A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) tem quatro processos abertos para investigar a troca de comando na Petrobras, anunciada no dia 19 de fevereiro pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como resposta à escalada dos preços dos combustíveis. Em dois deles, a autarquia investigará a maneira como a mudança foi divulgada ao mercado. O anúncio oficial foi feito por Bolsonaro em uma rede social, um dia depois de publicar também na internet que faria mudanças na estatal.
O terceiro investiga se o general Joaquim Silva e Luna, indicado para substituir Roberto Castello Branco no comando da petroleira, tem a experiência requerida pela Lei das Estatais para ocupar o cargo. E o quarto processo investiga possível uso de informação privilegiada em operações com opções de venda de ações da estatal em redes sociais. A CVM não dá detalhes dos processos, mas sinaliza que as operações não tiveram o lucro estimado à época.
A troca no comando da Petrobras desagradou o mercado, que viu riscos de intervenção do governo na política de preços da companhia. Nos dois dias que se seguiram à afirmação de que Bolsonaro faria as mudanças, a empresa perdeu R$ 102,5 bilhões em valor de mercado. A troca também gerou uma debandada inédita no conselho da companhia, com cinco dos representantes do governo no colegiado declinando de proposta de Bolsonaro para recondução dos mandatos.
Nos processos sobre o anúncio da troca, a CVM analisa se o acionista controlador e os administradores da empresa cumpriram seus deveres em relação à divulgação de fatos relevantes sobre companhias com ações em Bolsa. A lei determina a transparência na divulgação de fatos relevantes, para garantir isonomia a todos os acionistas de uma empresa. A suspeita de uso de informação privilegiada ocorre justamente porque o anúncio foi feito em etapas pelo presidente.
O processo apura a negociação de opções de venda de ações da Petrobras entre a reunião de Bolsonaro e ministros para selar o destino de Castello Branco no dia 18 de fevereiro e a live no Facebook em que o presidente sinalizou que faria mudanças na petroleira. As operações, em volumes bem superiores à média de negociações desses títulos, foram feitas por uma corretora chamada Tullet Prebon, mas o nome de quem deu a ordem de compra ainda não foi divulgado.
Em nota divulgada nesta segunda (15), a CVM diz apenas que as opções foram vendidas antes do vencimento, o que indica um lucro menor do que os R$ 18 milhões divulgados na época. “A CVM informa, ainda, que estão em andamento as análises para a identificação de todas as operações com indícios de utilização de informação relevante não divulgada envolvendo ativos e derivativos relacionados à Petrobras no período indicado”, disse a autarquia.
A Abradin (Associação Brasileira de Investidores) disse na época ver fortes indícios de que a operação seja ilegal e protocolou uma representação na CVM pedindo investigação sobre o caso. “Esse tipo de crime tem que ser exemplarmente punido porque mina a credibilidade do mercado”, disse na ocasião o presidente da entidade, Aurélio Valporto. “Além, claro, se se tratar de um roubo a investidores inocentes.”. São poucos os casos de punições a esse tipo de crime no país. Geralmente, segundo especialistas, apenas os casos com maior visibilidade geram processos tanto na esfera administrativa quanto na criminal. Em fevereiro, por exemplo, o empresário Eike Batista recebeu sua segunda condenação por crimes contra o mercado de capitais.
Na decisão, ainda de primeira instância, a juíza federal Rosália Monteiro Figueira decretou pena de 11 anos e 8 meses por uso de informação privilegiada e manipulação com as ações da petroleira OGX. Em sua primeira fiscalização sobre a CVM, em 2020, o TCU (Tribunal de Contas da União) apontou uma série de fragilidades na supervisão do mercado de capitais brasileiro, incluindo deficiências na punição por uso de informação privilegiada.
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