A cidade da Bahia vestiu-se de branco e, ontem, como soe acontecer todos os anos na segunda ou terceira quinta-feira de janeiro, deu graças ao Senhor do Bonfim e a Oxalá. A lavagem do Bonfim é uma festa singular, única no mundo, pois em canto algum deuses tão diferentes são cultuados em uma mesma cerimônia. Em que lugar do mundo a tradição católica abraça a tradição pagã e juntas homenageiam suas divindades? Em que lugar do mundo uma festa do candomblé ocorre no adro de um igreja católica? É tão bela e tão ecumênica a Lavagem do Bonfim que deveria ser mostrada ao mundo como a festa do congraçamento religioso que se realiza em Salvador, a Roma negra do mundo cristão. E não cabe aqui discutir se a festa tem origem africana ou europeia. A mitologia negra marca sua origem na África como uma homenagem à Oxalá, a divindade iorubá associada a criação do mundo e da espécie humana. Há também quem veja nela uma origem europeia, pois as lavagens já existiam em Portugal antes mesmo da escravidão. Mas a origem não tem nenhuma importância, o que importa é a tradição e o apelo popular de um festa que se enraizou no imaginário do povo baiano e que se fez presente em todos o momentos da história da Bahia.
A política sempre esteve na lavagem do Bonfim e foram muitos os governadores que lutaram para permitir a prática da dupla pertença pelo povo baiano. Entre eles, como não destacar o prefeito de Salvador Antônio Carlos Magalhães que, a partir de 1969, lutou junto a Igreja Católica pela liberação da festa e do adro da Igreja e, por isso, vestido a rigor, de paletó e gravata, foi batizado pelas baianas que derramaram a água de cheiro de suas quartinhas sobre sua cabeça. A teologia sempre esteve presente na lavagem do Bonfim e como não destacar o cardeal D. Eugênio Salles que liberou o adro da Igreja ao candomblé para que ali, em verdadeira epifania, fossem louvados Oxalá e o Senhor do Bonfim. A História também esteve presente na Lavagem do Bonfim e em 1944, em meio a segunda guerra mundial, Jorge Amado, ao fazer a louvação da festa, lembrou a beleza da procissão, dizendo que ali se misturavam os “cantos religiosos em estropiado latim aos cânticos negros das macumbas” e que naquela festa não havia lugar para o pecado, pois o demônio há muito que estava em meio aos exércitos nazistas.
O nosso vate maior viu nos ombros das lindas baianas o V da vitória “um grande V de flores, que o povo depositou aos pés do santo”, e rezando – tanto os fieis da igreja católica quanto os prosélitos dos candomblés da cidade – pediam ao Senhor do Bonfim e a Oxalá a vitória dos exércitos aliados. Em toda a sua história recente, a cidade da Bahia viveu sob as graças do Senhor do Bonfim e de Oxalá e essa festa única precisa ser mostrada ao mundo, como algo tão singular e especial quanto a Festa de São Firmino em Pamplona, a Oktoberfest em Munique ou o Holy Festival na Índia. O turismo está renascendo em Salvador graças ao trabalho profissional do poder público que recuperou nossa cidade e já é destaque nos rankings do turismo mundial e esse renascer será mais amplo quando for divulgado ao redor do mundo a beleza de festas como a de Iemanjá e da Lavagem do Bonfim.
A cidade da Bahia está ressurgindo como destino turístico, mas esse renascimento não pode estar baseado apenas no mar maravilhoso ou no sol que nunca nos abandona, ele precisa estar fundado na nossa identidade que é o que nos diferencia. A Bahia é uma nação e sua identidade está dada pela comida, pela história, pela música, pela religião, pelo patrimônio, pelo jeito de ser e de falar e pelas festas que são as manifestações populares do que somos. E se o carnaval é o clímax da nossa alegria, a festa do Bonfim é o apogeu da nossa baianidade. Ninguém será inteiramente baiano se não tiver sua iniciação na colina sagrada, vendo as baianas lavar as escadarias da igreja e molhando-se na água cheiro. Ninguém conhecerá a fundo a Bahia se não viver suas festas, se não der o presente a Iemanjá no dia 2 de fevereiro e se não subir a colina sagrada para ver a lavagem que é capaz de unir o sagrado e o profano e de fazer do Senhor do Bonfim e de Oxalá deuses gêmeos que protegem todos aqueles que buscam a paz.
O RENASCIMENTO DO CENTRO
O renascimento turístico de Salvador acontece concomitantemente ao florescimento do centro histórico da cidade e não poderia ser de outra maneira, afinal é ali o palco maior do magnifico patrimônio arquitetônico e de sua singular cultura afro-brasileira. E o centro histórico precisa se vestir de gala para apresentar a baianos e turistas suas festas, seus museus e seu patrimônio histórico e imaterial. Felizmente, o centro histórico tem agora uma rede hoteleira de qualidade, pronta para receber quem nos visita. Na região reinam imponentes o recém inaugurado Hotel Fasano e o Fera Palace Hotel, chamado de joia da Arte Déco pelo The New York Times, mas há também o Wish Hotel da Bahia, tombado pelo patrimônio histórico, e uma joia arquitetônica do modernismo. E tem ainda o Pestana Convento do Carmo, funcionando um edifício do século XVI, a Casa Amarelindo, uma mansão colonial do século XIX, e o Hotel Butique Villa Bahia, só para citar alguns. É bom ver a Prefeitura de Salvador e o Governo do Estado investindo no centro histórico, lembrando que são bem vindas ações no âmbito da segurança pública,(que tal um grupamento especial para a região?), na divulgação e facilidade de acesso aos museus e outros prédios, no estimulo à programação cultural e artística e por aí vai. E vale lembrar: investir no centro histórico é estimular o turismo na cidade inteira.
MERCADO IMOBILIÁRIO EM ALTA
São muitos os sinais de reaquecimento do mercado imobiliário em Salvador. Os sinais passam pelo estoque de imóveis novos à venda na cidade, que é o mais baixo dos últimos 5 anos, pela leve recuperação nas vendas de imóveis no ano passado e pelo otimismo com as propostas do novo governo. Além disso, já há novos lançamentos na praça. A Odebrecht, por exemplo, lançou o Monvert no Horto Florestal e vendeu as 140 unidades seis meses antes de começar as obras, demonstrando que há clientes dispostos a investir. O mercado ainda está em compasso de espera, mas deve deslanchar em 2019.
CONSELHOS PROFISSIONAIS
O governo federal, que retirou a obrigatoriedade da contribuição sindical, precisa fazer o mesmo com relação aos conselhos que representam profissionais liberais. Esses conselhos são autarquias vinculadas ao governo e obrigam a qualquer portador de diploma que exerça a profissão a se associar e pagar contribuições anuais absurdas, sob pena de passar a compor o cadastro de inadimplentes do governo. O pretexto é que essas autarquias federais fiscalizariam o exercício da profissão, mas, com uma ou duas exceções que não precisariam da obrigatoriedade, transformaram-se em cartórios burocráticos.