Do choro nos braços da mãe à brincadeira com o companheiro de revezamento minutos antes do retorno, algumas cenas do último domingo podem explicar um pouco melhor os sentimentos de Paulo André Camilo no dia em que ele voltou a competir após um ano e meio afastado das provas oficiais de atletismo.
Mas é preciso retornar àqueles dias entre os Jogos Olímpicos de Tóquio e a entrada no BBB, no fim de 2021, para entender qual ciclo foi fechado no último dia 30 de maio de 2024, no Desafio realizado no Centro Paralímpico Brasileiro, onde PA passou de ex-BBB para, novamente, atleta olímpico. Retorno de Paulo André ao atletismo tem boa marca e lesão.
É possível separar o que aconteceu no retorno em duas partes:
O que Paulo André já conseguiu
1) PA tinha prometido à família que retornaria ao atletismo: voltou.
2) PA disse que investiria na estrutura para competir: conseguiu.
3) PA queria levar mais fãs ao atletismo: aconteceu.
O que falta conseguir
1) PA quer fazer final olímpica.
2) PA quer levar o pai como treinador para os Jogos Olímpicos.
3) PA quer quebrar o recorde sul-americano dos 100m que é de 10 segundos.
Paulo André, minutos depois de sentir dor no músculo posterior da coxa e perder a chance de vencer a final dos 100 metros, encontrou com a mãe, Mari, embaixo da arquibancada. Foi a primeira e única vez que ele chorou naquele domingo. Mas, segundo a mãe, não foi pelo risco de uma lesão –que não se confirmou– ou por ter perdido a prova. “Foi emoção”, diz. Ela lembrou a promessa que PA havia feito à família na reunião na qual concordaram que ele entraria no BBB: voltar ao atletismo.
Para os Camilos, o programa de TV –e tudo que viesse a seguir– seria apenas um desvio de rota no caminho que o atleta de 24 anos tinha traçado para a própria vida. Hoje, Paulo André repete uma frase que um dos irmãos lhe disse: “Daqui a 12 anos ,você pode curtir tudo o que quiser, mas só agora pode ser atleta”. E, assim, ele projeta a carreira nas pistas por mais dois ou três ciclos olímpicos.
Quem também estava ali embaixo da arquibancada naquele pós-prova era o time do PA. Hoje composta por seis profissionais, a equipe que tinha somente o pai e técnico Carlos Camilo antes do BBB, agora cuida do velocista da maneira que ele imaginava. Para conseguir bancar os profissionais, PA passou de dois patrocinadores antes do reality para oito campanhas –e contando– depois que saiu da casa como vice-campeão em 2022. Nenhum atleta sequer do Desafio tinha time semelhante no evento.
Por fim, PA pode perceber no domingo que atingiu outra meta estabelecida neste último ano. Bastou ouvir seu nome anunciado na largada da semifinal, que foi possível perceber que a torcida era majoritariamente para ele. O mesmo atleta que antes do programa já dividiu torcedores entre fãs e haters em um Troféu Brasil no Centro Olímpico, que é chamado de marrento por uns e querido por outros, desta vez tinha alguma dezena de vozes gritando alto seu nome, munidos de celulares ávidos por uma selfie após a competição.
Contudo, tal qual o desempenho no domingo, ainda falta o final totalmente feliz dessa história. O tempo de 10s18 na semifinal foi o melhor de um início de temporada do PA e o coloca na segunda colocação do ranking nacional de 2023 (so atrás de Felipe Bardi, com 10s07), mas a meta ainda é baixar dos 10 segundos. Primeiro porque esse é o recorde sul-americano que não é quebrado há 30 anos. Segundo porque 10s00 é o índice olímpico rumo a Paris 2024.
PA e sua equipe colocaram como meta ser finalista olímpico nos 100m. Para isso, ele precisa baixar dos 10 segundos. E, para isso, precisa evoluir. O próximo passo será o Troféu Brasil de Atletismo, em julho, em Cuiabá (MT). Mesmo sem ter sofrido lesão no último domingo, o velocista vai se poupar para o principal evento do calendário nacional neste ano. Depois, tem Mundial, em agosto, em Budapeste. Lá na Hungria, o foco provavelmente estará no revezamento.
Paulo André não se cansa de repetir, nos bastidores, que o 4×100 é a realidade hoje. Com ele, o Brasil foi campeão mundial em 2019. Coincidentemente, no último domingo, PA correu ao lado de Derick de Souza na pista do CPB. Os dois, inclusive, brincaram que estavam passando o bastão um para o outro minutos antes da semifinal. Cena que fez PA soltar um sonoro “que saudade” na pista, seguido de um largo sorriso. É esse PA que os novos fãs e o velho Camilo quer ver. Quem sabe assim a meta final será cumprida: estar em Paris com o pai como técnico e a mãe o abraçando na arquibancada. Esse parece ser, nos melhores sonhos, o final do reality show que PA quer para sua vida real como atleta.
Foto: Wagner Carmo/PanamericanaPress
Fonte: GE