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ADARY OLIVEIRA – A PARALISAÇÃO DA FORD

Redação - 26/04/2021 08:45

O Complexo Industrial Ford Nordeste, também chamado Projeto Amazon, foi inaugurado em outubro de 2001 e este ano estaria chegando aos 20 anos de funcionamento. A Ford instalou-se em Camaçari acompanhada de seus 28 fornecedores sistemistas anunciando o emprego de tecnologia de última geração, alto nível de automação, garantias de elevado padrão de eficiência e qualidade das operações. Além disso, a unidade industrial incorporava modelo de produção inovador de montagem modular sequenciada, próprio da Ford. A participação de fornecedores diretamente na linha de montagem e no processo de produção, zerando os estoques de matérias primas, produtos intermediários e produtos acabados, constituía-se no seu principal diferencial. O sistema de administração da produção “just in time”, que determina que nada deve ser produzido, transportado ou comprado antes da hora certa, chegava à Bahia desafiando aos que diziam que a implantação da indústria automobilística seria inviável no Nordeste. O projeto tinha tudo para dar certo e todos aplaudiam o esforço conjunto do governo e iniciativa privada na viabilização do empreendimento.

Não se sabe exatamente o que foi determinante na decisão da multinacional de paralisar a produção de tão prestigiosa fábrica. Fala-se de queda de demanda como consequência da pandemia do Covid 19; supõe-se que foi devido ao estreitamento do mercado dos carros equipados com motores de combustão interna, com o avanço dos veículos de engenhos elétricos; ou ainda, o que é menos provável, para redução das emissões de gás carbônico na atmosfera; e a possível combinação de todos esses fatores. O fato é que a Ford não está no mundo para perder dinheiro e, sem pestanejar, ordenou o fechamento da unidade que poderia ser a de menor rentabilidade ou que menos contribuísse para com seus resultados atuais e projetados.

Qualquer que seja o motivo, o que não podemos é ficar chorando sobre o leite derramado, mas sim arregaçar as mangas e partir para a recuperação do prejuízo. Está na hora de usarmos nossas inteligências e nos unirmos para encontrarmos uma solução para o problema. Uma das alternativas que está sendo apontada começa com a restituição do porto que é de propriedade do estado e que lhe foi emprestado por um período de 100 aos, para ser usado na movimentação de automóveis. Diga-se de passagem, que a Ford usava muito mais a área portuária para estacionamento de veículos do que os berços para atracação de navios.

Se o problema é o de perda de mercado para o carro elétrico, que se arrende ou venda a unidade para montadora que possa fazer a alteração do processo produtivo. Os carros elétricos também usam pneus, lanternas, estofamentos, instrumentos, chassis e outros, mudando apenas o acionamento mecânico. Se o mercado doméstico está estreito, poder-se-ia ampliar as vendas para o exterior com importações de componentes via sistema draw back suspensão, estendendo este mecanismo fiscal para a extremidade da cadeia produtiva, permitindo que a comprovação da exportação fosse realizada por terceiros, usando por inteiro ou parcialmente o insumo importado. Ou ainda, admitindo-se, sem restrições, a prática do consagrado“draw backverde e amarelo”. Como se vê, existem soluções várias para se explorar o tema. O que não se pode fazer é abandonar ativos preciosos de difícil realização. Nada custa lembrar que do lado dos fornecedores sistemistas está na hora de fazerem esforço maior para que suas unidades se transformem em equipamentos multi propósitos, caminhando no sentido de reduzirem a vulnerabilidade de produzir para um só cliente e procurando maior interação com a economia local, introduzindo produtos naturais da região no automóvel.

Ainda não se mediu plenamente todas as consequências da paralização, principalmente no campo social. Ainda não se fez avaliação completadas perdas dos empregos diretos, a redução das atividades indiretas na produção de bens e serviços, a diminuição do relacionamento social nos centros urbanos, sem falar na perda de tributos arrecadados em todos os níveis, o que pressiona negativamente o governo no atendimento da crescente demanda por serviços públicos de saúde, segurança e educação.

Não escrevi este artigo pensando em esgotar o assunto, como também não estou convicto de que ninguém está debruçado sobre o tópico, mas acho salutar levantar a discussão pública de tema tão importante para a vida da nossa comunidade.

Adary Oliveira é engenheiro químico e professor (Dr.) – [email protected]

 

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