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DESTRUIÇÃO AO PATRIMÔNIO EM BRASÍLIA DEVE ULTRAPASSAR OS R$ 20 MILHÕES

Redação - 13/01/2023 13:38 - Atualizado 13/01/2023

A destruição causada pelos terroristas apoiadores do ex-presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, nos palácios dos Três Poderes, na Capital Federal, pode sair cara ao erário brasileiro.

Cálculos estimados até o momento avaliam que os estragos no Palácio do Planalto podem superar a marca dos R$ 10 milhões. No Congresso, a estimativa é de R$ 6,5 milhões e, no Supremo Tribunal Federal, o edifício que ficou mais danificado com a ação dos vândalos, os prejuízos estão acima de R$ 4 milhões.

Apesar das altas cifras, no entanto, especialistas em arte e mobiliário ouvidos pela Casa Vogue dizem que os valores são inestimáveis. “O custo da destruição do patrimônio cultural é inatingível. Não é só o valor monetário, mas a importância histórica do que foi destruído, um dano irreparável à Nação”, diz o antiquário e pesquisador Arnaldo Danemberg, que, no segundo mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva, classificou o mobiliário histórico do Alvorada e do Itamaraty a convite do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de Brasília (Iphan-DF).

Presidente do Instituto Sergio Rodrigues, o designer Fernando Mendes ficou estarrecido ao ver destruídas a mesa Vitrine, poltronas Kiko e Navona e cadeiras Tião, todas assinadas pelo mestre carioca. “Espero que haja uma reação efetiva a essa barbárie. Esse acervo é histórico, alguns encomendados especialmente para os palácios”, afirma. Além dos danos às obras de arte, ao mobiliário, aos vidros e tapetes, os relatórios apresentados até o momento apontam destruição em computadores – só na Câmara dos Deputados foram 400 aparelhos, com custo de reposição estimado em R$ 2 milhões –, impressoras, telefones, TVs, máquinas de raio-X e viaturas – essas usadas pela Polícia Legislativa no valor de R$ 500 mil.

O diretor de Curadoria dos Palácios Presidenciais dos palácios presidenciais – Planalto, Alvorada e Granja do Torto —, Rogério Carvalho, afirma que só será possível estimar o valor dos restauros no Planalto depois da finalização dos laudos dos peritos. Segundo ele, verificou-se na visita da especialista do Iphan que a recuperação da tela As Mulatas, de Di Cavalcanti, será mais onerosa do que o previsto. “Os sete furos foram feitos com pedras portuguesas retiradas da praça dos Três Poderes. Esses rasgos estão à meia altura da tela, o que comprometeu sua resistência, por isso, em vez de suturas, teremos que retirar o chassi e refazer a entretela.” Rogério disse ter visto uma cena de guerra quando entrou no Planalto no fim da tarde de domingo (8).

Outra recuperação que preocupa o curador é a do relógio do século XVII, que veio ao Brasil com a corte portuguesa e foi levado a Brasília pelo governo de Juscelino Kubitschek. “Em uma ação muito brusca, arremessaram o relógio ao chão, separando os pedaços. No Brasil, não temos especialistas que possam recuperá-lo. Recebemos uma proposta da empresa suíça Piaget se oferecendo a nos auxiliar nesse restauro”, conta.

A possível ajuda, porém, só será definida depois da reunião proposta pela ministra da Cultura, Margareth Menezes, que instituirá um grupo de trabalho com membros da Presidência da República, do Iphan, do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), da Polícia Federal e de especialistas, com o objetivo de orientar os restauros nos três palácios. Entre as sugestões que Rogério levará ao encontro, está o pedido de tombamento pelo Iphan desses acervos.

Na Câmara dos Deputados, a chefe do serviço de preservação, Gilcy Rodrigues Azevedo, conta que o plano de gerenciamento de risco agilizou o processo de recuperação das peças pela equipe formada por 15 restauradores. A escultura A bailarina, de Victor Brecheret, por exemplo, havia sido arrancada de seu pedestal e largada no chão, mas já foi restaurada e recolocada no posto original. “Tínhamos o diagnóstico de todos os itens e já sabíamos o que fazer com os que foram danificados. Tudo foi higienizado para eliminar o pó químico”, afirma ela”, afirma ela.

Dos 46 presentes protocolares (itens doados por autoridades em visita oficial ao país) expostos no Salão Verde, 29 permaneceram íntegros, 12 foram danificados com possibilidade de restauração e três, destruídos: dois vasos de porcelana e uma escultura em forma de ovo de avestruz. “Conseguimos garimpar algumas partes dos vasos de porcelana, mas temos poucos pedaços para reconstruí-los.” E há ainda dois itens desaparecidos: uma pérola em um recipiente de ouro, presente do Catar, e uma bola de futebol assinada pelo jogador Neymar. “Além de quantificar os valores de cada objeto, teremos de avaliar o material e a mão de obra empregados no restauro para chegarmos ao número exato do que representou esse prejuízo”, diz Gilcy.

O arquiteto Rodrigo Azevedo, que faz parte da equipe do departamento técnico da Seção de Patrimônio Edificado no Congresso Nacional, afirmou que ainda não se tem a dimensão dos danos causados com relação à estrutura dos edifícios tombados. “Não sabemos ainda se os arranhões feitos no piso de granito só marcaram a resina ou chegaram a machucar a pedra. Há ainda pichações a serem removidas e muitos vidros a serem repostos.” Rodrigo, no entanto, avalia que os estragos poderiam ter sido ainda piores, visto que os vândalos tentaram atear fogo em algumas áreas. Os atos não foram bem-sucedidos porque carpetes e tecidos são antichamas.

No Senado, que teve o piso alagado e quase todas as vidraças quebradas, a tapeçaria de Burle Marx dos anos 1970 ficou encharcada, rasgada e há suspeitas de que um dos terroristas tenha urinado na obra. “As cores se sobrepuseram e esse será um grande desafio para nós. Ainda não temos estimativas de quanto custará essa recuperação. No nosso quadro técnico não temos restauradores especializados em têxtil para saber se a peça poderá ou não ser recuperada”, diz Ismail de Souza Carvalho Neto, chefe do laboratório de restauração do Museu do Senado. O restauro do painel de Athos Bulcão é outro item que ainda não se sabe quanto custará. “Para se ter ideia, um tubinho de tinta pode sair por mais de R$ 800 e devemos empregar pelo menos uns cinco, ou até mais”, informa.

Foto: Mateus Bonomi/Anadolu Agency via Getty Images

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