Os brasileiros ainda estão com receio de gastar o dinheiro poupado durante a pandemia e pretendem continuar economizando recursos nos próximos meses. É o que mostra uma pesquisa inédita realizada pelo FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas). De acordo com a sondagem especial realizada em novembro, 37,7% dos brasileiros estão guardando recursos por preocupação em relação à pandemia e seus efeitos sobre a economia. Entre os que conseguiram economizar, 73% afirmam que vão continuar poupando e apenas 1,4% pretende gastar totalmente os recursos.
Sondagem anterior mostrou que quase 60% dos consumidores adiaram as compras por causa da pandemia, o que possibilitou esse acúmulo de recursos. Sobre o principal destino do dinheiro poupado, praticamente metade dos entrevistados na nova pesquisa afirma que vai gastar com despesas do dia a dia, quitar dívidas ou pagar impostos, o que gera dúvidas sobre a capacidade dessas poupanças de ajudar na recuperação do consumo e do setor mais afetado pela crise, os serviços. “O que sobra para aumentar o consumo é muito pouco, dado que você tem um grande volume de recursos dessa poupança precaucional sendo usado para despesas correntes, quitação de dívidas e até pagamento de impostos”, afirma Viviane Seda Bittencourt, coordenadora das sondagens do FGV Ibre.
Despesas com viagem de férias, como hospedagem, alimentação e transporte, foram citadas por 15%, percentual que surpreendeu os pesquisadores diante da queda no consumo desses itens desde o início da pandemia. O percentual supera o de gastos com bens duráveis (11,6%), como eletrodomésticos, eletrônicos e móveis, segmento que sofreu menos com a crise. Apenas 1% dos entrevistados vai usar o dinheiro para ir a teatro, cinema, show, passeios, bares e restaurantes. Outro destaque é o percentual de pessoas na faixa de renda mais baixa da pesquisa (até R$ 2.100 mensais) que apontou “outros gastos” (40,4%). Nesse caso, a maioria afirmou que vai usar o dinheiro para reforma de imóveis, o que deve manter aquecida a venda de material de construção verificada nos últimos meses.
Em relação ao momento em que vão usar o dinheiro, 24,5% disseram que iriam gastá-lo em dezembro, mês do Natal, cerca de 40% em até seis meses, 17% depois desse período e 18% disseram não saber. Os dados mais recentes mostram que a taxa de poupança das empresas e famílias brasileiras voltou a subir no terceiro trimestre, atingindo o maior nível desde o início de 2015 (17,3% do PIB ou R$ 328 bilhões no período), segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). De acordo com o Banco Central, somente na caderneta de poupança, o valor total dos recursos depositados cresceu R$ 179 bilhões de fevereiro a novembro.
Para o FGV Ibre, a pesquisa confirma a expectativa de que essa poupança vai demorar a se transformar em consumo enquanto durar a pandemia e que, mesmo que o dinheiro volte, não será suficiente para compensar o fim do auxílio emergencial. A maior parte dos recursos também não deve ir para gastos com serviços . Setor com maior peso na economia o mais prejudicado pela crise, ele é o que mais emprega e poderia ajudar a reduzir a elevada taxa de desemprego no primeiro semestre de 2021.
“Surpreende o percentual dos que estão poupando e dizem que vão gastar parcialmente ou totalmente esses recursos, que é pequeno. Ou seja, ainda há uma cautela muito grande desses consumidores em todas as faixas de renda”, afirma a coordenadora das sondagens do FGV Ibre. Ela afirma que as sondagens do consumidor do FGV Ibre mostram que a expectativa em relação ao mercado de trabalho deixou de ser positiva nos últimos três meses, o que reflete a tentativa frustrada das pessoas que voltaram a procurar emprego com a retomada das atividades.
“Esses recursos estão sendo guardados talvez por uma necessidade ou preocupação dos consumidores com medo de desemprego, com uma nova onda que impossibilite o retorno ao trabalho, uma nova onda de demissões, já que você não tem uma recuperação forte do setor de serviços, que é o que mais contrata no Brasil.”
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