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ADARY OLIVEIRA – EXPLORANDO MELHOR O SEMIÁRIDO

Redação - 06/06/2022 09:53

O semiárido ocupa 2/3 do território da Bahia, exatamente no Estado de maior população rural do Brasil. Lí recentemente que um dos candidatos ao governo da Bahia pretende, caso seja eleito, criar uma Secretaria para o semiárido. A ideia é muito boa e tenho a convicção de que essa região de baixa produtividade na agricultura e na pecuária pode se tornar mais rica e proporcionar uma vida melhor ao bravo sertanejo que insiste em aí residir. Dentro do semiárido existem várias sub-regiões caracterizadas por climas diferentes, terrenos desiguais e vegetação nativa distintas, merecendo estudos e pesquisas para se chegar a um melhor aproveitamento. Cada um dos habitantes dos lugares dessa imensa região conta histórias que poderiam ser úteis no planejamento de estudos e pesquisas. Residi certo tempo na região chegando a administrar uma fazenda. Por isso tenho também histórias para contar, como as duas que uso para ilustrar este artigo.

Tentei certa feita identificar plantas nativas resistentes à seca que pudessem ser usadas na alimentação do gado. A primeira que pesquisei foi um arbusto que crescia em qualquer terreno, mesmo em cima de murundus (pequenos montes de solo que se formam como se fossem oriundos de formigueiros ou de erupção onde a terra teria fervido). Ele é conhecido como icó, nome provável de origem tapuia. Submeti amostras dela ao herbário do Instituto de Biologia da UFBA que as certificou como da Família Capparaceae, nome vulgar Icó e nome científico Capparis Jacobinae Moric. O icó é assim descrito no Dicionário do Aurélio: “É um arbusto definido como árvore da família das caparidáceas (epqparis yco), muito característica da catinga nordestina de folhas coriáceas, ovado elípticas, flores de três a cinco cm com longos estames e pétalas citrinas, e cujo fruto é uma baga de três a quatro cm de diâmetro, contendo polpa e muitas sementes, Icozeiro, icó preto”. A análise feita pelo laboratório de Nutrição Animal da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), entre outras anotações informou que as folhas têm um teor de 14,35% de proteína bruta e os frutos 16,40%. Decidi então comprar o icó retirado dos campos por algumas pessoas que costumavam prestar serviços na região e consegui adquirir cerca de duas toneladas do fruto, muito parecido na cor, forma e dimensões com uma manga espada. Enchi todos os cochos com os frutos antes do gado chegar no final da tarde. Para meu espanto em poucos minutos o gado devorou todos os frutos. Chegava, portanto, a uma primeira conclusão: o icó, com razoável teor de proteína bruta, palatável para os bovinos, resistente à seca, seria uma boa alternativa para alimento em qualquer época do ano. Encontrei, assim, um ótimo tema para desenvolvimento de uma pesquisa no campo da agropecuária. Talvez um estudo do icó sobre cultivo, colheita, fenação, silagem, alimentação do gado, existência de toxicidade nociva etc.

Numa outra ocasião dediquei-me a identificar plantas nativas que permaneciam com a folhagem verde mesmo nos tempos de seca. Preparei alguns fardos de feno com várias plantas, usando a denominação popular da região: são joão, jurubeba, velame e carrapicho, este também conhecido como unha de gato. Uma delas, o são joão, é um arbusto muito resistente, com folhas verdes de tonalidade escura e flores amarelas que cobrem toda a planta em determinados meses do ano. Coloquei nos cochos para alimento do gado o feno preparado com as folhas dessa planta, já bastante secas, e fiquei esperando a chegada dos animais para colher alguma informação. Quando o gado chegou, diferentemente do que tinha acontecido com o icó, não demonstrou nenhum interesse. Depois de algum tempo, voltei ao local e observei que os cochos estavam vazios, quando fui informado que o cavalo do vaqueiro passou pelo local e tinha se alimentado com elas.

Informações semelhantes podem encher folhas e mais folhas de papel. Juntando-as a outras mais recomendadas numa pesquisa científica, encontra-se subsídios para a formulação de uma política adequada de longo alcance.

Adary Oliveira é engenheiro químico e professor (Dr.) – [email protected]

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