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WALDECK ORNÉLAS – O NORDESTE PÓS-REFORMA TRIBUTÁRIA

Redação - 31/03/2025 05:00

Aprovada a Emenda Constitucional da Reforma Tributária, chegou a hora da verdade. Matéria da Folha de São Paulo (14/3/25) explora o tema, assinalando que o desaparecimento dos incentivos fiscais estaduais pode estimular o retorno de empresas aos estados ricos. Ôpa, então quer dizer que a guerra fiscal fazia bem ao Nordeste?

Nesse contexto, o secretário da Fazenda do estado de São Paulo já estaria sendo procurado por empresas  interessadas em voltar. Entre os setores especulados estariam o automobilístico e os centros de distribuição atacadista. Melhor infraestrutura, proximidade do mercado consumidor, mão de obra qualificada e elos da cadeia produtiva seriam os fatores considerados. Os incentivos fiscais estaduais serão extintos progressivamente, entre 2029 e 2033, logo ali na esquina.

O secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para a reforma admite o efeito, mas minimiza o impacto. Na prática o incentivo federal de redução de 75% no Imposto de Renda para as pessoas jurídicas, que permanece, não parece suficiente como atrativo compensatório. É preciso, ao Nordeste, valer-se de suas condições efetivas de competitividade.

É verdade que, embora seja a segunda mais populosa região do país (26,9%), sua população não tem capacidade de consumo. A renda é exatamente a questão a ser enfrentada. Ainda que esteja, neste momento, crescendo acima da média nacional, o Nordeste nunca ultrapassou a participação de míseros 13% no PIB nacional, mesmo no auge da Sudene.

E o Nordeste, o que tem feito para se preparar para esta nova fase da economia nacional pós-reforma? A região apresenta um leque de importantes alternativas – já reveladas – para enfrentar com sucesso esta nova realidade. Mas é preciso que políticas públicas nacionais sejam adequadas para que possam se concretizar.

No setor de Óleo e Gás, onde é indispensável a atuação da Petrobras, urge antecipar o projeto Sergipe Águas Profundas (SEAP), na bacia de Sergipe-Alagoas, e a exploração da Margem Equatorial, que beneficiará o Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte, desde que o Ibama deixe de trabalhar contra o governo – como diz o próprio presidente Lula – e contra o país, acrescento.

O Nordeste tem contribuído de forma significativa com a economia nacional e para a transição energética, pela produção em larga escala de energias limpas – eólica e solar – um movimento que parece não estar sendo bem-visto pelo Ministério das Minas e Energia, a Aneel e o ONS, que criam obstáculos a sua expansão.

Por via de consequência, o problema se reflete na implantação de unidades para produção de hidrogênio verde – outra das opções regionais – considerado o combustível do futuro. O ONS nega os pedidos de acesso, por exemplo, em Pecém.

O Nordeste oferece também a opção dos biocombustíveis, essenciais para consolidar o Brasil como país de economia limpa. É o caso do agave, em projeto que envolve a Shell, Unicamp, Cimatec e Ufrb, assim como da macaúba, em projeto da Acelen. A vantagem adicional é que são plantas do Semiárido, a zona da seca, que ganhará vitalidade econômica. Também o milho, com os projetos da Impacto Bioenergia, integra o cardápio.

A celulose constitui outra alternativa regional efetiva, já presente na Bahia e no Maranhão. O Piauí continua na fila. Os investimentos florestais constituem uma extraordinária oportunidade que, no entanto, têm encontrado limitações nas invasões de terras e na insegurança jurídica. Por sua vez, a descoberta de novas ocorrências minerais tem elevado o peso e a importância da região nesse setor de atividade econômica.

O Matopiba não só constitui a última fronteira agrícola do país como apresenta sucessivos recordes de produtividade de grãos e algodão, além de incluir pecuária.

Os investimentos em infraestrutura constituem questão essencial e formam um capítulo à parte. Desafios como a conclusão da Transnordestina, a implantação da FIOL e sua conexão com a FICO, a reabilitação da ferrovia Minas-Bahia e demais trechos nordestinos da FCA  constituem peças estratégicas para a formação de corredores logísticos e suas conexões portuárias.

Mais do que se defender contra os efeitos da reforma tributária, o Nordeste precisa de uma ação proativa, construindo uma nova política para o desenvolvimento regional. Primeiro por parte do próprio governo federal: o que faz, a este respeito, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, diretamente ou através da insepulta Sudene de Celso Furtado? Mas, principalmente, por parte da própria elite política nordestina. Afinal, para que serve o Consórcio de Governadores do Nordeste além de comprar respiradores medicinais em loja de canabis? E as bancadas federais, de deputados e senadores, quando vão entender que as questões do desenvolvimento envolvem mais do que emendas pix e que não estão lá apenas para serem meros “vereadores federais”?

Numa demonstração de como até as relações pessoais são importantes, o prefeito do Rio de Janeiro anunciou, em aula inaugural na COPPE/UFRJ, que está usando sua condição de ex-vice-presidente da BYD para a América Latina, para levar para o Rio o Centro de P&D que a empresa se comprometeu a implantar na Bahia. E veja-se que, pela capacidade local, embora tenha encerrado suas atividades industriais, a Ford deixou aqui o seu Centro de Desenvolvimento de Produto, hoje sediado no Senai Cimatec Park, na mesma Camaçari.

Enquanto as daqui dormem em berço esplêndido, as lideranças políticas do Espírito Santo, omitindo sua condição de estado do rico Sudeste, mobilizam-se para incluí-lo… na região Nordeste. Buscam compartilhar os recursos do Fundo Constitucional do Nordeste – a que pelo menos metade daquele estado já tem acesso –, da redução do imposto de renda e do paupérrimo Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, que será criado. Se aqui não sabemos o que queremos e precisamos, outros o sabem e lutam para conquistar, até mesmo sem legitimidade para tal.

Desperta Nordeste!

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.

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