As empreendedoras pretas e pardas enfrentam mais dificuldades financeiras que as demais. 52% delas relatam estar endividadas, de acordo com a pesquisa “Empreendedoras e Seus Negócios 2024”, realizada pelo Instituto RME, com apoio da Rede Mulher Empreendedora. Entre as brancas, o percentual é de 45%. O acúmulo de funções – entre a administração do negócio e as demandas familiares e domésticas, a falta de educação financeira e a dificuldade de acesso a crédito e financiamento são os principais responsáveis pelo dado preocupante, principalmente ao se considerar que a independência financeira é a principal motivação para o empreendedorismo, especialmente entre mulheres pretas e pardas (48%), que também veem nele uma forma de aumentar a renda (39%).
“62% das mulheres pretas e pardas são chefes de família e elas têm menor disponibilidade de tempo para estudos e para o desenvolvimento de temas relacionados à gestão financeira, o que, aliado à falta de apoio financeiro, acaba influenciando na capacidade de evitar o endividamento”, explica Luciana Xarim, CFO do Instituto RME. “Precisamos repensar, enquanto sociedade, toda a lógica da economia do cuidado, que hoje recai principalmente sobre as mulheres negras, deixando-as sobrecarregadas. Uma solução é Investir em educação e desenvolvimento, além de aumentar a oferta de cursos gratuitos que se adequem à rotina delas”, acrescenta.
Xarim destaca que o incentivo ao empreendedorismo feminino negro também passa por aumentar o número de creches e escolas, especialmente nas periferias, e pelo estabelecimento de percentuais específicos de créditos em programas nacionais voltados exclusivamente para mulheres pretas. “A informação sobre esses programas deve ser clara, facilitando tanto o acesso quanto o processo de concessão desses recursos financeiros. As organizações sociais que atuam nessa área também devem publicizar cada vez mais os projetos e cursos gratuitos com foco no desenvolvimento dessas empreendedoras em temas essenciais e relevantes para seus negócios, como gestão financeira, marketing e planejamento de tempo.”
O próprio Instituto RME e a Rede Mulher Empreendedora oferecem, entre outras ações de advocacy junto ao Governo Federal para a criação de políticas públicas, cursos, mentorias, networking e microdoações (ou capital semente) para impulsionar os negócios geridos por mulheres. A dificuldade de acesso ao financiamento é um dos obstáculos mais sentidos por Marcela Santos, dona do Ateliê Deusa Chic, onde cria turbantes e outros acessórios, além de roupas e figurinos pautados na estética afro. Após fazer um curso de costura no bloco Malê Debalê, ela abriu o ateliê em casa, em 2018. Este ano, conseguiu abrir seu ponto comercial. “Comecei do zero e, aos poucos, fui buscar aprender sobre planejamento e precificação. Mas o acesso ao crédito é muito limitado. Uma empreendedora preta não consegue ir ao banco e sair com R$ 10 mil. Parece haver uma descrença, de antemão, em relação à gente. É muito difícil escalar um negócio, mesmo sabendo que ele tem potencial”, lamenta.
Marcela diz que, em famílias pretas como a dela, “todo mundo é empreendedor, de uma forma ou outra”. Com o Ateliê Deusa Chic, ela também começou a dar aulas de costura criativa, com foco em sustentabilidade e reaproveitamento de retalhos e resíduos têxteis. Nesse trabalho, ela tenta incentivar, a partir de sua experiência, que outras mulheres alcancem a independência por meio do empreendedorismo. “Outro gargalo importante é a falta de educação financeira”, diz. (A Tarde)
Foto: Denisse Salazar | Ag. A TARDE