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NA CONTRAMÃO DA CRISE, SETOR DE GAMES CRESCE 12% NA PANDEMIA

Redação - 19/09/2021 08:07

Quem diria que criar universos paralelos poderia ser um escape tanto para a monotonia da pandemia quanto para a crise financeira gerada por ela. Em meio a tantos setores que estão sofrendo no atual cenário, o de games tem prosperado com crescimento econômico. Em 2020, o faturamento global foi de US$ 126,6 bilhões, representando 12% a mais que em 2019, segundo o relatório da Superdata, consultoria do grupo Nielsen especializada na área.

As boas notícias para o segmento não param por aí. A expectativa é que o faturamento aumente cada vez mais. Em Salvador, os desenvolvedores de games estão atentos ao fomento no campo e já percebem os efeitos positivos nos estúdios baianos. O CEO e produtor da Aoca Game Lab, Filipe Pereira, conta que nesse período a empresa cresceu e novas oportunidades de captação de recursos surgiram para ajudar na fase difícil que todos estão jogando: a pandemia.

“O faturamento aumentou, o que resultou em um time maior, que dobrou em quantidade em relação ao início da pandemia. Além disso, conseguimos um investimento através do Black Founders Fund, um programa do Google Startups Brazil, que foi um ponto de virada para nós, o qual sem o momento atual não seria possível”, esclarece o produtor. Um dos principais impulsionadores do avanço nas finanças da categoria é o isolamento social. O confinamento limitou as possibilidades de lazer e deixou a imersão nas realidades permitidas pelos videogames mais atrativa. No Brasil, segundo um estudo feito pela bandeira de cartões Visa, as transações financeiras feitas nas principais plataformas e consoles de jogo cresceram 140% em 2020, em comparação com o mesmo período no ano anterior.

Quem percebeu uma maior busca por esse tipo de entretenimento foi o co-fundador da Rumbora Party Games, Tiago Prudente, que junto com seu irmão Daniel Prudente, gere o negócio. O estúdio lançou o jogo Tinker Racers na plataforma Steam, que foi bem recebido pelos consumidores. “O impacto da pandemia nas vendas do jogo foi positivo. Percebemos, por um momento, que os picos de vendas que ocorriam nos finais de semana no período pré-pandemia, passou a ser constante nos dias úteis e comerciais. A situação já mudou, mas ainda assim as vendas se mantêm melhores do que no período anterior, conta Tiago.

Embora avanços estejam sendo registrados, o ecossistema local ainda está se consolidando. Foi em 2005 que a Universidade do Estado da Bahia (Uneb) realizou o primeiro Seminário de Jogos Eletrônicos, Educação e Comunicação (Sejeec). Desde então, o nicho começou a se desenvolver. Um marco importante para a construção da cena baiana de jogos digitais ocorreu em 2006, quando houve a Chamada Pública MCT/Finep/MEC Jogos Eletrônicos Educacionais que, de quase 150 propostas, aprovou 13 projetos no Brasil, sendo 3 na Bahia. A profissionalização em uma universidade pública do estado só aconteceu em 2017. A iniciativa foi da Uneb com a primeira graduação tecnológica em Jogos Digitais.

Com o histórico de iniciação ainda recente, os profissionais que atuam nesse ramo percebem uma expansão tímida no mercado da Bahia, principalmente se for comparada com o desenvolvimento internacional ou do eixo Rio-São Paulo. “Ainda encontramos muitas dificuldades de disponibilizar o que é produzido aqui para um cenário maior, para um público que interaja de maneira mais efetiva”, explica a pesquisadora em Jogos eletrônicos e aprendizagem, Lynn Alves.

Apesar das limitações, os pequenos estúdios da capital baiana têm progredido e buscado estratégias para não deixar o boom que acontece na indústria passar. Um exemplo é a ERA Game Studio, que de acordo com a co-fundadora Ana Antar “sempre trabalhou com um modelo híbrido de jogos (live games), que acontecia de maneira presencial”. Com a crise sanitária, a migração para o digital aconteceu, e o primeiro multiplayer online foi lançado no final de 2020. Trabalhar mais para suprir a alta demanda também se tornou uma realidade para quem é funcionário da ERA.

“Durante a pandemia, a nossa produção de jogos sob encomenda aumentou consideravelmente”, diz Ana, que tem coordenado várias práticas para impulsionar o setor. Entre elas, a criação de um novo jogo, que é uma adaptação do clássico shakespeariano, Romeu e Julieta, com previsão de lançamento para o primeiro semestre de 2022.

“Como o Brasil é um país muito grande, a expansão do setor de games não acontece de forma homogênea. Então, nem todos os estúdios conseguem o mesmo tipo de investimento e crescimento a curto prazo. A ERA ainda é um estúdio de jogos 100% independente, que segue buscando investimento. Apesar de existir um crescimento do nosso setor durante a pandemia, ele se apresenta de forma um pouco mais tímida para os estúdios menores, que é o nosso caso, mas ainda assim é significativo”, afirmou a co-fundadora.

Na aprendizagem

O ambiente virtual se tornou um canal de alternativas para a Strike Games, que decidiu focar em ministrar cursos de desenvolvimento de games para a aprendizagem escolar. “Na pandemia vieram presentes inesperados para a gente, como por exemplo migrar para o digital e poder atender ao Brasil inteiro”, explica o CEO Alexandre Santos.

Em análise do mercado, Alexandre percebeu que muitos professores estavam buscando métodos lúdicos para aplicar para os alunos. Por isso, para aproveitar o fomento na indústria, direcionar as ações do estúdio para as formações foi a estratégia escolhida. “Nós observamos uma nova oportunidade nos treinamento, na possibilidade de ensinar a fazer jogos voltados para educação. Nesse contexto, muitos profissionais da área passaram a buscar recursos para utilizar no ensino remoto. Assim, os jogos são excelentes recursos para as aulas”, explica Alexandre.

Quebrar as barreiras geográficas já não é mais um problema. Com os avanços da tecnologia, muitos são os canais que permitem esse feito. Os eventos, em sua grande maioria, estão acontecendo no ambiente digital. Para Filipe, o formato é um ponto positivo, uma vez que simplifica a participação em diversos projetos. “A estratégia que adotamos nesse contexto foi de tentar aproveitar o fato de que parte dos eventos agora são online. Teremos, até o final do ano, participado de eventos de negócios em pelo menos 5 países diferentes. Esse não seria um número possível em outras condições. E, ainda dentro da lógica do online, fortalecemos os relacionamentos, com parcerias estratégicas, momentos de consultoria e mentoria que certamente vão repercutir muito no futuro próximo da Aoca”.

A Aoca, no âmbito internacional, tem conseguido bons resultados, que vão potencializando cada vez mais o espaço da empresa fora das fronteiras nacionais. Recentemente, o estúdio foi selecionado por um programa internacional da Google para fazer parte da aceleração de games independentes. “Lançamos o Árida: Backland’s Awakening em 2019. Em 2020, fizemos uma grande atualização para comemorar um ano de lançamento. De lá pra cá, entramos em outras lojas internacionais além da Steam, como a Microsoft Store e Humble Bundle. Participamos de algumas ações bem interessantes, como a Humble Down to Earth Bundle, uma ação promocional da empresa norte-americana Humble Bundle em alusão ao Dia da Terra”, conta Filipe.

Também em busca de levar as produções baianas para fora do Brasil, Tiago ficou atento às oportunidades e conseguiu emplacar o jogo em diversas plataformas. “O primeiro ponto foi perceber que várias empresas responsáveis por levar jogos para novas plataformas estavam à procura de novos games para fazer parceria. Então, ficamos mais atentos a isso. Agora, o jogo está presente no Xbox, PlayStation, Nintendo Switch, Google Play e App Store. Além disso, em algumas lojas do mercado Telco da Europa e Ásia”, diz.

Segundo Lynn, a passos curtos o ecossistema de jogos digitais se desenvolve na Bahia. Ainda que o desenvolvimento de jogos para dispositivos móveis possibilite que as pessoas conheçam alguns games locais, o estágio de desenvolvimento do campo ainda é inicial. Para ela, o motivo do crescimento lento é “a falta de políticas que estimulem e consolidem esses estúdios”.

A pesquisadora acha que o cenário precisa de uma representação mais ativa. “Temos o coletivo BIND e o Gama, mas eles estão adormecidos. Então, aqui no Nordeste, a gente precisa de uma representação mais efetiva para alavancar o crescimento, para ter um diálogo com o cenário internacional, estabelecer parcerias e dar visibilidade ao nosso ecossistema”, diz.

Foto: divulgação

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