Mudanças e adaptações são algumas das palavras que representam o ano de 2020, sobretudo, quando o assunto é a rotina de trabalho. Nesse período, a pandemia chegou e alterou o dia a dia dos profissionais ativos no mercado. Com o isolamento social, o modelo presencial foi obrigado a ceder espaço para o remoto, que se tornou a principal alternativa para instituições e setores continuarem na produtividade.
Mas, devido ao avanço da vacinação, muitas empresas voltaram a ocupar os escritórios. Dessa vez em regime híbrido, no qual os funcionários trabalham alguns dias em casa, outros na sede da entidade empregadora. Esse é um sistema de trabalho que vem ganhando força e se consolidando como tendência para o pós-pandemia.
Isso é o que mostra uma nova pesquisa feita pelo Great Place to Work (GPTW), consultoria global, com 2.008 pessoas. Dos respondentes, 46,8% estão em uma organização que já atua com a política do híbrido. Além disso, 77,7% ficarão com esse modelo após o término da crise sanitária causada pela Covid-19. Em Salvador, o formato já é realidade em algumas organizações.
Na Hotmobile, a comunicóloga e gestora de projetos, Adriana Rios, 34, vivencia a modalidade. Em três dias da semana, ela encara o trabalho de forma presencial, o que possibilita a velha e boa interação corpo a corpo com os demais funcionários. Nos outros dois dias úteis, às atividades laborais são exercidas a distância. Desse cotidiano, bons resultados estão saindo.
“O modelo híbrido é proveitoso justamente porque conseguimos pegar os pontos positivos do modelo presencial e do home office ao mesmo tempo. O bom do presencial é a troca de experiências, reuniões e produções que precisam da equipe trabalhando em conjunto. Enquanto isso, o trabalho remoto é um momento para produções individuais, que muitas vezes a dinâmica com os colegas pode vir a atrapalhar”, explica Adriana.
Porém, do outro lado da moeda, há uma implicação negativa, que segundo a gestora de projetos é o fato de “algumas pessoas não conseguirem trabalhar muito bem em casa”. Mas isso não é suficiente para frear o crescimento do trabalho em formato híbrido, que a cada dia se mostra o favorito para um futuro não pandêmico.
De acordo com o levantamento do GPTW, 64,7% das pessoas entrevistadas responderam que, nas empresas onde trabalham, a maioria prefere o modelo híbrido. Conforme o presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH -BA), Wladimir Martins, o que motiva essa aprovação é a melhor adequação de algumas funções aos diferentes modelos de trabalho: presencial e home office.
“Tem atividades que são perfeitas para ser executadas através do teletrabalho, mas também há serviços que não podem ser praticados nesse modelo. Por isso, está havendo uma reformulação dos métodos, uma mescla entre a execução do ofício de forma remota e presencial”, pontua Wladimir.
Regime opcional
A startup Intera, que foi fundada em 2018 em Salvador, faz parte do grupo de instituições que pretendem permitir que os profissionais trabalhem em casa ou no escritório. O regime será opcional. “Temos alguns pontos fixos em Salvador, São Paulo e Curitiba para os colaboradores trabalharem no escritório, caso queiram. Mas não pretendemos retornar ao modelo presencial”, conta Tiago Senger, que trabalha na empresa com estagiário de people in culture, setor de gestão de pessoas.
A companhia entrou em home office em março de 2020. A mudança não foi difícil, visto que 90% das atividades eram realizadas de maneira virtual. Assim, adequar toda funcionalidade da empresa para o sistema remoto já era um planejamento, que foi antecipado por causa do coronavírus. Disso, muitas possibilidades surgiram, principalmente de melhora.
“Hoje, a Intera consegue contratar profissionais de todo país, o que é muito positivo porque assim conseguimos ter os melhores profissionais para as vagas internas. Além disso, possibilitamos que os nossos profissionais morem em qualquer lugar. Então, o planejamento é que após a pandemia a gente continue de forma remota, mas oferecendo opções para quem quer trabalhar em algum escritório”, explica Tiago.
O trabalho híbrido no pós-pandemia também é uma alternativa do estúdio de desenvolvimento de jogos Aoca Game Lab, que desde o início do caos gerado pela Covid permanece operando no teletrabalho. “É uma possibilidade que está no nosso radar. Estamos discutindo bastante sobre isso, para entender as realidades e visões de todos do time”, esclarece o CEO Filipe Pereira.
Esse formato está no radar da Aoca por um motivo: a junção das vantagens do presencial e do teletrabalho, que é positiva tanto para a empresa quanto para o funcionário. “Desenvolvemos estratégias efetivas para ambos modelos ao longo do tempo, e uma combinação deles parece ser algo promissor”, diz Filipe.
Apesar desse modelo estar ganhando destaque por causa da pandemia, ele já era usado pelas empresas bem antes dela. Na capital baiana, um exemplo é a Agência Fonte Criativa, que desde da fundação, em 2017, já atuava nesse regime flexível. Com isso, quando a crise sanitária começou, não houve necessidade de uma transição abrupta para o remoto.
“Por se tratar de um negócio que já nasceu em formato flexível, não sentimos essa mudança de maneira tão drástica em relação ao formato de trabalho como outros negócios, que antes sobreviviam somente no meio físico e não tiveram tempo de se preparar para esse novo momento”, afirmou a publicitária, sócia-diretora de criação da Fonte Criativa, Beth Maciel.
A Agência vem acumulando bons resultados no cenário adverso criado pela Covid, uma vez que o ambiente digital já era um dos principais espaços de operação. “No primeiro ano de pandemia, já tivemos resultados bastante satisfatórios, por se tratar de um universo incerto para todos. Agora em 2021, já atingimos a nossa meta de faturamento anual antes mesmo do ano acabar”, diz a publicitária.
Questões jurídicas
Diante do cenário de grandes mudanças na rotina de trabalho, como ficam as questões jurídicas entre o eixo: dinâmica de trabalho, empregador e empregado? A advogada atuante na área trabalhistas e previdenciárias, professora de direito e processo do trabalho da Unifacs, Juliana Costa Pinto, explica que “as empresas podem oferecer vagas de trabalho destinadas especificamente ao teletrabalho”.
Isso porque a legislação não pode limitar, de forma tão invasiva, o modo através do qual a empresa irá gerenciar a mão de obra que é empregada. Ela também pontua que se um funcionário foi contratado para trabalhar presencialmente, porém no curso da pandemia teve alterada sua rotina de trabalho, ele poderá requerer a observância da limitação da jornada de trabalho. Além disso, a empresa deve prezar pela saúde mental dos profissionais.
“É importante salientar que, a empresa deve ter cuidado especial com a questão da saúde mental do trabalhador submetida a tal modalidade de contratação. É necessário estar atenta à imposição de serviço superior à capacidade do trabalhador, com metas inalcançáveis, e cobrança excessiva, que podem gerar adoecimento ocupacional, inclusive, a denominada Síndrome de Burnout”, explica a advogada. (A Tarde)
Foto: divulgação