

O medo tem alguma utilidade, mas a covardia não
Mahatma Gandhi
Os navegadores antigos tinham uma frase gloriosa que inspirou o poeta
Fernando Pessoa em suas Palavras de Pórtico: “Navegar é preciso, viver não é
preciso”, ou seja, “Navegar é necessário, viver não é necessário”. A expressão
simboliza o caráter aventureiro das primeiras experiências dos homens com a
navegação, quando se lançavam ao mar em viagens de retorno incerto e,
quase sempre, de desfecho catastrófico.
Na nossa cultura, somos condicionados, desde pequenos, a rejeitar o medo,
mas – atenção, fortões de plantão – o medo, em si, não é uma coisa negativa,
antes, porém, é um elemento essencial para a nossa defesa e sobrevivência.
O medo é instrumento de controle e, muitas vezes, nos impede de cair num
precipício; pode nos livrar do atropelo no meio da rua; de um assalto a mão
armada; da mordida de um cachorro vadio ou mesmo da derrota pelo contra-
ataque do time adversário.
Mas, se o medo não é ruim, então a coragem não é uma virtude? A dúvida
parece absurda, já que a coragem sempre foi uma das qualidades mais
cultivadas ao longo de toda a história da humanidade, embalando as mais
belas páginas da Filosofia e da Literatura Universal.
Se entendermos a coragem como a negação do medo, podemos concluir que
ela é desastrosa. A coragem, entretanto, não é a ausência do medo, mas o
controle desse sentimento (“Coragem é resistência ao medo, domínio do medo,
e não ausência do medo”, Mark Twain).
Restabelecido o conceito de coragem, podemos perceber que, assim como
negar o medo, cultivá-lo pode ser igualmente perigoso, pois o medo constante
assume a dimensão da depressão, essa doença terrível, que nos paralisa e
nos impede de aproveitar o melhor da vida.
“A vida é muito curta para ser pequena”, ensina o escritor e político britânico,
Benjamin Disraeli.
Você tem medo de quê? De avião? Bicho-papão? Escuridão? Solidão?
Pobreza? Bala perdida? De paixão? Da vida? Da morte?
Certa vez, ouvi uma expressão que me pareceu inteligente e controversa:
“Tenho mais medo do ridículo do que da morte”. Por um lado, faz sentido, pois
pior que morrer é perder a vida, se arrastando com medo da morte. Por outro
lado, viver com medo do ridículo é viver sem amar, afinal, voltando a Fernando
Pessoa, “As cartas de amor, se há amor, têm que ser ridículas”.
Eta vidinha complexa!
Termino com a mesma expressão inicial, reinventada com um novo sentido:
“Navegar é preciso, viver não é preciso”, ou seja, “Navegar é exato, viver não é
exato”.
E vamos em frente!
Sérgio Faria, engenheiro e escritor, presidente da ALAS –
Academia de Letras e Artes do Salvador e membro da ABROL
– Academia Brasileira Rotária de Letras
(Foto: Blog Decreto da Vitória)