Em 2024, o aposentado Armando Quintanilha Boechat notou descontos estranhos na sua aposentadoria e procurou o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Ele já tinha perdido mais de R$ 1 mil desde julho de 2023. A explicação que o aposentado buscava há um ano poderia estar nas notícias sobre a fraude no INSS, escândalo que veio à tona em abril de 2025 e afetou milhões de beneficiários — mas não foi isso que aconteceu.
No caso de Armando, os descontos não eram feitos na folha de pagamento, mas em débito automático, depois que a aposentadoria caía na sua conta bancária. Além disso, os descontos não estavam descritos no extrato como “taxa de contribuição associativa”, e os nomes das empresas que apareciam no débito em conta — Paulista Serviços e Aspecir — não estão entre os alvos da operação recente da Polícia Federal (PF).
A mensagem de notificação do INSS, que o aposentado recebeu há alguns dias, confirmou suas suspeitas: ele não foi uma das vítimas da fraude. Mas, o que explica os descontos indevidos na sua conta? Essa é a pergunta que está levando muitos à Justiça para questionar os débitos em nome das duas empresas. A Paulista Serviços, ou Pserv, é alvo de mais de 15 mil ações na Justiça de 1º grau e nos juizados especiais, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Já as três empresas que formam o Grupo Aspecir somam 20.777 processos. Só a Aspecir Previdência tem 14.042 ações.
De um universo de mais de 1 milhão de empresas, essas duas estão entre as 200 com mais processos em andamento no Brasil, segundo o CNJ. O órgão não forneceu a lista completa. As empresas admitem que a principal queixa é de débitos automáticos em conta-corrente, mas afirmam que os descontos são autorizados pelos clientes, mediante documentos assinados ou gravações telefônicas.
O g1 identificou ao menos 20 ações em que beneficiários reclamam de descontos indevidos e não autorizados em suas contas e ouviu dois aposentados que afirmam ter tido débitos sem autorização. Também foram acessadas duas sentenças judiciais em que as empresas foram condenadas, em primeira instância, a ressarcir os valores. Muitos processos são recentes e ainda estão em andamento. Em geral, os reclamantes dizem que nem mesmo sabem quais serviços ou produtos teriam contratado. Também não conseguem cancelar os descontos futuros, que variam entre R$ 30 e R$ 90, porque eles são lançados mês a mês.
Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil