Estimativas do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023, enviado na semana passada pelo governo ao Congresso Nacional, apontam para uma redução do tamanho do Estado — em razão da previsão de forte contração no gasto público — e uma tendência de precarização da oferta de bens e serviços públicos até 2025. A LDO é elaborada anualmente em abril e tem como objetivo apontar as metas e prioridades do governo para o ano seguinte. A lei estabelece as diretrizes para a elaboração do orçamento anual, encaminhado ao Legislativo em agosto de cada ano.
De acordo com a previsão do projeto da LDO para 2023, os gastos totais do governo vão cair nos próximos três anos, reduzindo o tamanho do Estado — um dos objetivos do chamado teto de gastos, regra pela qual a maior parte das despesas não pode crescer acima da inflação do ano anterior. Em 2021, os gastos públicos somaram 18,6% do PIB, o menor patamar desde 2014. Para os próximos anos, a projeção da LDO é de que as despesas na proporção do PIB vão recuar gradativamente (gráfico abaixo) até atingir 16,71% do PIB em 2025. Se isso se confirmar, será o menor nível em 17 anos — em 2008 essa proporção foi de 16,6% do PIB.
Com a redução de gastos, o setor público caminha para o retorno dos superávits fiscais nos próximos anos, ou seja, com as receitas superando as despesas (sem contar juros a dívida). Para 2023, a meta é de um déficit fiscal de até R$ 65,9 bilhões. Para 2024, o objetivo é que esse déficit seja menor (de até R$ 27,9 bilhões). A meta para 2025 é de um superávit primário de R$ 33,7 bilhões. A redução do tamanho do Estado é um objetivo declarado do ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele defende a redução dos gastos com servidores, com redução de concursos, menos reajustes e reforma administrativa, além de privatizações de empresas estatais, e uso de “vouchers” para saúde e educação no setor privado, entre outras medidas.
Impacto nos serviços públicos
No projeto da LDO de 2023, o governo avalia que, apesar da eficiência do teto de gastos no controle da maior parte das despesas, há crescimento dos gastos obrigatórios em relação à despesa total, com consequente queda dos gastos discricionários, que são as despesas livres dos ministérios. Segundo projeções oficiais do governo na LDO, os gastos obrigatórios (despesa com pessoal, previdência e seguro-desemprego, por exemplo) vão recuar progressivamente nos próximos três anos, passando de 16,8% do PIB em 2022 para 16,1% do PIB em 2025. E os gastos livres devem recuar de 1,4% do PIB, em 2022, para 0,6% do PIB em 2025.
Segundo o governo, essa queda dos gastos livres “tende a precarizar gradualmente a oferta de bens e serviços públicos e a pressionar, ou, até mesmo, eliminar investimentos importantes, reforçando ainda mais a necessidade de avanço na agenda de reformas estruturais”. A previsão da LDO para os gastos livres (discricionários) do Executivo é de R$ 108 bilhões para 2023, de R$ 93,8 bilhões para 2024 e de R$ 76,7 bilhões para 2025. Esses valores não contemplam emendas (obrigatórias e de relator) e há uma reserva de R$ 11,7 bilhões para reajustes de servidores.
Quando os gastos livres começam a ficar próximos de R$ 80 bilhões, analistas veem risco da chamada “paralisia” da máquina pública (shutdown), ou seja, o funcionamento prejudicado e dificuldade na oferta de serviços públicos. Para o secretário especial de Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Esteves Colnago, esse risco é “baixo”. “Vai ter uma restrição no primeiro semestre [de 2025, quando o gasto livre é menor], e ao longo do tempo o orçamento vai flexibilizando e vai conseguindo cumprir as demandas dos órgãos”, declarou.
Dentro dos gastos livres que podem ser afetados, estão as despesas de custeio administrativo dos ministérios, ações com serviços públicos e os investimentos da União. Entre os serviços, estão ações de defesa agropecuária; bolsas do CNPq; concessão de bolsas de estudo (Capes); Pronatec; emissão de passaportes; programa Farmácia Popular; fiscalização ambiental (Ibama); bolsas para atletas; aquisição e distribuição de alimentos para agricultura familiar, entre outros. Para abrir espaço no teto de gastos, reduzindo os gastos obrigatórios e aumentando os livres, o governo vê a necessidade de reformas.
A área econômica cita a necessidade da reforma administrativa, que poderia economizar R$ 300 bilhões em dez anos, e da tributária — que impulsionaria o crescimento econômico. Ambas estão paradas no Legislativo.
Dívida elevada
A forte contenção de despesas — que pode precarizar serviços públicos e reduzir o tamanho do Estado a fim de se retomar o superávit em 2025 — não deve, porém, resultar na queda da dívida pública. Esse indicador é acompanhado com atenção por investidores estrangeiros. A redução da dívida é o principal objetivo da política do governo para as contas públicas.
“O objetivo central da política fiscal [para as contas públicas] no médio prazo é o controle da trajetória de crescimento da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Para tanto, o governo federal busca o equilíbrio das contas públicas por intermédio do controle e do monitoramento do crescimento da despesa, bem como o acompanhamento da arrecadação dos tributos federais”, informou o governo.
O argumento da área econômica é que uma dívida sustentável possibilita a redução dos juros, alavancando o mercado de crédito e impulsionando o crescimento da economia e do emprego. Segundo o Banco Central, o endividamento brasileiro somou 79,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em janeiro. Pelo critério do Fundo Monetário Internacional (FMI), que considera os títulos na carteira do BC, a dívida pública brasileira está em 91,3% do PIB, acima da média da América Latina (78%).
Na LDO, o governo admite que, mesmo considerando as despesas primárias limitadas pelo teto de gastos, a trajetória projetada para as contas públicas “ainda se mostra insuficiente para uma redução significativa do crescimento da dívida pública no médio prazo [considerando o cenário traçado para os indicadores econômicos]”. A previsão do governo é de que a dívida pública bruta termine 2023 em 79,7% do PIB, e que avance para 80,3% do PIB em 2024 e 2025. Essa estimativa não considera os títulos públicos na carteira do BC, que estão, atualmente, acima de 10% do PIB.
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