segunda, 03 de novembro de 2025
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CÉSAR SOUZA –  SONHOS EMPRESARIAIS QUE VIRAM PESADELOS!

Redação - 03/11/2025 05:00 - Atualizado 03/11/2025

O preocupante cenário com o número crescente de empresas que estão se vendo forçadas a entrar em RJ – Recuperação Judicial, ganhou um novo colorido com as notícias recentes sobre a crise enfrentada por algumas empresas icônicas como a Cosan e a Ambipar. O que parecia muito sólido parece se dissolver como fruto de um emaranhado de erros tanto negociais quanto atitudinais, com as revelações ultrapassando as paredes das empresas. e ganhando contornos surpreendentes.

Até mesmo a metáfora do “sonho grande” de empresários como Jorge Paulo Lehman, parece se transformar em pesadelo quando tornam-se públicos os sérios problemas nos seus diversos negócios. Como se não bastasse o desconforto ainda não devidamente explicado com o sucedido nas Lojas Americanas, agora temos notícias que a sua rede de 57 lanchonetes Burger King nos Estados da Geórgia e da Flórida, um investimento de cerca de 1 bilhão de dólares em 2010, recorreu ao Chapter 11 da Lei de Falências nos Estados Unidos.  Em 2019, o investimento na Heinz, empresa que atua no ramo de condimentos, mostardas e ketchup, feito pelo grupo por ele liderado, começou a azedar depois da fusão com a gigante Kraft Foods e o 3G se retirou de fininho do negócio em 2021.

Essa deterioração empresarial não é privilégio de poucas empresas. Esse processo tem sido bastante comum e frequente.

O resultado de um levantamento constata que das 20 maiores empresas do País em 2015, apontadas por várias publicações, apenas 11 continuavam na mesma lista em 2021. Ou seja, 45% delas não permaneceram no ranking. E algumas delas não estão mais em lista alguma. Simplesmente faliram, desapareceram.

Não precisamos de muito esforço para nos lembrar das inúmeras marcas famosas e icônicas que sumiram no passado, além de casos recentes daquelas que foram tragadas em escândalos de operações policiais.

Pensemos na sombria analogia entre os acidentes aéreos e o colapso de empresas. Em ambos os casos, usualmente ocorre uma perversa combinação de fatores, pois, raramente é um único problema a causa do desastre.

Enumero a seguir 15 causas  recorrentes para a quebra do que antes parecia sólido, baseado em minha experiência como executivo e, durante as últimas duas décadas, como consultor de inúmeras empresas de variada gama de negócios, tamanho e geografia de atuação:

  • Ausência de um Propósito claramente definido;
  • Posicionamento indefinido ou inadequado de produtos/serviços;
  • Baixo grau de inovação, incapacidade de olhar à frente e buscar renovação, dirigindo a empresa pela nostalgia do espelho retrovisor;
  • Pouco conhecimento sobre o que os clientes de fato necessitam e valorizam, oferecendo bens e serviços para os quais já não existe demanda; ]
  • Conflitos de interesses ou problemas emocionais entre sócios e/ou familiares;
  • Incapacidade de formar sucessores, especialmente nas empresas familiares;
  • Estrutura de capital inadequada, levando a custos financeiros proibitivos devido ao grau de endividamento para financiar o Capex, que poderia ter sido evitado;
  • Ênfase maior no crescimento (faturamento, fatia de mercado, etc) do que na Rentabilidade, no ROIC – Retorno sobre o Capital Investido e GLC – Geração Líquida de Caixa;
  • Aquisições mal feitas, cujo valor resultante é menor do que a soma do valor das empresas antes da compra ou fusão;
  • Falta de integração entre áreas, ocasionando enorme desperdício de recursos, tempo e energia;
  • Dispersão excessiva dos negócios, com falta de foco, gerada por diversificação sem sinergia com o “core business” nem com o propósito da empresa;
  • Cultura contraproducente caracterizada por muito individualismo, reativismo, negacionismo, paternalismo, imediatismo e comodismo, além de baixa velocidade de respostas e falta de transparência, além de atitudes tóxicas como arrogância e falta de escuta ativa que, paradoxalmente, transformam o sucesso no maior inimigo do sucesso
  • Fragilidade na prática da governança, integridade e ética, muitas vezes comprometida pelas tentações oportunísticas;
  • Decisões baseadas no achismo e em informações precárias e/ou equivocadas;
  • Escassez de líderes inspiradores, com gestores carentes de determinação, resiliência e capacidade de superar obstáculos;

A grande maioria de casos de empresas em dificuldade tem como causa-raiz da sua situação pelo menos um dos itens listados acima. Ah, quase ia esquecendo dos sistemas inadequados de remuneração que na maioria das empresas oscilam entre dois extremos: de um lado não incentivam, e as vezes até punem, a obtenção de resultados que nem sempre são grandiosos, apesar de   saudáveis; ou, por outro lado, premiam, com bônus exagerados, resultados imediatistas obtidos por práticas predatórias que acabam por comprometer a autossustentabilidade da empresa no longo prazo.

Também não se pode menosprezar fatores externos, como novos concorrentes; tecnologias disruptivas; mudança em políticas governamentais que alteram inflação, juros e câmbio; impacto de crises no cenário internacional; e brutal alteração no custo dos insumos.

Entretanto, esses fatores deveriam ser detectados em tempo hábil pelo radar de líderes antenados que anteveem, antecipam e transformam possíveis ameaças em oportunidades de negócio. Já os complacentes e negacionistas não percebem tendências e, depois, apenas lamentam a mudança dos ventos.

Sabemos que, não à toa, bons marinheiros são formados no enfrentamento de tempestades e não em períodos de calmaria.

Por esses motivos, costumo afirmar que o maior concorrente das empresas quase sempre está dentro de casa, na lacuna de formação de profissionais proativos, assertivos e protagonistas.

O consultor e autor Jim Collins, que tive o prazer de trazer ao Brasil em 1994, quando ainda despontava no cenário corporativo com o seu “Feitas para Durar”, publicou em 2010 uma obra-prima, chamada “Como as Gigantes Caem”, que recomendo como leitura obrigatória.

Assino embaixo da inteligente proposta dos cinco estágios do declínio descritos no livro, mas, aqui, procuro colocar a bola no chão, indo diretamente ao que observo no mundo corporativo, com enfoque mais no “por que” do que no “como”; mais nas causas-raiz do declínio do que nos sintomas.

Sugiro que o leitor use a lista das 15 causas que apontei acima, como um checklist. Se perceber dois ou mais itens muito presentes no cotidiano da sua empresa, faça um pit stop de avaliação e tome providências antes que um possível câncer se consolide e desencadeie uma metástase, arrastando sua empresa para um indesejado estágio terminal.

 

 

César Souza, consultor e conselheiro de empresas, é o Presidente do Grupo Empreenda

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