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WALDECK ORNÉLAS – A INTEGRAÇÃO HIDRO-FERROVIÁRIA DO SÃO FRANCISCO

Redação - 08/01/2024 06:33 - Atualizado 08/01/2024

Anunciada, para este mês de janeiro, a criação da Secretaria Nacional de Hidrovias, no Ministério dos Portos e Aeroportos, constitui iniciativa digna de louvor, por dar visibilidade a um modal que, ao longo do tempo, vem sendo negligenciado em nosso país, apesar das necessidades infraestruturais e da prodigalidade da natureza. Sem prejuízo da prioridade atribuída às hidrovias Brasil-Uruguai, Tocantins e Amazonas, cabe enfatizar a necessária reativação da Hidrovia do Rio São Francisco como infraestrutura viária indispensável ao desenvolvimento do Nordeste brasileiro.

Mais importante e praticamente exclusivo, o rio da unidade nacional se constituiu, no passado, em eficaz meio de transporte para passageiros e cargas, quando os barcos de proa com suas carrancas, além dos vapores à la Mississipi, singravam as águas do Velho Chico, de Juazeiro (BA) a Pirapora (MG). Também o comércio ao longo do rio era feito por barcas, registrando um dinamismo que perdurou até os anos 1970, quando passou a predominar o rodoviarismo.

A hidrovia precisa ressurgir para dar suporte, agora, à pujante economia que se desenvolve às suas margens, sem desdenhar a navegação dos rios Grande e Corrente, seus principais afluentes da margem esquerda, dando acesso ao celeiro de grãos em que se transformou o Oeste baiano, gênese do Matopiba.

Tanto mais que se trata de uma hidrovia de baixo custo de implantação e manutenção. De Juazeiro (BA) – onde um bom porto fluvial permanece inativo – e Petrolina (PE) até a eclusa de Sobradinho, a remoção dos poucos e pequenos pedrais existentes chegou a ser objeto de licenciamento ambiental e ter os recursos liberados, via Codeba, mas se perderam na burocracia. O trecho do lago de Sobradinho apresenta navegação livre, carecendo basicamente de sinalização.

A partir do remanso de Sobradinho, à altura de Xique-Xique – onde se localiza o megaprojeto de irrigação do Baixio de Irecê – pode-se desenvolvê-la em três etapas. A primeira, até Ibotirama, onde se integra com a BR-242, eixo de ligação Salvador-Barreiras e Luís Eduardo Magalhães, chegando até Brasília. A segunda, até Bom Jesus da Lapa, onde se articula com a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), trecho II, em fase de implantação. A terceira, até Pirapora, onde se conecta como todo o sistema rodo e ferroviário que serve ao Sudeste do país.

A integração intermodal da hidrovia encontra, na ligação ferroviária de Juazeiro/Petrolina com o Porto de Aratu, na Baía de Todos os Santos, o destino natural das cargas desse baricentro, na visão do renomado engenheiro Vasco Neto. A ferrovia tem sua viabilidade assegurada com a exploração das minas de ferro de Sento Sé, em fase inicial de produção, a somar-se a um volume de cerca de 18 mil contêineres/ano de frutas, cujo valor chega a US$1 bilhão. Sem contar que o eixo ferroviário pode ter o seu atual percurso modificado para servir também a Feira de Santana, e, assim, reduzindo a distância, integrar e fortalecer o mais importante centro logístico do interior do Nordeste.

Ao dar origem a um importante complexo logístico intermodal rodo-hidro-ferroviário, a integração viária do São Francisco, que já conta com expressivo volume de cargas, terá o seu potencial ampliado exponencialmente, ao possibilitar a racionalização dos fluxos e promover significativa redução de custos.

Destaque-se, como reflexos positivos, o fortalecimento da centralidade exercida pelo aglomerado urbano Juazeiro-Petrolina, polo de desenvolvimento do submédio São Francisco, grande centro produtor, distribuidor e exportador de frutas, a partir da agricultura irrigada, a que se somará o processamento de oleaginosas, para abastecimento do mercado regional, hoje atendido basicamente por importações via marítima. Acresça-se o desenvolvimento dos serviços e atividades comerciais e turísticas.

Ao longo do curso do rio desenvolvem-se, espontaneamente, a agroindústria, em sua margem esquerda, e a geração elástica de energias renováveis – eólica e solar – na margem direita, criando um amplo leque de novas oportunidades a serem promovidas, o que possibilita a formação, em Bom Jesus da Lapa, de uma centralidade urbana de nível regional, como capital do médio São Francisco.

A Hidrovia do São Francisco é o elo integrador desse processo virtuoso que só está esperando pela infraestrutura para se robustecer.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.

 

 

 

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