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WALDECK ORNÉLAS – O ISOLAMENTO LOGÍSTICO E AS RODOVIAS NA BAHIA

Redação - 10/06/2024 05:03

A discussão sobre o isolamento logístico da Bahia tem se concentrado na questão ferroviária, pela conjunção de dois desafios que se entrecruzam: o primeiro é a perspectiva de implantação da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL) e de seu engate com a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (FICO), formando um importante Corredor Centro-Leste. O outro é a crise decorrente do abandono da malha tradicional pela Ferrovia Centro Atlântica (FCA), que agora quer devolvê-la aos frangalhos. São duas questões ainda em aberto.

Também os portos têm chamado a atenção, por conta da falta de linhas regulares para longo curso e cabotagem, embora haja investimentos que aumentam a capacidade e modernizam as operações de vários deles, dentre as onze instalações que formam o Complexo Portuário da BTS; e, em Ilhéus, a expectativa pela dragagem do porto da Codeba e pela construção do Porto Sul. Trata-se de setor em que os atores têm se movimentado e que detém potencial para romper a inércia econômica que a Bahia vem enfrentando.

A integração ferrovias-portos, essencial e indispensável para um bom desempenho logístico, continua como uma grande meta a ser alcançada. Nessa situação, ainda que de forma inadequada, a alternativa rodoviária supriria a necessidade. Mas não é o que ocorre.

A crise logística que envolve a Bahia não se limita ao binômio ferrovias e portos. Como se não bastasse – e apesar de ser o modal dominante no país – as rodovias também deixaram aqui de apresentar as condições necessárias para que a economia rode. Como se diz no popular, “além de queda, coice”.

Embora possua uma extensa rede rodoviária – tanto federal, quanto estadual – a Bahia não tem avançado em sua modernização e, mais grave ainda, tem comprometida sua manutenção.

Duas importantes rodovias federais atravessam longitudinalmente o Estado, fazendo a ligação do Sul-Sudeste com o Nordeste-Norte do país – as BR-116 e BR-101 – que se encontram na cidade de Feira de Santana, o maior e mais importante entroncamento rodoviário e polo logístico do Nordeste brasileiro.

Assim como a Ferrovia Norte-Sul é a espinha dorsal do novo sistema ferroviário nacional, a BR-116 o é em relação ao sistema rodoviário, estendendo-se do Rio Grande do Sul ao Ceará. Ocorre que, justo no trecho baiano, a BR-116 teve a má sorte de entrar em um lote de concessões rodoviárias cujo critério de julgamento foi a menor tarifa, desdenhando das necessidades de investimentos e menosprezando a própria expansão vegetativa da economia nacional. O resultado não poderia ser bom. Fato é que o vencedor da licitação até já transferiu a concessão a terceiros e, até hoje, não foi encontrado o caminho, agora em mãos do Tribunal de Contas da União, para redefinir o modelo do contrato, visando destravar os investimentos.

Estendendo-se da Divisa MG-BA até Feira de Santana, esta concessão inclui a BR-324, no trecho Salvador-Feira de Santana – praticamente o único acesso à capital baiana –, cujas condições de manutenção e operação estão gravemente comprometidas ante o pesado volume de tráfego que apresenta, o que em nenhuma hipótese se justifica. Trata-se da única concessão rodoviária federal na Bahia, prejudicando a imagem do modelo.

Mesmo em Salvador, quase ninguém sabe que a concessão inclui a antiga Estrada do DER-BA, ligando Águas Claras à Base Naval de Aratu, em pleno tecido urbano da Capital.

A BR-116 é o principal corredor rodoviário de cargas do país, com elevado carregamento, requerendo duplicação em vários trechos, faixas adicionais em outros, e adequada conservação. Já duplicada em vários estados, tem na Bahia a sua mais precária situação.

Paralela à BR-116 está a BR-101, inicialmente vista como litorânea e turística, hoje também uma rodovia de cargas. Duplicada em praticamente todo o Nordeste, somente agora a duplicação chegou à Bahia, no trecho da divisa SE-BA a Feira de Santana. Considerada uma rodovia perigosa, pelo seu traçado sinuoso, continua a requerer tratamento adequado no trecho de maior tráfego, entre a divisa ES-BA e Feira de Santana. De sua duplicação, contudo, nem se fala.

Pela importância estratégica e econômica para o escoamento das safras do Oeste baiano, a BR-242 – que atravessa a Bahia no sentido Oeste-Leste – exige atenção especial, sendo a ligação mais direta entre a importante área de produção do Matopiba e a Baía de Todos os Santos, além de servir à Chapada Diamantina.

Aqui, fala-se apenas na duplicação do trecho entre Luiz Eduardo Magalhães e Barreiras, no interior do próprio polo de produção, desprezando-se o longo caminho que os grãos percorrem para chegar ao litoral.

De trechos novos, somente tem avançado o segmento da BR-235, na margem esquerda do Lago de Sobradinho, em direção ao Piauí. A BR-135, no trecho entre Correntina e São Desidério, também no Oeste baiano, encontra-se paralisada há mais de uma década!

Novos arranjos logísticos de base rodoviária precisam ser estruturados em território baiano. O sistema rodoviário estadual é radioconcêntrico, com foco na capital do Estado. As dimensões territoriais e o atual estágio de desenvolvimento impõem a superação desse modelo, mediante a criação de novas estruturas regionais de articulação.

Como prioridade essencial, a duplicação Ilhéus-Itabuna precisa tornar-se Ilhéus-Vitória da Conquista, valorizando esse importante corredor de interiorização do desenvolvimento, para possibilitar a expansão desses dois importantes polos interioranos.

A articulação entre o segundo e terceiro maiores aglomerados urbanos do interior baiano criará condições indispensáveis para potencializar um novo eixo de desenvolvimento, desconcentrando a economia baiana e expandindo as oportunidades de trabalho e renda para a população. Também estarão beneficiadas, Ibicaraí, Itapetinga e Itambé, entre outras cidades ao longo do percurso. Dotado de fibra ótica e gasoduto, este eixo constituirá uma alavanca de relevante importância estratégica para o Sul da Bahia.

Na própria região metropolitana da capital baiana, a estruturação de um novo acesso, com a requalificação do Corredor Alagoinhas-Salvador, não apenas contribui para descongestionar a BR-324 mas, sobretudo, possibilitará ampliar o espaço urbano-industrial, fortalecerá a centralidade regional de Alagoinhas e abrirá novas perspectivas de desenvolvimento para o subsistema urbano Catu-Pojuca-Mata de São João-Dias d’Ávila, alcançando o Polo Petroquímico e possibilitando o espraiamento de seus efeitos econômicos.

As concessões estaduais, que fazem de São Paulo referência em infraestrutura rodoviária, aqui estão limitadas ao interior da região metropolitana de Salvador e, apenas para fins de manutenção, à Estrada do Feijão, que liga Feira de Santana a Irecê, Xique-Xique e Barra.

Estão faltando condições mínimas para que a Bahia possa participar do acelerado processo de transformação econômica que o mundo vem experimentando, ficando para trás também em relação ao resto do país, onde vários estados caminham em passo acelerado rumo a novos patamares de desenvolvimento.

Como se vê, também em relação ao modal rodoviário, a Bahia parou no tempo.

Waldeck Ornélas, especialista em planejamento urbano-regional, é autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.

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