria (55%) e comércio (51%), enquanto os homens são maioria na construção civil (93%) e agropecuária (82%), em 2016. Quanto à distribuição dos MEIs, confirma-se a tendência histórica apresentada pelas mulheres na inserção produtiva, geralmente associadas ao desenvolvimento das habilidades na área de alimentação, saúde e comercialização de bens. As atividades de tratamento de beleza (96%), confecção de roupas e peças de vestuário (85%), fabricação de produtos diversos (81%), cabeleireiros (79%) e fornecimento de alimentos (75%), estão entre os negócios onde as mulheres mais atuam como MEI, considerando o ano de 2016.Os homens destacam-se nas obras de alvenaria (97%), serviços de pintura (95%), serviços de táxi (94%), fabricação de móveis (90%) e serviços de mecânica de veículos (89%), entre outros, o que caracteriza atividades tipicamente masculinas.

O trabalho feminino se adapta muito facilmente às características do trabalho flexível, podendo desenvolver e estender suas habilidades domésticas como cozinheiras, costureiras, cuidadoras, além de se capacitarem como profissionais da beleza, comerciantes de porta em porta e muitas outras ocupações que permitem assumir a condição de autônomas e empreendedoras. Contudo, do mesmo modo que o trabalho feminino contribui com a reprodução da riqueza no sistema capitalista, também pode estar em situações de precarização e informalidade na busca pela sobrevivência.Nesse emaranhado de relações mercantis que tem a casa como ponto de partida, muitas pessoas trabalham sem descanso e com rendimentos limitados que não necessariamente garantem segurança de saúde e previdência, ressignificando as formas de exploração do trabalho feminino.

Após completar 10 anos de existência, o MEIs já totalizam mais de 8,5 milhões de empreendedores no Brasil em 2019, de acordo com o Portal do Empreendedor. Contudo, manter um negócio não é tarefa simples em um cenário de crise, o que se verifica pelo alto índice de inadimplência que alcançou cerca de 54% dos microempresários neste ano. O empreendedorismo constitui importante possibilidade de inserção produtiva das pessoas, mas deve-se alertar para o risco de muitos negócios servirem para mascarar parte do trabalho que se realiza em condições precárias, ou funcionando para formalizar a informalidade. O empreendedorismo não pode ser utilizado simplesmente como salvação em momentos de desinserção do trabalho, tendo em vista a necessidade de qualificação dos empreendedores e a oferta de bens e serviços de qualidade numa economia competitiva. Assim, torna-se necessário a ampliação dos investimentos produtivos e o crescimento econômico para contribuir com o surgimento de pequenos empreendimentos sólidos, reduzindo a taxa de mortalidade das pequenas empresas e estimulando a geração de trabalho e renda decentes.

 

 

*Professora do Departamento de Economia/UFPB. Doutora em Sociologia do Trabalho/PPGS/UFPB. Coordenadora do projeto PIBIC/UFPB sobre trabalho e gênero. Integrante doLATWORK: Pesquisa e inovação das instituições de ensino superior da América Latina para a análise do mercado informal de trabalho.

 

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