A intervenção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no comando da Petrobras foi o golpe mais forte na confiança do investidor estrangeiro desde o início deste governo e provocou novas dúvidas sobre o tamanho do poder que o ministro Paulo Guedes (Economia) ainda exerce sobre a política econômica do Brasil. Os donos do dinheiro no exterior já estavam bastante cautelosos quanto a fazer aportes no Brasil, que tem perdido relevância global por causa da piora de seus indicadores econômicos e não possui grau de investimento há algum tempo. Assim, o impacto da interferência do presidente brasileiro na estatal do petróleo causou temor de um efeito cascata em outras empresas públicas e deve ter reflexos a longo prazo no mercado externo.
Muitos dos investidores nos EUA não acreditam que Guedes deixará o cargo em breve. Dizem que o ministro —que sempre afirmou ter sido rechaçado pelos intelectuais da economia— agora se sente aceito no poder. As perguntas que fazem, porém, são sobre a influência que ele terá como fiador de uma agenda liberal daqui para frente, diante da postura intervencionista de Bolsonaro. No fim da semana passada, o presidente brasileiro anunciou a troca no comando da Petrobras, com a indicação do general Joaquim Silva e Luna no lugar de Roberto Castello Branco, economista ligado a Guedes. A reação do mercado foi histórica, com reflexos negativos na Bolsa, câmbio, risco-país, juros futuros, e a revisão generalizada nas avaliações de bancos e agência de classificação de risco em relação às estatais do país —agora vistas com mais pessimismo.
As ações da Petrobras caíram mais de 21,5% só na segunda-feira (22) e a companhia chegou a perder R$ 102,5 bilhões em valor de mercado desde sexta-feira (19), quando Bolsonaro anunciou a troca do comando na estatal. Em Nova York, as ADRs (certificados de ações negociados nos Estados Unidos) da Petrobras caíram 21% na segunda. Esses papéis, que geralmente estão na 34ª posição entre os mais negociados, ficaram em 5º lugar na data, movimentando US$ 1,64 bilhão, contra média diária de US$ 400 milhões. A reação negativa do mercado arrefeceu na terça-feira (23) após Bolsonaro aliviar o discurso intervencionista e o governo sinalizar, ao longo do dia, que iria destravar a processo de privatização da Eletrobras. Ainda assim, a petroleira acumulava perda de R$ 73,5 bilhões no Brasil.
Em NY os papéis subiram 6,68% nesta terça.
Investidores e analistas ouvidos pela Folha afirmam que a interferência de Bolsonaro causou preocupação no mercado estrangeiro, que vê nas ações da Petrobras o principal termômetro da economia do Brasil, e pode ter afugentado os poucos investimentos que entravam no país. “A reação do mercado diz tudo sobre a reação de investidores. Sem dúvida, o que aconteceu não ajuda a convencer estrangeiros a voltarem a investir no Brasil”, diz Will Landers, chefe de renda variável para a América Latina do BTG Pactual. “Começou a entrar um pouco de dinheiro estrangeiro [no Brasil] em novembro. [Esse movimento] tinha continuado nos primeiros 45 dias do ano, mas a Petro caindo 20% em um dia não ajuda ninguém.”
Desde o início do governo Bolsonaro, investidores estrangeiros têm esperado o que chamam de melhor momento para colocar dinheiro no país, mas isso ainda não aconteceu de maneira efetiva e em grande escala. “Os investidores estrangeiros já não estavam otimistas com o Brasil, estavam agindo com bastante cautela, e o país estava fora das principais escolhas dos gestores”, afirma Victor Scalet, estrategista macro da XP Investimentos. “Então não dá para dizer que houve uma grande decepção entre os investidores.”. A pandemia e a crise econômica global pioraram o cenário para o Brasil como porta de entrada de dinheiro estrangeiro, mas a avaliação de especialistas é que trocar o comando da Petrobras desta maneira abalou a confiança de forma generalizada —para além do setor energético.
Scalet diz que o impacto foi forte, mas com diferenças sobre cada tipo de investidor. “Para quem trabalha sobre empresas, bateu mais forte, e a principal dúvida é se vai haver um efeito cascata de interferência do governo em outras estatais.”. Já para os investidores que operam de olho na macroeconomia do país, explica, as dúvidas são no sentido de se vai haver uma reorientação na política econômica do país. O que mais incomodou os donos do dinheiro no exterior foi a postura de Bolsonaro, que ameaçou nas redes sociais esta e outras intervenções. Às vésperas das eleições de 2022, eles dizem, o presidente pode adotar novas atitudes intervencionistas ou populistas para tentar conter a alta da inflação e a queda de sua popularidade.
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