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JUSTIÇA RECONHECE TRABALHO INVISÍVEL DAS MÃES NA FIXAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA

João Paulo - 11/05/2025 09:00

Uma decisão recente do Tribunal de Justiça do Paraná ficou marcada por um feito histórico: ao julgar um caso envolvendo uma mãe que deixou o mercado de trabalho para cuidar integralmente da casa e dos filhos, os desembargadores reconheceram que essa dedicação tem valor econômico que deveria ser considerado na hora de calcular a pensão alimentícia. Esse reconhecimento do trabalho invisível das mulheres, apesar de novo, já vem sido discutido entre juristas baianos.

A advogada especialista em Direito da Família, Verena Hora, escreveu um artigo sobre o assunto, apontando a mudança de paradigma que a visibilidade desse trabalho deve desencadear. “A inclusão do trabalho visível no cálculo da opção alimentícia é um passo fundamental para essa reparação histórica da desigualdade de gênero, levando em consideração que, historicamente, o trabalho, o tempo, o esforço e o cuidado com a casa, com os filhos, que não são remunerados, sempre foram exercidos majoritariamente por mulheres”, destaca.

A ideia da incorporação da chamada ‘economia do cuidado’, correspondente ao trabalho invisibilizado de milhões de mulheres no país, segue a linha do Protocolo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que entende que as relações familiares devem ser analisadas sob uma perspectiva de gênero, considerando a histórica naturalização do cuidado e afazeres domésticos como uma obrigação feminina.

Essa naturalização fez com que muitas dessas mulheres tenham se privado de se desenvolver em outras áreas para viver em prol da criança. “Ao longo dos anos, sempre foram as mulheres que abriram mão de seus trabalhos externos para cuidar tanto dos filhos quanto da casa. Logo, essa decisão busca atribuir o devido valor a todos esses anos de invisibilidade”, ressalta Larissa Muhana, advogada especialista em Direito da Família.

No cenário jurídico, o que muda, efetivamente, é a ampliação dos critérios na hora de calcular a pensão. Dessa forma, o trabalho invisível das mães passa a contar, assim como já ocorre com os gastos com a criança no que diz respeito a escola, comida e saúde. Esse trabalho deve ser provado perante a Justiça a partir de uma reunião de evidências.

“Os meios de prova são a rotina da mãe. Ela precisa comprovar, por meio de relatos, as horas dedicadas aos filhos e os afazeres domésticos, demonstrar que de fato é uma pessoa que deixou de trabalhar para se dedicar ao filho e ao lar. [Essa prova deve ser] através de testemunhas, que podem ser familiares, amigos e vizinhos que acompanharam essa rotina”, detalha Verena Hora.

Ela afirma que, apesar de cada caso precisar ser analisado individualmente, é provável que os custos do trabalho invisibilizado das mães seja equivalente aos custos dos serviços de uma babá ou empregada doméstica. “É difícil quantificar, mas existem esses parâmetros de profissões que se equiparam e podem, em um caso concreto, viabilizar essa compensação econômica”, acrescenta Verena.

O novo olhar sobre o trabalho feito pelas mães no cuidado com os filhos e com o lar pode abrir espaço para pedidos de revisão de pensões antigas, especialmente quando a decisão judicial anterior desconsiderou esse histórico. Isso, no entanto, não se trata de uma regra automática, como ressalta o advogado André Andrade, mestre em Família na Sociedade Contemporânea.

“Como ainda é um entendimento recente e em construção, é preciso cuidado ao usá-lo como base. Cada caso exige uma análise específica e uma argumentação bem estruturada. O reconhecimento do trabalho é uma conquista, mas deve ser usado com responsabilidade como uma ferramenta jurídica para buscar decisões mais equilibradas e conectadas à realidade de cada família”, ressalva.

Na Bahia, a advogada Larissa Muhana pontua que o tema ainda não está sendo tratado de maneira institucional, mas que isso não impede um avanço no horizonte. “Não há consolidação da temática no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Acredito que cabe a nós, tanto advogados quanto sociedade civil, trazer à tona cada vez mais essa temática em nosso estado, especialmente no âmbito do judiciário”, finaliza.

 

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