A Associação Brasileira do Alumínio (ABAL) reforça sua preocupação com os impactos da sobretaxa sobre os produtos de alumínio brasileiros. É importante destacar que o documento recentemente divulgado pelo Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) não faz menção específica a uma nova medida para produtos de alumínio, que já enfrenta uma sobretaxa de 25% desde 12 de março deste ano.
Embora ainda seja cedo para medir os efeitos diretos dessas sobretaxas nas exportações brasileiras de alumínio para os EUA— visto que não se completou sequer um mês da sua aplicação.AABALchamaatençãoparaospotenciaisefeitosindiretoseestruturaisdemédio e longo prazo, especialmente no que diz respeito à suscetibilidade do país aos desvios de comércio e à desestruturação da cadeia de reciclagem de alumínio nacional, que hoje configuraumadasmaioresvantagenscompetitivasdoBrasilparaseureposicionamentona cadeia global de suprimento.
Embora a participação do Brasil nas importações americanas de produtos de alumínio seja pequena (menos de 1%), os EUA são um parceiro comercial estratégico, representando 16,8% das exportações brasileiras do metal em 2024 — o equivalente a US$ 267 milhões e 72,4 mil toneladas, das quais 54,2 mil estavam sujeitas à Seção 232. Desse volume, 76% corresponderam a chapas e folhas de alumínio.
A medida tem implicações que vão além do impacto comercial imediato. Ela reflete uma estratégia mais ampla de coordenação entre políticas industriais, tarifárias e de defesa comercial,emcursotantonosEstadosUnidoscomoemoutraseconomias,comoresposta a um processo global de desindustrialização — impulsionado por práticas comerciais anticompetitivas e pelo aumento dos custos de energia. Embora conceitualmente legítima, essaestratégiaprecisaconsideraracomplexidade,ainterdependênciaeosriscosassociados à fragmentação da cadeia global do alumínio.
Há ainda dúvidas sobre a efetividade dessas tarifas no alcance dos objetivos propostos. A desproporcionalidadedasmedidaspodeelevarsignificativamenteoscustosdeproduçãode setoresestratégicosparaaeconomiaamericana,comoautomotivo,aeroespacial,dedefesa e de embalagens, com potenciais efeitos inflacionários.
Além disso, a retomada da produção doméstica de alumínio americana exige tempo e demanda grandes volumes de energia, o que impõe limitações práticas no curto prazo. Nesse cenário, há o risco de que tarifas aplicadas com o objetivo de revitalizar a economia acabem,paradoxalmente,fragilizandoacompetitividadedaprópriaindústriaamericana,na medida em que mantêm o país exposto à dependência externa de insumos estratégicos, como bauxita e alumina.
Diante desse cenário, é fundamental que o debate sobre proteção da indústria e fortalecimento de novas capacidades produtivas seja conduzido a partir de uma visão sistêmica.Atrajetóriadaindústriabrasileiradoalumínio—que,deformaresiliente,vem conseguindoreverteroquadrodedesindustrializaçãopormeiodeinvestimentosemativos estratégicos — posiciona o Brasil em uma janela de oportunidade singular para seu reposicionamento na cadeia global.
Além de deter a quarta maior reserva de bauxita do mundo e figurar entre os três maiores produtores globais de alumina, a indústria nacional investiu significativamente na diversificação e autogeração de energia a partir de fontes limpas e renováveis.
O país também se consolida como um dos principais recicladores de alumínio do mundo: hoje,cercade60%doalumínioconsumidonoBrasiltemorigememmaterialreciclado—o dobro da média global (inferior a 30%) e muito acima da média americana. Tudo isso se tangibiliza em uma indústria cuja principal vantagem competitiva é a verticalização, que garante desempenho e rastreabilidade à cadeia de custódia e contribui para a menor exposiçãodopaísàsexternalidadesobservadasemmomentoscríticos,comoosvivenciados durante a pandemia, escaladas geopolíticas e disputas comerciais internacionais.
Para que o fortalecimento de uma indústria nacional seja sustentável no longo prazo, é necessário considerar a totalidade e a interdependência dos elos produtivos, com base em uma cadeia integrada, resiliente e orientada ao atendimento da demanda doméstica. Protegerumeloespecíficodacadeianãoésuficientesepersistiradependênciadeinsumos estratégicos externos.
Nesse sentido, chama atenção o fato de que a nova tarifa americana não incide sobre a sucata de alumínio, o que sugere uma estratégia deliberada de abastecimento por meio daimportaçãodestamatéria-prima.IssosuscitapreocupaçõescomoriscodeoBrasil,que temfeitoinvestimentosrelevantesparaampliarsuacapacidadedereciclagem–orientados, prioritariamente, ao atendimento da crescente demanda doméstica por produtos de alumínio – passe a ser visto como fonte estratégica de suprimento do metal por países que optaram por estratégias de curto prazo em detrimento da construção de uma cadeia produtiva sustentável e autônoma.
Esse cenário acende um alerta sobre os riscos de comprometimento dos esforços que a indústria brasileira do alumínio vêm realizando para recuperar sua autossuficiência no fornecimento do metal. Medidas adotadas por outros países — muitas vezes guiadas por objetivos transacionais de acesso a insumos estratégicos, e não necessariamente por uma agenda de proteção industrial — podem gerar desequilíbrios capazes de fragilizar esse processoecolocaremriscoaconsolidaçãodeumacadeiaprodutivaintegrada,sustentável e voltada ao atendimento da demanda doméstica.
A ABAL segue dialogando com as autoridades competentes, contribuindo com dados, análises e propostas para garantir condições isonômicas para o setor e preservar sua capacidade de competir, de forma sustentável, nos mercados nacional e internacional. Reforça,ainda,aimportânciadofortalecimentodosinstrumentosdedefesacomercialeda recalibração da política tarifária nacional, com oobjetivo de corrigir distorções e evitar que práticas assimétricas comprometam a competitividade da indústria brasileira do alumínio.
Imagem de Russian Aluminium Association por Pixabay