As recentes derrotas do governo no congresso nacional fez o PT iniciar um estudo sobre um diálogo maior com o centrão atrás de mais espaço no congresso nacional. Petistas reconhecem que, em prol da governabilidade, a sigla precisará “cortar na própria carne”, mas atuam para blindar pastas consideradas estratégicas, como Saúde e Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família –principal vitrine social de Lula.
O centrão, grupo liderado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), apresentou uma fatura de dois ministérios e o comando de estatais para o presidente viabilizar a aprovação de projetos estruturais na Câmara e consolidar votos de partidos como PP e Republicanos. Apesar do desgaste do ministro Wellington Dias (Desenvolvimento Social), o PT defende que a legenda continue à frente da pasta.
Há um racha entre aliados de Lula sobre o futuro do ministério. Articuladores políticos do governo, que integram o PT, argumentam que o presidente deveria abrir a pasta do Bolsa Família para o centrão com o objetivo de amarrar de vez o apoio de partidos de peso na Câmara.
No entanto, outra ala do partido vê um risco muito elevado se Lula deixar o Bolsa Família sob comando do centrão, principalmente diante da proximidade das eleições municipais. O PT pretende ampliar o número de prefeituras para ter capilaridade política já de olho na corrida presidencial de 2026. O rearranjo ministerial envolve outras pastas comandadas por petistas e por aliados de menor porte.
Uma das hipóteses seria transferir a titular da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos (PC do B), para o Ministério das Mulheres. Há quem defenda a redução do espaço destinado ao PSB, hoje à frente de três ministérios, incluindo Indústria e Comércio, do vice Geraldo Alckmin. A presidente da Caixa, Rita Serrano, está na mira do centrão e tem recebido críticas dentro do governo por seu desempenho à frente do órgão. Na quinta (13), porém, um evento de lançamento do Minha Casa, Minha Vida serviu como ato de desagravo a ela. Ao longo da cerimônia, funcionários da Caixa gritavam “Fica, Rita”.
Além disso, movimentos sociais, entre eles o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), enviaram uma carta a Lula na qual pedem a permanência de Rita. “As organizações que assinam esta carta lutaram incansavelmente pela sua liberdade, pela retomada da democracia e do governo popular. (…) Desta forma, não podemos aceitar de maneira alguma que aqueles que estavam entre os que nos criminalizam, construíram o golpe contra a presidenta Dilma e alimentaram a perseguição às organizações do povo e ao Senhor voltem a comandar uma instituição como a Caixa, fundamental para o Povo Brasileiro”, afirma o texto.
Apesar disso, Lula está emparedado pela impossibilidade de tirar cargos que hoje estão com PSD, MDB e União Brasil. “Tem ministérios que são muito a cara da gente: saúde, educação e social. Ele tem interesse em trazer o PP e Republicanos. Aí, provavelmente, em agosto vai começar a negociar. Vai ter de espremer daqui, catar dali e achar um espaço. Mas não acho que para essa coisa específica seja o MDS [Ministério do Desenvolvimento Social]. É minha opinião”, diz o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
“Evidentemente que, para nós, temos alguns ministérios que nos são muito caros. Saúde, Desenvolvimento Social, é a cara do PT. O governo tem tanto espaço que pode contemplá-los sem mexer nessas coisas que são bandeiras históricas do PT, isso ajuda muito a gente. Mas por parte do PT não vai ter rebelião nenhuma não, nós somos governistas até demais, eu acho”, disse Jilmar Tatto, deputado federal e secretário nacional de Comunicação do partido.
Apesar da tendência pela manutenção do MDS sob o comando do PT, não há certeza sobre a permanência de Wellington Dias no cargo, em decorrência de uma decepção de aliados do presidente com o desempenho do ministro. Enquanto integrantes da cúpula petista admitem a chance de troca no MDS, o secretário-geral do PT, Henrique Fontana, se manifesta contra. “Estou seguro de que o ministério não vai trocar de mãos. O Wellington é um excelente gestor e um líder fundamental do PT e do time do Lula, está fazendo um trabalho excelente no MDS”, diz.
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), diz que qualquer mudança no governo não é debate de agora. “Todos os partidos que quiserem fazer parte da maior tarefa de nossas vidas, que é reconstruir o nosso país depois do fascismo, serão bem-vindos, PP e Republicanos, todos eles.”
Nos primeiros seis meses, Lula conseguiu aprovar na Câmara o novo arcabouço fiscal, a MP (medida provisória) que trata da estrutura da Esplanada dos Ministérios, a reforma tributária e o projeto de lei do Carf (a última instância administrativa de litígios tributários), essencial para o plano de equilíbrio das contas públicas de Fernando Haddad (Fazenda).
O Palácio do Planalto, porém, contou com a fundamental influência de Lira no plenário para conseguir avançar nessas pautas. Em outras, como a derrubada dos decretos do saneamento, Lula sofreu uma derrota.”É bom [atrair PP e Republicanos para a base governista], facilita o governo, dá menos estresse, aprova mais fácil, embora haja coisas que continuarão com dificuldade. Mas é preciso fazer um rearranjo. É aquilo que ele [Lula] falou, somos minoria. Não temos nem 150 [como Lula citou], temos 130 deputados [de esquerda]”, disse Carlos Zarattini (PT-SP).
Caso consiga amarrar a maior parte dos parlamentares dos grandes partidos de centro e de direita –PSD, MDB, União Brasil, PP e Republicanos–, Lula ficaria com uma base que poderia chegar a 400 dos 513 parlamentares, o que isolaria a oposição ao bolsonarismo, hoje abrigado no PL. Em fevereiro, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse em entrevista à Folha de S.Paulo que o partido já tinha cedido espaço demais no primeiro escalão do governo. “Não vejo como o PT ceder mais espaço no governo para contemplar outras forças”, declarou à época.
A avaliação de integrantes da cúpula do partido, agora, é que Lula precisa garantir maioria na Câmara para ter mais tranquilidade no resto do governo. A ideia é repetir o cenário do segundo mandato de Lula (2007-2010), quando o petista abriu as portas do governo para partidos de centro, distribuiu ministérios e, com isso, obteve apoio parlamentar para aprovar medidas no Congresso mesmo após o escândalo do mensalão.
Foto: O presidente Lula ao lado de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, no dia da posseLeopoldo Silva/Agência Senado