A tendência de aumento de calotes neste ano está no radar dos quatro maiores bancos de capital aberto do país (Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander), que já projetam um possível aumento em seus respectivos índices de inadimplência ao longo dos próximos meses. A expectativa de falta de pagamentos é reflexo da redução do auxílio e de linhas de crédito emergenciais, bem como do fim do prazo para pagamento de parcelas prorrogadas de dívidas.
A projeção é que esse indicador só comece a estabilizar nos três últimos meses deste ano. “Ainda temos muita incerteza ao olhar para frente, mas a principal mensagem é que, na medida que o cenário se normalize, nós devemos consumir parte do que provisionamos no ano passado. Mas é importante dizer que temos um cenário com viés positivo para o futuro, apesar da pandemia”, disse na terça-feira (4) o presidente do Itaú Unibanco, Milton Maluhy Filho, na apresentação do balanço do primeiro trimestre do ano.
Provisões são reservas que os bancos fazem para cobrir eventuais calotes. Ao longo do ano passado, os quatro maiores bancos do país chegaram a provisionar, juntos, mais de R$ 93 bilhões para cobrir eventuais inadimplentes. “Todos os nossos modelos para calcular perda esperada foram redimensionados e agravados por conta do cenário de pandemia que estamos vivendo, e fizemos as provisões que entendemos necessárias ao longo de 2020 para suportar o momento de maior inadimplência que prevíamos”, afirmou na quarta (5) o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari, também na apresentação dos resultados.
No início da pandemia, os bancos prorrogaram o prazo de pagamento de dívidas de empresas e pessoas físicas. A ação, junto a medidas como o auxílio e o lançamento de créditos com garantia do Tesouro, melhorou a condição de pagamento de devedores, evitando até agora uma explosão de novos atrasos. A poupança que as famílias conseguiram fazer em 2020, em parte em função do auxílio emergencial, ajudou a manter os pagamentos em dia, bem como a atividade econômica no fim do ano passado e início de 2021.
O Itaú registrou 2,3% de inadimplência no primeiro trimestre -uma queda de 0,8 p.p. (ponto percentual) em relação aos primeiros três meses de 2020-, enquanto a do Bradesco ficou em 2,5%, recuo de 1,2 p.p. na mesma base de comparação. No Santander, o índice do Santander ficou em 2,1% (queda de 0,9 p.p.), e no Banco do Brasil em 1,95%, leve alta de 0,05 p.p. Apesar da leve alta, o índice do BB está bem abaixo do registrado antes da pandemia, que ficava em torno de 3%. De acordo com vice-presidente de controles internos e gestão de riscos do BB, Carlos Bonetti, o aumento se deu por estratégia de negócio da instituição.
“Mudamos o perfil de clientes em algumas linhas de crédito pessoal para pessoa física e aumentamos a relação de risco e retorno dessas modalidades, então esperávamos essa elevação da inadimplência, mas que ainda é muito modesta”, explicou o executivo nesta sexta-feira (7). Para Bonetti, a tendência é que os calotes aumentem ao longo do ano, mas se mantenham abaixo de 3%.
“Acreditamos que, na carteira total, o índice deve evoluir nos próximos meses, mas é difícil fazer uma previsão, dada a incerteza do momento. Mas deve ficar abaixo do que tínhamos antes da pandemia no cenário básico. Em cenários alternativos, isso pode mudar”, disse. A reversão dos indicadores econômicos reforça a incerteza. Em março, a produção industrial caiu 2,4% em relação a fevereiro, zerando os ganhos acumulados até então, informou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta quarta-feira (5).
O comércio também teve resultado ruim no último mês do trimestre, passando a operar em patamar inferior ao de antes da pandemia. Devido à evolução da pandemia, estados e municípios reforçaram medidas de isolamento social, limitando o funcionamento de lojas, o que impactou o resultado da atividade. O auxílio emergencial voltou, o que deve dar algum fôlego para famílias, mas como em valores inferiores aos praticados em 2020 e para um número menor de beneficiados, seu impacto sobre a atividade econômica será menor.
Na semana passada, o presidente do Santander, Sergio Rial, afirmou que não descarta uma possível deterioração do crédito para empresas em alguns segmentos ao longo deste ano. “Uma [deterioração] generalizada eu não vejo, mas será que é possível termos variações negativas de risco em alguns segmentos? Com certeza”, disse Rial, sem detalhar quais seriam esses setores.
Apesar do esperado aumento da inadimplência, os bancos não devem repetir para 2021 o forte provisionamento feito no ano passado. Mas sinalizam que parte dessas provisões sejam usadas para cobrir o possível aumento de calotes ao longo dos próximos meses -diminuindo (ou até zerando), assim, os impactos nos resultados bancários. No primeiro trimestre deste ano, o Itaú provisionou R$ 3,8 bilhões, queda de 57,3% em relação a igual período de 2020.
O Bradesco, por sua vez, reservou R$ 3,9 bilhões, queda de 41,8% e o Santander provisionou R$ 3,2 bilhões no período, recuo de 7,7%. O Banco do Brasil provisionou R$ 2,5 bilhões no período, redução de 54,2% em relação ao primeiro trimestre de 2020. Em relatório, o BB informou que, por cautela, antecipou R$ 8,1 bilhões em provisões ao longo do ano passado para fazer frente à crise gerada pela pandemia. “Os volumes construídos em 2020 demonstram-se suficientes para a cobertura do aumento do risco de crédito da carteira até o momento”, informou.
Na prática, as provisões têm o papel de uma reserva de emergência. De acordo com as regras do Banco Central, os bancos já são obrigados a separar uma parcela de suas receitas para cobrir eventuais calotes de seus clientes, mas em cenários de risco elevado de crédito, provisões adicionais costumam ser feitas. A quantia separada para essa “reserva emergencial” precisa ser suficiente para que, caso haja uma inadimplência em grandes proporções -como era previsto para essa pandemia- a instituição consiga arcar com os prejuízos sozinha sem que essas perdas abalem suas estruturas financeiras ou impactem seus clientes. Os bancos afirmam que não há risco para o balanço bancário em relação aos aumentos previstos na inadimplência.
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