Em 2021, até o dia 25 de novembro, a Bahia tinha 45 processos no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) por crime de injúria racial. Esse número é 2.150% maior que os de 2017, quando foram registrados apenas dois. No ano seguinte, somente um. A partir daí, os registros sofrem um salto: em 2019, são 65 processos e, em 2020, 37, voltando a subir em 2021. Por outro lado, os crimes de racismo quase não aparecem. Não há nenhum registro de processo por esse tipo de crime entre 2016 e 2020 no estado. O único caso registrado em em seis anos aparece em 2021, ano em que o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou injúria racial ao crime de racismo no dia 28 de outubro.
“O fortalecimento do movimento vem dando mais coragem para as vítimas denunciarem. As políticas afirmativas têm uma grande contribuição, assim como o acesso aos espaços de conhecimento e poder, e a popularização da internet, que trouxe o debate para mais perto. Só que aí a gente entra no tópico de que cresce o número de processos por injúria e não de racismo, ou seja, é a tipificação do crime de racismo como injúria porque, para mim, todo crime cometido a partir da cor/raça, é contra uma coletividade. Quando alguém aponta alguma característica racial de uma pessoa como forma de inferiorizar, está fazendo isso com todo um grupo”, defende Naira Gomes, que é antropóloga, pesquisadora e co-fundadora da Marcha do Empoderamento Crespo e do Fórum Marielles.
Ela explica por que há uma dificuldade em identificar um crime como racismo no Brasil. “As pessoas dão queixa e fica sob o entendimento do delegado tipificar como racismo ou injúria. A mesma coisa pode acontecer com o feminicídio, por exemplo. Aí esse delegado pode, por exemplo, não crer em racismo porque isso acontece; tem gente que diz que no Brasil não tem brancos e negros, mas, sim, mestiços; sem contar que ainda existe muito desconhecimento sobre o assunto e o preconceito puro, deslegitimando o racismo e a dor que ele causa”, coloca.
Ela ainda comenta sobre a dificuldade de provar o crime, seja o de racismo ou o de injúria racial. “É muito difícil provar. Primeiro porque, quando há testemunha, é provável que ela não vai querer se envolver em um processo judicial. Segundo, o Brasil é um país que nega o racismo. Quando a gente fala em racismo ou machismo, homofobia, quando não há agressão física, as pessoas entendem como algo muito subjetivo, menosprezam”, acrescenta.
Dandara Pinho, presidente da Comissão Especial de Promoção da Igualdade Racial da Ordem dos Advogados da Bahia (OAB), complementa que o racismo, muitas vezes, pode vir disfarçado de ‘piada’. “É extremamente complicado provar, até porque, às vezes, eles tomam o formato de ‘piadas’, e a gente cai no racismo recreativo”, diz. O responsável pelo termo é Adilson Moreira, doutor em Direito Constitucional Comparado pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos e autor do livro “Racismo Recreativo”, que surge a partir de análises de centenas de decisões judiciais que terminaram na absolvição de pessoas brancas acusadas de injúria racial. Muitas justificavam ataques verbais racistas como sendo “brincadeira”.
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