

A promulgação da Lei nº 14.759/2023, em 21 de dezembro de 2023, representou um marco decisivo no reconhecimento oficial da memória, da história e da luta da população negra no Brasil. Publicada no Diário Oficial da União na mesma data, a norma instituiu o dia 20 de novembro como feriado nacional, dedicado ao Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. De redação direta, a lei conferiu amplitude federal a uma data que, há décadas, simboliza resistência, afirmação identitária e reivindicação no campo das lutas antirracistas. Mais do que formalizar um feriado, a medida propõe à sociedade brasileira um convite à reflexão coletiva sobre o racismo estrutural e sobre o papel de cada cidadão na construção de um país mais igualitário e respeitoso.
“A institucionalização do feriado nacional tem origem em três grandes fundamentos que ajudam a compreender sua importância. O primeiro deles é a memória histórica e simbólica: O dia 20 de novembro remete à morte de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares e figura central da resistência negra no período colonial. Desde os anos 1970, movimentos sociais já adotavam a data como referência de consciência e afirmação negra, reconhecimento que, ao longo do tempo, se traduziu em legislações estaduais e municipais comemorativas até alcançar o status de feriado nacional. A oficialização reforça, assim, a valorização da história afro-brasileira e sua relevância na formação da sociedade”, declara a advogada do Azi e Torres Associados, especialista em Direito Civil e Direito do Trabalho, Patrícia Bispo.
O segundo fundamento envolve o eixo da reparação e da visibilidade: O feriado funciona como uma medida simbólica de reconhecimento do protagonismo histórico da população negra na formação política, cultural e econômica do país. Ao mesmo tempo, cria um ambiente institucional propício para ações educativas, políticas públicas antirracistas e iniciativas culturais de caráter contínuo. Essa conquista se soma a avanços como a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas e a adoção de políticas afirmativas no ensino superior e no serviço público.
“O terceiro fundamento diz respeito à unificação normativa: Antes da lei federal, a observância do 20 de novembro dependia exclusivamente de legislações locais, criando um cenário desigual e fragmentado. A nacionalização do feriado uniformiza o calendário civil brasileiro e fortalece iniciativas articuladas em nível nacional, além de dar respaldo às reivindicações históricas do movimento negro em estados e municípios”, acrescenta a especialista.
O panorama anterior à Lei nº 14.759/2023 demonstra a relevância dessa uniformização. Até sua promulgação, apenas seis estados haviam declarado o 20 de novembro como feriado: Alagoas, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo. No âmbito municipal, embora o Brasil possua 5.570 municípios, menos de 1.350 municípios haviam instituído a data como feriado, o que evidenciava a adoção limitada e desigual. Estados que já haviam avançado nessa pauta concentravam altas proporções de população preta e parda, segundo o Censo 2022, o que ajuda a explicar a sensibilidade legislativa nessas regiões. Contudo, casos emblemáticos evidenciavam contradições. Salvador, considerada a maior cidade negra fora do continente africano, com 83,2% da população autodeclarada preta ou parda, não pôde instituir o feriado, devido à limitação da Lei Federal nº 9.093/1995, que restringe o número de feriados municipais a quatro.
“A nacionalização atendeu, portanto, a motivações simbólicas, históricas e práticas construídas ao longo de décadas. Entre elas, destaca-se a necessidade de fortalecer a unidade pedagógica e simbólica em torno da data, garantindo que todo o país dedique o dia à reflexão sobre a história afro-brasileira, o legado dos quilombos e as persistências do racismo. Da mesma forma, o feriado nacional amplia a visibilidade de ações educativas, culturais e governamentais, facilita o planejamento de políticas públicas e reduz assimetrias antes existentes entre os municípios que celebravam ou não a data. A medida também atende a uma demanda histórica do movimento negro, que, desde a década de 1970, reivindica a consolidação do 20 de novembro como marco oficial de memória e luta”, complementa a advogada.
A visibilidade política ganha força, pois o 20 de novembro se transforma em um marco nacional para mobilizações, celebrações culturais, manifestações e denúncias das desigualdades raciais. Além disso, a unificação da data favorece a articulação de políticas públicas intersetoriais, possibilitando maior coordenação e eficácia das estratégias antirracistas.
Embora a instituição do feriado nacional não seja suficiente para eliminar as desigualdades estruturais que atingem a população negra, ela constitui um passo simbólico fundamental e um instrumento importante na consolidação de políticas concretas de igualdade racial. Trata-se de uma vitória institucional que amplia o espaço público para debates, ações e mobilizações voltadas ao enfrentamento do racismo.
“A Lei nº 14.759/2023 representa, assim, a consolidação de um processo construído ao longo de décadas pelo movimento negro brasileiro. Ao transformar o 20 de novembro em feriado nacional, a legislação retira a data das disputas fragmentadas nos calendários locais e a eleva à condição de marco nacional de memória, reflexão e reconhecimento. Em um país onde a população preta e parda constitui a maioria, segundo o Censo 2022, a nacionalização do Dia da Consciência Negra reforça a importância da luta por igualdade e justiça racial como pauta central para o futuro do Brasil”, finaliza Dra Patrícia Bispo.
SOBRE AZI & TORRES, CASTRO, HABIB, PINTO ADVOGADOS ASSOCIADOS
Localizado na Avenida Professor Magalhães Neto, Salvador, o escritório Azi & Torres, Castro, Habib, Pinto Advogados Associados conta com diversas áreas de atuação, tais quais: direito tributário, previdenciário, administrativo, trabalhista, empresarial, cível, digital, eleitoral, imobiliário, compliance, LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados, família e sucessões.
Foto: Caio Lírio



