

“Quem tem fome, tem pressa”, citando o saudoso militante Betinho e sua luta contra a fome, o governador Jerônimo Rodrigues regulamentou o Bahia Sem Fome como política estruturante, nesta quarta-feira, 26, durante o 4º Seminário Estadual do Programa, em Salvador.
A medida acontece dois anos após a sanção da lei. O decreto inédito detalha como a Lei 14.635 deve ser executada na prática e será publicado no Diário Oficial desta quinta-feira, 27. Durante a ocasião, o governador viabilizou ações de cunho emergencial para o combate à fome, na presença de representantes dos governos federal, estadual e municipais, iniciativas privadas e organizações da sociedade civil.
“Essa não é uma ação isolada, isso aqui é a defesa de um projeto que nós fazemos, nós queremos uma sociedade que se alimente e bem. Quando as pessoas não se alimentam bem, as pessoas adoecem mais, precisam de mais hospitais, de mais UPAs, de mais remédio, muitas vezes remédios que não podem comprar. É o encadeamento de uma coisa, e a fome é coisa montada. Tiremos isso da cabeça, de que a fome é mandada por Deus. De que a fome é coisa de Deus, que a pobreza é coisa de Deus. Comer é direito, se alimentar é direito, e quem tem que garantir é a governança”, afirmou o governador.
Para o coordenador-geral do Bahia Sem Fome, Tiago Pereira, este é um dia histórico na agenda de combate à fome na Bahia. “A regulamentação do Bahia Sem Fome vai ampliar a capacidade do Estado de colocar recursos públicos à disposição das políticas dos programas e dos projetos que fortaleçam o Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan).
“Outros estados ainda não produziram um decreto desse. Esse documento traz dimensões novas do ponto de vista da regulamentação de uma política pública. Ele parte dos conceitos do que é fome, insegurança alimentar, do que é a vulnerabilidade social. Esse decreto avança projetando um conjunto de ações estratégicas para que a gente possa promover a segurança alimentar e combater a fome”, explica.
Entre as normas abordadas no documento, estão as esferas que compõem o programa, o detalhamento do público prioritário e inovações com cozinhas comunitárias e solidárias, com as organizações sociais, cozinhas comunitárias municipais e com os municípios.
“O selo de responsabilidade é uma das grandes inovações. Porque é pra gente valorar, reconhecer, incentivar as iniciativas que promovem a garantia do direito humano à alimentação adequada. Ele estabelece formas de parceria com prefeituras e com a sociedade civil dentro do Programa Bahia Sem Fome”, explica o coordenador-geral do programa.
“São essas dignidades que fazem com que as pessoas, fruto do seu trabalho, fruto do acesso às políticas públicas, elas possam viver melhor, possam ter qualidade de vida. E que bom que a regulamentação do Bahia Sem Fome esteja acontecendo no Mês da Consciência Negra e após dois anos de instituída a lei. Lembrando que já estamos em atuação há três anos com ações efetivas”, ressalta Tiago Pereira.
O Brasil recentemente alcançou o menor índice de fome para o meio rural, para os domicílios chefiados por pessoas negras e por mulheres, segundo revelou a secretária Extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome, Valéria Burity, durante o evento.
“De um lado, temos o compromisso do governo federal, que também adotou programas como o Bolsa Família como benefício de prestação continuada, apoiou as cozinhas solidárias, apoiou a agricultura familiar com a produção de alimentos. Então, quando a gente reúne esse conjunto de ações, a gente consegue que as pessoas tenham comida na mesa. E o Bahia Sem Fome faz isso aqui no estado da Bahia. Essa é a grande promessa do presidente Lula, que as pessoas tenham três refeições por dia. Esse é o compromisso também do governo Jerônimo. Então, quando a gente cria a regra pra que isso aconteça de verdade na vida das pessoas, é muito importante e é uma forma da gente conseguir avançar mais ainda. A gente já reduziu muito o número de pessoas passando fome, por isso que o Brasil saiu do Mapa da Fome. A gente avançou muito, mas a gente precisa continuar avançando pra que a fome suma de vez do nosso país e daqui da Bahia”.
O Bahia Sem Fome é fruto de um diagnóstico elaborado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) e a Escola de Nutrição da UFBA, que apontou a predominância da insegurança alimentar em alguns públicos, como mães solos, mulheres negras, catadoras e catadores de materiais recicláveis, povos e comunidades tradicionais. A coordenadora da Rede Penssan e professora da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia, Sandra Chaves, celebra a regulamentação do programa que ajudou a construir.
“Muitos ex-alunos estão presentes também nessa tarefa. Temos muito orgulho enquanto Escola de Nutrição da UFBA e Rede Penssan de ter participado desse processo produzindo informações. A Bahia foi um dos primeiros estados a ter a iniciativa formalizada no sentido de implementar um programa local de combate à fome. E fez isso escutando o Consea, escutando a academia, conversando. Participamos da elaboração do 3° Plano de Segurança Alimentar, já havíamos participado da elaboração do 1° plano, então tudo isso mostra um esforço conjunto que a Bahia está, junto com o país, na luta contra a fome. Na Bahia, milhares de baianos saíram da situação de fome extrema e estão agora em situação de vulnerabilidade, porque uma coisa que é muito importante pra todos nós entendermos é a vigilância constante, é a ação constante, porque nós temos uma pobreza estrutural, nós temos problemas de desigualdade estruturais que não serão resolvidos sem perseverança. Então, é muito importante a continuidade da política com novas iniciativas, como as cozinhas comunitárias e a implementação do Sisan nos municípios, que está um sucesso, crescendo bastante no estado da Bahia”, celebrou a professora.
A regulamentação do Bahia Sem Fome é celebrada também por Mãe Naza de Oyá, que emocionou a plenária durante o ato. Ela está à frente do Projeto Social Maria Nilza, que atende por mês, há mais de 14 anos, em Vitória da Conquista, cerca de mil pessoas em situação de vulnerabilidade. O espaço funcionou como ponto de produção e distribuição do projeto Comida no Prato, do Bahia Sem Fome, no ano passado, distribuindo 600 refeições por semana, e agora está na disputa do novo edital das Unidades Gerenciadoras.
“Ainda bem que temos um governo que se preocupa com quem está na ponta”, destaca a Mãe Naza de Oyá. Mãe Naza conta que o Projeto Social Maria Nilza, que conta com cerca de 100 voluntários, oferece alimentação, atendimento médico e capacitação às pessoas da comunidade. “Dona Alesminía, dizemos que ela é a nossa criança mais jovem. Ela começou a aprender aos 81 anos e hoje, aos 85, é a única da família que sabe ler, escrever e utilizar o celular”.
A regulamentação do programa ocorreu durante a quarta edição do Seminário Estadual do Bahia Sem Fome. O evento, que teve início nesta terça (25) e vai até esta quinta (27), reunindo 118 representantes de prefeituras e 58 gestores de unidades gerenciadoras, ambas selecionadas em editais do programa neste ano. O encontro ainda recebe a presença de secretários e superintendentes dos governos federal, estadual e municipais, além das Voluntárias Sociais da Bahia e da equipe da Coordenação-Geral de Ações Estratégicas de Combate à Fome.
Foto: Divulgação