Deputados e senadores preparam-se para enfrentar um Congresso atípico no segundo semestre de 2020. Com a reforma tributária como principal item da pauta, os parlamentares têm à frente uma proposta tão difícil de aprovar quanto a da Reforma da Previdência. Mas, a negociação ocorrerá em um período muito mais curto, com uma eleição municipal no caminho e, logo depois, eleições para as presidências da Câmara e do Senado. As pautas governistas de privatização, apontadas como importantes, também enfrentarão dificuldade, novamente, por conta das eleições municipais. Parlamentares de Minas Gerais e Pernambuco, por exemplo, não se sentirão confortáveis em vender a Eletrobrás quando precisam de capital político para apoiar prefeitos nas suas bases eleitorais.
Entre as incertezas, vetos e sanções presidenciais servirão, ainda, para testar a lealdade de deputados do Centrão ao presidente da República. A começar pela negativa de Jair Bolsonaro à desoneração da folha salarial, medida impopular que contraria parlamentares nas duas casas. O veto será avaliado por deputados e senadores na primeira sessão do Congresso do semestre, ainda este mês, já que não haverá recesso parlamentar, por conta da pandemia do coronavírus.
Cientista político, mestre em sociologia política, doutor em direito e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Geraldo Tadeu Monteiro, avalia que as declarações favoráveis à reforma tributária neste início de segundo semestre valerão, muito mais, como marcação de posição. Além do difícil cenário e do tempo curto, também pesa contra a falta de iniciativa do Executivo em favor da medida, apontada como um projeto importante para acelerar a recuperação econômica do Brasil após a crise sanitária e seus reflexos no PIB.
O adiamento das eleições e o distanciamento social também causam temor de resultados imprevisíveis no pleito municipal. “A pauta do Congresso estará dominada pelo processo eleitoral. Muitos deputados e senadores são candidatos ou apoiam candidatos a prefeitos. Como todo ano eleitoral — esse com especial atenção, pois vivemos em uma pandemia — há incerteza. Não vejo nenhuma grande pauta imposta pelo governo, que está correndo atrás dos prejuízos do dia a dia, como desemprego, pagamento de auxílio emergencial, falência de micro e pequenas empresas, do que propondo pautas”, reflete.
“A ideia da reforma tributária perdeu-se no caminho. Exige um ambiente de muito entendimento e capacidade de negociação. E o governo não tem mostrado capacidade sequer de aprovar projetos de lei. Não tem mostrado capacidade mínima de articulação no parlamento. O que o governo consegue aprovar é do interesse dos parlamentares. Antes da pandemia, havia movimento no sentido de uma comissão mista de reforma tributária capaz de ouvir a sociedade, com audiências públicas, audiências públicas nos estados, com participação do empresariado, prefeitos, governadores. E, hoje, você tem pandemia e eleições. Não há energia”, avalia.
Para completar, sempre tem a possibilidade de Bolsonaro voltar a acirrar o relacionamento com os deputados. “O ethos do bolsonarismo é autoritário. Vai ser permanentemente assim. Pode ter momentos de fragilidade, mas é só uma retomada de fôlego, para voltar a correr, a atacar. Não é mudança de atitude, é estratégia”, observa Geraldo Tadeu.(TB)
Foto: Leopoldo Silva / Agência Senado