A tragédia do voo 447 da Air France completa 10 anos nesta quinta-feira, 31, e, passada uma década, parentes brasileiros de parte das 228 vítimas ainda esperam o indiciamento de responsáveis pelo acidente. Trata-se do único acidente na rota entre Rio e Paris, operada pela aviação comercial há oito décadas. Da apreensão do desaparecimento da aeronave lotada – eram 216 passageiros de 32 nacionalidades, sendo 59 brasileiros – até o esclarecimento do que de fato aconteceu, feito após investigação francesa, passaram-se mais de três anos.
Mas conclusões do Escritório de Investigação e Análise para Aviação Civil da França (BEA, na sigla em francês) não trouxeram alívio, para ao menos parte dos parentes. Para alguns deles, reunidos na Associação Brasileira dos Familiares de Vítimas do Voo AF447, possíveis responsáveis pela tragédia aérea seguem impunes. Presidente da associação, o aposentado Nelson Faria Marinho, de 76 anos, perdeu na tragédia o filho, também Nelson, então com 40 anos, que estava de mudança para a Europa. Desde então, já viajou a Paris para acompanhar as investigações do caso ao menos 15 vezes.
“A denúncia criminal ficou a cargo da Justiça francesa”, explica o aposentado, ao se referir a um inquérito que culpou o comandante Marc Dubois e os pilotos David Robert e Pierre Cedric Bonin pelo acidente. A investigação das autoridades aéreas francesas indicou que um problema tido como simples, o acúmulo de gelo em um instrumento que mede a velocidade do avião, resultou em uma série de indicações incorretas sobre o status do voo a Robert e Bodin, que efetuaram comandos com base nessas informações. Eles terminaram por fazer a aeronave perder sustentação aerodinâmica. Dubois entrou na cabine depois que os problemas já haviam começado e pouco pôde fazer para reverter a queda fatal.
Marinho vem argumentando, desde que passou a estudar o tema, que os pilotos não poderiam ser culpados pela tragédia, e que 19 empresas envolvidas na construção do Airbus tinham de ser melhor investigadas. “Esse modelo de avião caiu em seu voo inaugural mas, por sorte, o piloto não morreu”, diz. “Se você pegar esse caso recente, da Boeing (o 737-Max, que caiu em março, na Etiópia), eles impediram o avião de voar assim que perceberam falha.” Com laudos e estudos de engenheiros europeus dando detalhes sobre o avião envolvido na tragédia, a associação ainda pressiona, especialmente com vídeos nas redes sociais, as autoridades brasileiras. Marinho argumenta que, em que pese haver uma ação penal francesa, o Brasil deveria concluir um inquérito aberto sobre o tema.
Um inquérito civil foi aberto pelo Ministério Público Federal (MPF) em Recife, capital mais próxima do ponto de partida para as buscas do avião (o ponto do acidente fica em águas internacionais) e, em 2012, transferido para Brasília. Marinho afirma que, depois disso, a ação foi levada ao Rio, onde está a maioria dos familiares brasileiros. Então, parou. “É questão de justiça (haver denúncia)”, afirma. Marinho fez acordo de indenização com a seguradora da Air France, e foi seguido pela maioria das vítimas brasileiras. “Mas houve pessoas que não fizeram acordo e as ações ainda estão tramitando, sem o pagamento das indenizações.”