É vinte e quatro de junho, dia de São João. Mas o que pode este cronista dizer sobre uma festa tão linda? Dizer que ama o São João, que já pulou fogueira, comeu milho assado, soltou bomba, tomou quentão e saiu de braço dado com a menina mais linda da cidade dançando quadrilha? Ora, mas quem no São João não fez igual? Meu lado intelectual se manifesta e diz que o melhor é contar a origem da festa. Assim, o leitor pode ficar sabendo que no dia 24 de junho acontece no hemisfério norte o solstício de verão, o momento em que o sol sobe mais alto no céu, para depois fazer o caminho de volta até atingir em 25 de dezembro, o solstício de inverno. E, lá no hemisfério norte, a noite do dia 25 de dezembro será a mais longa do ano e a de 24 de junho será a mais curta. Nesse dia, para celebrar o evento, os povos antigos, adeptos do paganismo, faziam festas e rituais e acendiam fogueiras para espantar os maus espíritos e chamar a atenção dos deuses para seus pedidos. Por fim, o leitor vai saber que tão forte estava arraigado no povo a tradição dessas datas que o cristianismo baixou o véu cristão sobre elas e então no solstício de inverno passou a ser comemorado o Natal, o nascimento de Cristo, e no solstício de verão o nascimento de João Batista.
“Mas que coisa mais chata essa mania de querer explicar a origem de tudo, coisa de menino amarelo que passa o dia lendo”, diz, irritado, meu lado festivo, para então perguntar: “ Você acha que o leitor, que deve estar bebendo um licor de jenipapo, comendo canjica e dançando forró, vai querer saber dessa chatice?”
Repondo que ele tem razão, que não vou cair nessa velha ladainha de origem do São João e que vou é falar de Carlos Drummond de Andrade e de como ele pôs as cidades da Bahia na sua poesia. “Mas que diabo tem Drummond a ver com São João?”, pergunta ele, mais irritado ainda, e já vestido com camisa listrada e chapéu de palha desfiado.
Digo a ele que Drummond, fez uma homenagem a beleza e a sonoridade dos nomes das cidades baianas – Boninal, Gentio do Ouro, Palmas do Monte Alto, Quijingue, Xiquexique, Andorinha – que, ora doces, ora enérgicos, ordenavam que ele viesse à Bahia. “ Mas o que é que isso tem a ver com o São João?” , grita novamente indignado meu lado festeiro, que a essa altura já está soltando fogos e dançando forró. Então meu lado circunspecto responde, já vestido à caráter:
“É que no São João, eu me sinto como Drummond, admirando os nomes das cidades da Bahia – Mucugê, Amargosa, Lençóis, Cruz das Almas, Cachoeira, Senhor do Bonfim, Jequié, Piritiba – que ora doces, ora enérgicos ordenam que eu vá até lá dançar o forró”. Pois é leitor, para gáudio do meu lado festeiro hoje, 24 de junho, eu estou em Lençóis comendo milho verde, bebendo licor e dançando forró.
Publicado no jornal A Tarde em 24/06/2022