A CPI da Covid vota nesta terça-feira (26) o relatório final elaborado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL). A análise do parecer será o último ato da comissão, criada há seis meses para investigar as ações e omissões do governo federal durante a pandemia. O documento com mais de 1,1 mil páginas pede o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por considerar que ele cometeu pelo menos nove crimes. O arquivo traz:
O relator também detalha o atraso na aquisição de vacinas e a sucessiva falta de resposta às fabricantes, como à Pfizer e ao Instituto Butantan, que desde 2020 tentavam vender o imunizante ao governo brasileiro. Calheiros ainda responsabiliza duas empresas (Precisa Medicamentos e VTCLog), e mais de 70 pessoas, entre as quais três filhos do presidente, ministros, ex-ministros, deputados federais, médicos e empresários. Ao todo, o relator aponta para o cometimento de mais de 20 infrações.
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Se aprovado, o documento será encaminhado a órgãos competentes, como o Ministério Público, para que deem continuidade às investigações e confirmem – ou arquivem – os pedidos de indiciamento. Senadores também articulam para que o relatório seja usado como base para um novo pedido de impeachment de Bolsonaro elaborado por juristas.
O que diz o relatório
O relatório de Renan Calheiros lista 13 tópicos da investigação. A lista inclui a oposição do governo às medidas não farmacológicas (como uso de máscara e distanciamento social), o colapso na saúde pública do Amazonas e também a atuação da operadora Prevent Senior. O documento ainda aponta para a existência de um gabinete paralelo – composto por médicos, políticos e empresários – que aconselhava o presidente “ao arrepio das orientações técnicas do Ministério da Saúde”. Segundo o relator, partiu desse grupo a ideia da propagação do vírus “livremente entre a população”, a fim de que fosse atingida a “imunidade de rebanho” por meio da contaminação natural.
Conforme o relator, a CPI pôde comprovar:
“Com esse comportamento, o governo federal, que tinha o dever legal de agir, assentiu com a morte de brasileiras e brasileiros”, afirma no texto o senador Renan Calheiros.
Crimes atribuídos a Bolsonaro
“O presidente da República repetidamente incentivou a população a não seguir a política de distanciamento social, opôs-se de maneira reiterada ao uso de máscaras, convocou, promoveu e participou de aglomerações e procurou desqualificar as vacinas contra a covid-19. Essa estratégia, na verdade atrelada à ideia de que o contágio natural induziria a imunidade coletiva, visava exclusivamente à retomada das atividades econômicas”, escreve Calheiros no documento. Segundo o relator, as ações de Bolsonaro durante a pandemia podem ser enquadradas em crime de responsabilidade — infração imposta ao presidente da República em caso de atos que atentam a Constituição, e que podem resultar em impeachment.
Isso porque, escreveu o relator, a atuação de Bolsonaro “mostrou-se descomprometida com o efetivo combate da pandemia da Covid-19 e, consequentemente, com a preservação da vida e integridade física de milhares de brasileiros”. Entre os atos de Bolsonaro que, para Renan, “incontestavelmente atentaram contra a saúde pública e a probidade administrativa”, estão a “minimização constante da gravidade da Covid-19” e a criação de mecanismos ineficazes de controle e tratamento do coronavírus.
O relator afirmou ainda que Bolsonaro “foi o principal responsável pela propagação da ideia de tratamento precoce”. “Em tempos normais, seria apenas um exemplo de desprezível charlatanismo pseudocientífico. Contudo, em meio a uma pandemia global, colaborou para gerar uma monstruosa tragédia, na qual alguns milhares de brasileiros foram sacrificados”, escreveu o relator.
10 nomes novos
Apresentado na última quarta-feira (20), o relatório de Calheiros trazia o pedido de indiciamento de 66 pessoas e duas empresas. No entanto, senadores constataram que havia omissões de nomes considerados importantes para a responsabilização na pandemia, como o de servidores e ex-servidores do Ministério da Saúde, e de pessoas ligadas ao Amazonas. Segundo o vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues, em reunião na noite desta segunda-feira (25), a cúpula da CPI definiu que serão acrescentados 10 nomes à lista de pedidos de indiciamentos.
Reação governista
Presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM) já afirmou “ter certeza” de que o relatório será aprovado. Formada por onze titulares, a comissão tem maioria alinhada ao parecer de Renan. No entanto, é esperado que senadores governistas marquem posição e contestem o documento. Marcos Rogério (DEM-RO), que compõe a “tropa de choque” de Bolsonaro na CPI, apresentou um voto em separado no qual não pede nenhum indiciamento.
No documento, o senador defendeu a autonomia médica para justificar a prescrição de remédios sem eficácia e disse que “crimes gravíssimos” foram cometidos por alguns governadores, prefeitos e secretários”, de modo a poupar o governo federal na gestão da pandemia.
“Não foram encontradas quaisquer evidências sobre atos e omissões ilegais praticadas por autoridades e servidores da Administração Pública Federal, no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus”, escreveu o senador no parecer. Os aliados ao Palácio são minoria na comissão e, portanto, é considerada bastante baixa a chance de o relatório ser aprovado. Eduardo Girão (Pode-CE) também apresentou um relatório alternativo sobre os trabalhos da CPI. No documento, o senador diz que não foram encontradas evidências de atos e omissões ilegais praticados por autoridades e servidores do governo federal no enfrentamento à pandemia.
O parlamentar afirma também que, apesar de “indícios” de irregularidades, a CPI não foi capaz de investigar ações de gestores estaduais e municipais. O senador propõe a “extinção melancólica” da comissão, que, segundo ele, não cumpriu seu objetivo.
Foto: divulgação