Estado de São Paulo – Como surgiu a ideia do projeto?
Pedro Paulo – Iniciamos no recesso essa discussão por uma provocação do presidente Rodrigo Maia, olhando o cenário do futebol brasileiro. De um lado os resultados esportivos brasileiros aparece, em especial da seleção e de alguns clubes. Mas quando olha o cenário internacional o futebol brasileiro está muito abaixo do seu potencial. Essa ideia não é nova de dar uma oportunidade de associações sem fins lucrativos migrar para clube empresa. O desfio é fazer com que o negócio sobreviva, que é o que não aconteceu no Brasil, por causa da alta carga tributária e do alto endividamento.
ESP – Quais os benefícios de o clube se tornar empresa?
PP – O primeiro ponto é que em um clube, salvo algumas exceções, os dirigentes não têm nenhuma responsabilidade, tomam decisões que geram endividamento e isso não provoca nenhuma responsabilidade para os clubes. No formato empresarial eles terão que responder com o patrimônio deles. Eles têm que dar satisfação aos conselhos porque o dinheiro das pessoas está em jogo Esse é o primeiro fator positivo. O segundo é que vamos trabalhar uma carga tributária simplificada. Um pouco maior do que um clube sem fins lucrativos, mas bem menor do que os cerca de 40% que uma empresa tradicional paga. Isso vai permitir que o clube possa competir internacionalmente, que possa ter geração de caixa para atacar o endividamento.
ESP – Como funcionará a renegociação das dívidas?
PP – Só os clubes da Série A juntos representam quase R$ 7 bilhões seja com governo ou privada. De 2017 para 2018 cresceu 8%. É um problema particular do futebol brasileiro. A gente precisa atacar esse endividamento porque ele sufoca os clubes.
ESP – Quem poderá investir nos clubes?
PP – Depende do formato. Clube da Série B e Série A pode formar Limitada e não abrir ação para o mercado. Mas pode ter clubes grandes que se tornam S/A com ações negociadas em bolsas, isso pode acontecer. Tive o cuidado de colocar mecanismos de proteger investidores que queiram lavar dinheiro e queiram tomar conta do clube. Por exemplo: não podemos ter investidor comprando o Palmeiras e sendo sócio do Corinthians. Se um investidor comprar mais de 5% das ações vamos saber todos os dados do investidor, até o tataravô do investidor, são mecanismos de transparência absoluto para que possa saber de onde vem.
ESP – O Figueirense é um exemplo…
PP – Queremos evitar problemas como aconteceu com o Figueirense, que veio investidor de baixa qualidade, que não se sabe a origem dos recurso. Criamos mecanismos de transparência absoluto, mas isso estará ofertado ao mercado.
ESP – Por outro lado o Flamengo é um exemplo positivo de associação desportiva…
PP – O Flamengo no início tinha divergência de ser obrigatório. O projeto não é mais obrigatório. Havia discussão sobre equiparação tributária, isso já foi superado. Nessas discussões com o Flamengo o projeto evoluiu e entendeu a mensagem de respeitar e entender quem fez o dever de casa. O projeto respeita isso quando se torna optativo. O Flamengo quer continuar como associação e isso vai ser respeitado. Não vamos mexer. O Flamengo tem condições, tem torcida e dirigentes que estabeleceram mecanismos de gestão que faz de competir globalmente.
ESP – E como será realizar um campeonato entre associações e empresas?
PP – No formato de empresa que estou apresentando estamos adicionando alíquota de 5%, que vai substituir todas as alíquotas que uma empresa normal pagaria: Contribuição Sobre Lucro Líquido, Imposto de Renda Sobre Pessoa Jurídica…. todos esses impostos serão substituídos por uma alíquota simplificada. Dará uma diferença entre clube associação civil e clube-empresa de somente 5%. Isso é muito mais competitivo do que o Bragantino Red Bull que deve pagar algo em torno de 35% de carga tributária total, em comparação com os outros clubes que pagam em torno de 5%. O Bragantino hoje é um ponto fora da curva. O Vitória e o Bahia, por exemplo, tiveram uma experiência e não prosseguiram por causa da carga tributária. Tem diversos motivos por que não deram certo, mas basicamente foi a alta carga tributária e a pouca transparência e clareza do investidor.
ESP – O Corinthians é um clube que se mostrou contrário. Uma das críticas do presidente Andrés Sanchez é que o clube pode virar um Figueirense…
PP – Ele não está contra. Tenho conversado com o Andrés Sanchez desde o início. Ele tem contribuído muito. Ele tem me provocado desde o princípio especialmente em uma conversa sobre regime de contratação. É importante mexer no regime de contratação do futebol que tem muitas especificidades. Há confusões entre a Lei Pelé e o regime CLT. Isso não significa que vamos reduzir direitos dos atletas, mas atualizar com base na reforma trabalhista. Para responder essa crítica que ele colocou sobre a transparência do investidor, colocamos esse capítulo específico de fiscalização.
ESP – O que pode acontecer se um clube-empresa quebrar?
PP – Hoje o clube se endividar e vir o perdão mascara a má gestão e, no fim, quem está pagando é a sociedade. Do outro lado tornar o clube empresa e acabou, deixa que ela, numa eventual falência, suma como marca, escudo. É algo que temos que proteger. Tem países em que acontece isso: quebrou, quebrou, sai do mapa. Nós estamos adotando um modelo aqui que o mecanismo será a cessão da marca do clube. Por exemplo, se o Palmeiras quiser virar uma empresa ele não poderá transferir o escudo e a cor. Estará protegida por 30 anos, renováveis por mais 30. Se no futuro quebrar, poderá entrar em recuperação judicial para tentar escapar da falência. Mas se falir, a marca é devolvida para o clube social e a vida começa de novo, com mais dificuldade, mas a marca não vai sumir. Para evitar problemas que tivemos.
ESP – Qual a expectativa para que os clubes possam se beneficiar desse projeto?
PP – Expectativa é que possamos nesta semana, mais tardar na próxima, aprovar o projeto na Câmara. Aí irá ao Senado para que possa fazer outras modificações, aprovar e até o final do ano possa disponibilizar essa legislação para que os clubes virem e a partir de 2020 já disputem campeonato no formato empresarial.
ESP – Quais clubes já demonstraram ser favoráveis a esse modelo?
PP – Atlético-PR, Botafogo, vários outros que estão estudando como Palmeiras e Corinthians. Não tenho dúvidas que muitos clubes estarão observando o desdobramento disso. Os bons exemplos que trouxerem resultado vão gerar ambiente de contaminação positiva. Não é uma chave que vira de uma hora para outra. Ela também não vai resolver tudo, a boa administração depende de pessoas. É preciso também a CBF dar passos adiante, ajustar mais os clubes. Nos países que deram certo, as ligas se organizaram. Tem muitas outras coisas, mas é um passo para os clubes se organizarem.
ESP – A aprovação do clube-empresa pode ocasionar em uma liga de clubes independentes?
PP – Vamos colocar propostas que possam melhorar as condições esportivas. A gente fugiu disso. Os clubes terão que discutir isso com as entidades, entre eles…. O legislador não tem que querer legislar tudo. Ele tem que criar condições para que legislação possa ajudar e não interferir. A lei vai dar oportunidade para que empresas nasçam e se multipliquem no futebol. O futebol pode ajudar o Brasil também. A cadeia produtiva do futebol gera 370 mil empregos diretos e indiretos. O dinheiro do futebol brasileiro representa 0,2% do PIB. É muito pouco. Há um estudo da FGV que acredita que esse número pode sair de 370 mil e ir para um milhão, um milhão e meio de postos de trabalho. Imagina o impacto para o Brasil, que hoje tem 12 milhões de desempregados?