JOSÉ MACIEL DOS SANTOS FILHO (1)
O Brasil é indiscutivelmente uma grande potência agrícola global. Alguns analistas atribuem essa pujança do nosso agro aos “volumosos” subsídios concedidos aos agropecuaristas pelos nossos governos. Várias entidades e autores têm abordado esse assunto, sendo a OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico o organismo que tem acompanhado o tema em vários países ao longo dos últimos 20 anos. Os relatórios da OCDE vêm quantificando as medidas de suporte e apoio direto aos agricultores e apresentando os dados como proporção do valor bruto da produção (VBP)do setor agropecuário de um vasto conjunto de países , incluindo Brasil.
Pois bem, desde 2004, os informes dessa conceituada instituição têm constatado que o Brasil é uma das nações que menos subsidiam a agropecuária. Em 2004, essa taxa era de 3% do valor bruto da produção do setor, taxa essa superior apenas aos 2% ostentados pela Nova Zelândia, país este classificado na primeira posição do ranking dos países que menos subsidiam o agro. Uma atualização dos números em 2020-2021 aponta uma diminuição da taxa brasileira para algo na casa dos 2%.
No citado relatório de 2020-2021, os subsídios agrícolas mundiais continuaram aumentando e alcançaram a astronômica safra agregada de 720 bilhões de dólares no período entre 2018 e 2020, sendo que os países ricos , principalmente os da União Européia e os EUA, continuam a assegurar boa parte da renda de seus produtores, inclusive com pagamentos diretos em função de área plantada e de outros parâmetros. Embora o apoio médio mundial representasse cerca de 18% do VBP , existem casos de países, como Noruega, Suíça e Japão, onde os subsídios alcançam a proporção de quase 60% de seus respectivos VBPs, caracterizando seus produtores quase como “funcionários públicos”, dada a enorme ajuda oficial. China , Índia e Indonésia também ostentam índices elevados de subsídios . União Européia e EUA têm contribuído com 19% e 10% da receita bruta de seus agricultores, respectivamente, causando distorções consideráveis no comércio agrícola mundial, e configurando um cenário adverso de concorrência para países como o Brasil, que subsidiam pouco o seu setor agropecuário.
No caso do Brasil, a taxa encontrada de 2% do VBP pode estar superestimada. A depender dos critérios utilizados, os subsídios aplicados aqui podem ser inferiores a essa taxa . Vamos mostrar como chegamos a valores menores que 2%. Aqui nos nossos cálculos consideramos como subsídios aquelas rubricas nas quais os custos estão sendo compartilhados entre os produtores rurais e o governo, Nesse caso, o governo entra com recursos orçamentários para baratear o custo de certos instrumentos de política agrícola, previstos nos Planos Safra anuais. Essa ajuda oficial corresponde, em boa medida, a dois tipos de aportes de recursos governamentais: os recursos para o subsídio que vai equalizar parte dos juros do crédito agrícola, o que vai possibilitar o setor ter acesso a taxas de juros inferiores aos custos de captação dos bancos, com o governo bancando a diferença; a outra rubrica é o seguro rural, que disponibiliza recursos para cobrir parte dos custos das apólices de seguro adquiridas pelos agricultores. O produtor compra a apólice e o governo ajuda a diminuir o custo para o empreendedor rural, entrando com uma parte chamada de subvenção ao prêmio de seguro rural.
Se pegarmos os dados do Ministério da Agricultura sobre as disponibilidades de recursos para a safra 2023-2024, temos cerca de 1, 4 bilhão previsto para o seguro rural e 13,6 bilhões de reais para cobrir a equalização de juros, somando uma disponibilidade de 15 bilhões de reais para a safra que está sendo plantada agora e vai ser colhida no primeiro semestre do próximo ano.
Na divisão desse montante pelo valor bruto da produção da safra 2022-2023 (o ideal era usar o VBP da safra 2023-2024), que é de 1,142 trilhão de reais, aproximadamente, encontraremos um subsídio de 1,3% do VBP nacional, ou seja, um valor bem abaixo do estimado para o Brasil pela OCDE. Este valor chega a ser menor que 1% se considerarmos os subsídios alocados para a chamada agricultura empresarial. Mesmo que se agregue outras ajudas do Ministério da Agricultura, a taxa de subsídio não parece atingir os 2% do VBP.
Em resumo, não é verdade que a agropecuária brasileira é fortemente subsidiada pelos sucessivos governos. O Brasil figura no universo de países que menos subsidiam o agro, universo esse integrado além do Brasil, pela Austrália, Nova Zelândia, , Chile e África do Sul. Como diz o professor Xico Graziano, da FGV-SP, podemos nos orgulhar do agro nacional. Ele segura, com suas próprias pernas, a economia brasileira.
(1)Consultor Legislativo e doutor em Economia pela USP. E-mail: