O Brasil terá mais um ano perdido na economia em 2022. No cenário mais positivo traçado pelos analistas, a atividade econômica vai ficar estagnada neste ano. Mas o desempenho do país pode ser ainda pior: não há quem descarte uma leve recessão.
No relatório Focus, do Banco Central, as projeções de mais de uma centena de analistas deixam evidente como os números de 2022 estão cada vez piores. Os economistas chegaram a prever um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,5%, mas, agora, enxergam uma alta bem mais modesta, de apenas 0,42%.
E por que esse cenário se materializou?
Piora das expectativas
As expectativas econômicas para 2022 pioraram depois que o governo decidiu alterar a regra de teto dos gastos por meio da proposta de emenda à Constituição (PEC) dos precatórios como estratégia para abrir espaços para o pagamento Auxílio Brasil, programa social adotado pelo governo Jair Bolsonaro em substituição ao Bolsa Família.
Desde 2014, o Brasil não registra superávit primário, ou seja, não sobra dinheiro nas contas públicas, depois de pagar as despesas, para quitar os juros da dívida do governo. Com isso, o endividamento do Brasil se tornou elevado para uma economia emergente e passou a ser acompanhado de perto pelos investidores.
“O gatilho para as revisões (de crescimento em 2022) tem a ver com toda a flexibilização do arcabouço fiscal, com a PEC dos Precatórios e o drible na lei de responsabilidade fiscal”, afirma Alessandra Ribeiro, sócia e economista da consultoria Tendências. “A gente viu efeito disso na percepção de risco e no câmbio, batendo nas expectativas inflacionárias.”
A PEC dos precatórios altera a correção do teto de gastos. A fórmula inicial considerava o IPCA apurado entre julho de um ano e junho do ano seguinte. Com a mudança, a correção passa a levar em conta o IPCA acumulado entre janeiro e dezembro. A proposta também adia o pagamento de parte dos precatórios. Ao todo, o Ministério da Economia estima que terá um espaço de R$ 106 bilhões no próximo ano.
Inflação em dois dígitos; juros em alta
Além da desvalorização do real, a inflação brasileira foi afetada por choques que começaram com alimentos, combustível e energia elétrica, mas que acabaram se espalhando por toda a economia. Em 2021, a inflação surpreendeu sucessivas vezes. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve ter encerrado o ano em dois dígitos, o que não ocorria desde 2015 — a previsão dos analistas é de 10,02%.
Para 2022, os economistas já apostam em um avanço de 5,03%. Se essa projeção se confirmar, será mais um ano marcado pelo estouro do teto da meta do governo. A inflação em alta fez com o que o Banco Central precisasse endurecesse a sua política monetária. Em 2021, a taxa básica de juros iniciou o ano a 2%, mas subiu até 9,25% conforme a alta de preços se mostrou mais persistente. Para 2022, a expectativa é de novos aumentos. A Selic deve encerrar o ano em 11,50%.
“A política monetária vai ser bastante restritiva. E isso tem forte efeito na demanda doméstica, consumo e investimento são fortemente impactos”, diz o economista Lucas Vilela, economista do banco Credit Suisse. O banco projeta retração de 0,5% do PIB em 2022, IPCA de 6% e prevê que a taxa básica de juros deve chegar a 12,25% ao ano em maio. “A inflação também traz o seu componente negativo. O poder de compra das pessoas tanto empregadas como desempregadas vai ser impactado”, acrescenta Vilela.
Juros em alta encarecem o consumo das famílias e os investimentos das empresas, o que contribui para esfriar a economia e, dessa forma, no controle da inflação. “Conforme a taxa de juros sobe, a atividade também tende a sofrer”, diz Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital. “Não tem o que fazer. É um remédio amargo para controlar a inflação, mas necessário porque é um problema que afeta os mais pobres”, diz a economista. Ela projeta que a Selic chegará a 11,75%, e o PIB irá recuar 0,2% este ano.
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