O agronegócio brasileiro tem abastecido com folga o nosso mercado interno, além de exportar para mais de 180 países, colocando as vendas externas setoriais em patamar superior a 120 bilhões de dólares, algo equivalente a uma fatia entre 43% e 48% das exportações totais do país nos últimos dois anos.
Nada obstante, o conflito Ucrânia-Rússia que colocou com mais nitidez que temos algumas poucas vulnerabilidades no abastecimento do nosso mercado, destacadamente, no plano dos insumos, os elevados coeficientes de importações de fertilizantes (85% de nossas necessidades e, no caso do potássio, essa dependência chega a 95%); e, no plano dos alimentos, importamos cerca de 50% de nossa demanda de trigo, produto estratégico para nossa segurança alimentar, sendo que desse total, 80% são procedentes de um único país: a Argentina.
Essa percepção, de números tão elevados de importações de itens essenciais , nos remete à necessidade e oportunidade de redução drástica dessas importações ou mesmo da busca da autossuficiência nessas duas pautas. Nesse particular, a Bahia tem chance de participar desse esforço na direção da autossuficiência. No caso do trigo, poderemos contribuir com o plantio irrigado na Oeste e na Chapada Diamantina, com possibilidades de obtenção de produtividades entre 6 e 7 toneladas por hectare, mais que o dobro da média nacional. Não raro, especialmente nas novas áreas de fronteira agrícola, a implantação de moinhos pode vir em paralelo, com vista a atrair o interesse dos produtores no plantio desse cereal e gerar valor agregado .Em outros casos, a indústria ou agroindústria a jusante vem depois da lavoura implantada, e, as vezes não vem, impondo aos estados produtores a condição de estados produtores de commodities agrícolas.
Sobreleva ressaltar que essa forma , da agroindústria a jusante, não é a única forma de geração de valor agregado. Vários analistas de peso, a exemplo de José Adeodato Souza Neto, têm considerado que os mercados podem sancionar aumentos de preços e geração de valor agregado, até mesmo em casos em que o produto vendido não experimenta qualquer tipo de beneficiamento substancial ou transformação industrial importante. Às vezes, a simples introdução de serviços pós-colheita, como classificação e embalagem, muito comum em algumas frutas vendidas internamente ou exportadas, como na maçã , adiciona valor agregado. Vamos dar dois exemplos adicionais de como gerar valor agregado sem grandes transformações do produto agropecuário.
Tema pouco contemplado entre vários analistas nacionais, um forte programa de Indicações geográficas , item muito valorizado em países como França e Itália (cada país citado tem cerca de 600 indicações geográficas nas atualizações mais recentes, ante 92 do Brasil), pode permitir upgrade comercial aos produtores, aumentos de preços, acesso a novos mercados mais exigentes e remuneradores, além da possibilidade de incrementar o turismo agrorural. A Bahia tem apenas 5 indicações: cachaça de Abaíra, cacau do Sul, café do Oeste, manga e uva do vale do São Francisco. Curiosamente, dois cafés especiais mundialmente apreciados e também no mercado interno não desfrutam desse status: trata-se dos cafés especiais de Piatã e Mucugê.
Um outro exemplo se localiza na pecuária bovina. Mercados mais exigentes, como Japão e Coreia do Sul, preferem comprar e consumir carne bovina de animais sem vacinação para febre aftosa. No Brasil, poucos estados, como Santa Catarina e Rio Grande do Sul, alcançaram esse status, de Estados livres de Febre Aftosa sem Vacinação. Já dissemos aqui diversas vezes que a Bahia deve buscar esse objetivo para mudar o patamar de nossa pecuária.
(1)Consultor Legislativo e doutor em Economia pela USP. E-mail: [email protected]