Há cerca de dois anos, o escritório onde Lucimária Carvalho, 38, trabalhava perdeu, de forma repentina, um dos sócios. A situação gerou um conflito entre os herdeiros e os sócios, que deixou os funcionários em uma situação delicada, com o receio de encerramento das atividades e, consequentemente, a perda dos postos de trabalho. “Foi um período bem difícil porque ninguém queria sair, mas o estresse era muito grande”, relembra a funcionária.
Nessa época, o grupo de colegas passou a se reunir sempre às sextas-feiras para um happy hour no final do expediente, na tentativa de relaxar das tensões. O que começou informalmente, aos poucos, se transformou num compromisso aguardado e foi o que sustentou o grupo coeso até a resolução do imbróglio. “Posso assegurar que, se não fosse a rede de apoio que se formou, muitos de nós teria adoecido ou pedido para sair”, conta. Um levantamento do site Época Negócios mostrou que quem tem amizades próximas no trabalho é 43% mais comprometido e 27% mais satisfeito, além de se beneficiar de um sistema de apoio que melhora a saúde mental, a colaboração e a inovação.
De acordo com a coordenadora do curso de Psicologia da Unijorge Kátia Jane , as amizades e vínculos saudáveis dentro das empresas têm impacto direto na produtividade e no engajamento dos colaboradores. “As amizades desenvolvidas nos ambientes de trabalho funcionam como um sistema de apoio natural, e favorecem o sentimento de conexão de pertencimento gerando motivação intrínseca”, ressalta.
Inovação e resultados
A psicóloga vai além e afirma que as relações de amizade no trabalho reduzem o estresse, favorecem a colaboração e ampliam a criatividade. “Equipes que confiam umas nas outras tendem a assumir riscos de forma mais saudável, o que gera inovação e impacto direto nos resultados da organização”, complementa.
Um estudo da Harvard Business Review indica que colaboradores que trabalham em ambientes emocionalmente positivos são até 31% mais produtivos, têm 37% mais vendas e são três vezes mais criativos. Para Izabela Holanda, diretora da IH Consultoria e Desenvolvimento Humano, esse é um sinal claro de que investir em um clima emocional saudável é uma das estratégias mais eficazes para melhorar o desempenho organizacional, especialmente em cenários de alta pressão e competitividade.
Um estudo de 2020 da Deloitte indicou que o senso de pertencimento é um dos maiores impulsionadores do bem-estar no trabalho. “Ter amigos no ambiente de trabalho ajudam a reduzir o sentimento de isolamento aumentando o bem-estar e contribuem para a saúde mental. Para muitos profissionais, a qualidade das relações no trabalho é tão importante quanto o salário ou os benefícios na definição da satisfação geral com a carreira. Trabalhar em um ambiente socialmente acolhedor fortalece a energia psíquica do indivíduo”, explica a professora. Kátia reforça que o senso de pertencimento é, justamente, o que mais se fragiliza quando os vínculos presenciais diminuem.
“Pertencimento nasce quando o indivíduo sente que sua singularidade é reconhecida e valorizada”. Na opinião da psicóloga, as organizações podem se beneficiar muito desses laços e,para tanto, podem fortalecer as amizades investindo em culturas inclusivas, definindo valores e propósito organizacional de forma que cada colaborador se sinta parte de algo maior.
“Investindo em lideranças capacitadas para reconhecer pessoas, que sejam mediadores do laço social na medida em que sejam capazes de praticar escuta, proximidade e cuidado. É preciso investir, manter a transparência, participação em decisões e reconhecimento coletivo”, defende a professora. Para ela, a oferta do reconhecimento contínuo, celebrando as conquistas coletivas e individuais, além dos pequenos gestos de valorização fazem muita diferença no trabalho remoto, por exemplo.
Pós-pandemia
Kátia Jane diz que os espaços laborais no pós-pandemia trouxeram um desafio para as organizações, que precisaram pensar para além da lógica puramente operacional. “À medida que o distanciamento físico reduziu a intensidade dos laços cotidianos, a exemplo do momento do cafezinho, conversas nos corredores, almoço com colegas, e gerou um certo empobrecimento dos vínculos espontâneos, passou a ser necessário reconstruir o sentimento de pertencimento e cooperação”, afirma.
Kátia Jane defende que a criação de espaços de convivência, projetos interdisciplinares e programas que valorizem a escuta e o encontro humano são ferramentas importantes nesses novos momentos. “É importante pensar em momentos de integração — formais e informais — que possam favorecer a criação e o fortalecimento de laços de confiança que vão além das atividades técnico-administrativas e do cumprimento de tarefas”, diz.
“O cuidado com as pessoas precisa ser parte da cultura. Empresas emocionalmente inteligentes são aquelas que entendem que resultados sustentáveis nascem de relações saudáveis, e de ambientes que respeitam o foco e o bem-estar dos seus times”, finaliza Izabela Holanda.
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