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MERCADOS DE CARBONO SERÃO FOCO DAS DISCUSSÕES NA COP 25

Redação - 03/12/2019 07:00 - Atualizado 03/12/2019

Numa área rural do Camboja, as cascas do arroz são usadas para gerar eletricidade para as comunidades locais, normalmente dependentes dos altamente poluidores geradores a diesel. O projeto é financiado por indivíduos e empresas do outro lado do mundo que compram os assim chamados créditos de carbono, cada um equivalente a uma tonelada de CO2, para compensar as emissões de em seus países de origem.

Essa é apenas uma das maneiras como o CO2 é comercializado em todo o mundo, e um dos modelos de mercado de carbono que será discutido pelos negociadores na Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as Mudanças Climáticas (COP 25), em Madri. O objetivo é chegar a um quadro regulatório para um sistema de mercado de carbono, uma questão complexa prevista no Artigo 6º do Acordo de Paris sobre o Clima.

Para Ann-Kathrin Schneider, diretora de políticas internacionais da ONG ambientalista Federação Alemã para o Meio Ambiente e Conservação da Natureza (Bund, na sigla em inglês), o Artigo 6º impõe um “grande risco ao Acordo de Paris”. Ela acredita que o mercado de carbono poderia potencialmente desviar o foco dos países do objetivo de reduzir as emissões. “Não diria que esta é uma questão técnica. É um tema bastante político.”

Quase 200 países ratificaram o histórico acordo sobre o clima que visa limitar o aquecimento global a 2ºC acima dos níveis pré-industriais até o final do século 21, sendo o nível ideal 1,5ºC. Entretanto, as metas atuais de redução estabelecidas por cada país – chamadas de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês) – fazem com que ambos objetivos sejam considerados irreais. Com base nos números atuais, especialistas projetam um aumento da temperatura global de ao menos 3ºC.

Segundo seus defensores, contudo, o mercado de carbono pode ser essencial para metas climáticas ainda mais ambiciosas. Em Madri, serão discutidos dois sistemas diferentes de comercialização de carbono. O primeiro visa permitir aos países que excederem suas metas climáticas vender os excessos para as nações que enfrentam dificuldades em atingir seus próprios objetivos. Por exemplo, se um país que estabeleceu como objetivo reduzir as emissões de CO2 a um total equivalente a 100 toneladas conseguir fazer reduções reais de 110 toneladas, poderá vender as dez excedentes a outro que não conseguiu atingir suas próprias metas.

Stefano de Clara, diretor de políticas internacionais da ONG Associação Internacional de Comércio de Emissões (Ieta, na sigla em inglês), dedicada a estabelecer um parâmetro comercial internacional para as reduções, defende esquemas desse tipo como “ferramentas essenciais” para permitir aos países honrarem os compromissos assumidos no Acordo de Paris. “Idealmente, poderíamos ter um mercado global a pleno vapor, onde todos negociem entre si”, afirmou à DW, acrescentando que cada vez mais países consideram os mercados de carbono um mecanismo para atingir seus objetivos nacionais.

Entretanto, os críticos se mostram preocupados com o interesse crescente nesses sistemas, argumentando que poderia levar alguns países a estabelecer metas nacionais baixas para que possam vender seus créditos excedentes. “Atingir NDCs pouco ambiciosas não deveria bastar para participar de mecanismos baseados nos mercados”, afirmou Carsten Warnecke, cofundador do Instituto NewClimate. A seu ver, todas as NDCs devem ser suficientemente ambiciosas para que se fique bem abaixo dos 2ºC, e apenas os países cujas metas estão alinhadas com o Acordo de Paris possam participar dos sistemas de negociação de carbono: “Em teoria, apenas uns poucos países estariam aptos a vender seus excedentes de redução de emissões.”

Gilles Dufrasne, responsável pela política de preços de carbono do Carbon Market Watch, vai ainda mais longe. Ao invés de os créditos de carbono excedentes das metas domésticas de emissão serem vendidos a outras nações, o capital seria guardado para atingir outro alvo do Acordo de Paris: a criação de um fundo anual de 100 bilhões de dólares para medidas de mitigação e adaptação nos países em desenvolvimento, normalmente os mais afetados pelas mudanças climáticas. “Assim, levam-se em conta as finanças, mas não se atribui a redução das emissões a si próprio, seja um país ou uma empresa. “Passa a ser um acréscimo, que é o que os mercados, até a compra de créditos, deveriam ser: um sistema para realmente aumentar as ambições para provocar maiores reduções das emissões.”

As regras para gerir o comércio através da compensação também farão parte das discussões sobre o Artigo 6º em Madri, com negociadores desenvolvendo regras para o Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável, ferramenta que substitui o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (CDM, na sigla em inglês), criado há mais de uma década sob o Protocolo de Kyoto. O CDM permitiu que países ricos compensassem suas emissões domésticas de CO2 financiando programas de desenvolvimento sustentáveis para redução em nações emergentes. Entretanto, o Carbon Market Watch calcula que 85% dos projetos financiados através desse mecanismo teriam prosseguido de qualquer modo.

“Era para ser um sistema que permitisse aos países criarem metas mais ambiciosas”, explica Dufrasne. “Mas na verdade o que conseguiu foi tornar mais barato atingir as metas existentes, e ainda é possível argumentar que enfraqueceu os objetivos de realmente reduzir emissões. Os países compravam créditos que realmente não representam muita coisa.” Os críticos também afirmam que os créditos utilizados sob o CDM eram baratos demais, e não deveriam ser incluídos em nenhum dos novos esquemas, ponto que gera polêmica entre os países que detêm esses créditos.(g1)

Foto: GABRIEL BOUYS / AFP

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